20 de julho de 2014

Que tempo bom, não volta mais, saudade...

A música tem estes versos do título, e o final, após a reticência (aposiopesi) "deste tempo bom".

A partir de amanhã estarão sendo publicados neste espaço virtual, algumas matérias (posts) da lavra de alguns dos seguidores, e mais do que isso, colaboradores do blog.

O mote será a moda e os costumes (hábitos, hobbies, diversões) da época de infância e juventude de cada um.

Como sou, além do manager, o mais velho (até gora) dos escribas, darei o pontapé inicial, com retalhos recolhidos na memória já meio saturada.

Os meninos, pelo menos a grande maioria, na década de 1940, usavam calças curtas e suspensórios. Duas coisas de que não gostava. Hoje, nos estertores da vida, por conveniência, comodismo e necessidade, uso bermuda (calça curta) e suspensórios.

Estes, os suspensórios, ajudam a manter a cintura da calça no lugar, pois a barriga proeminente em geral faz com que a calça fique abaixo da linha da cintura, abaixo da pança melhor dizendo.

Nos sapatos, ou Vulcabrás ou outro qualquer que fosse barato, eram colocadas chapinhas metálicas no solado; uma no bico e outra no lado posterior esquerdo do salto. Providencia que dava mais durabilidade aos calçados, pois eram estes os pontos de maior desgaste.

Bem, mesmo o solado era recuperável, nos sapateiros (profissionais hábeis e ora em extinção), que substituíam o couro da sola fazendo o que denominávamos uma meia-sola.

Por falar em desgaste e da necessidade de economizar, lembro que também os lápis, quando já ficando pequenos demais para utilização, eram colocados numa ponteira metálica (espécie de piteira de cigarro), o que permitia seu uso até pouco menos de dois centímetros de comprimento.


Durante o curso primário usávamos lápis. Mais tarde, a partir do ginasial, já escrevíamos com caneta tinteiro. A tinta era Parker Quink (azul real lavável).

Não, não peguei a época da pena de ave que era utilizada na escrita. Meu pai sim, provavelmente.

Para encerrar o capitulo indumentária. Tive terninho com calça curta e usava gravata, parte integrante também do uniforme escolar. Livrei-me da indefectível roupa de marinheiro, menos por minha vontade e muito mais pela dificuldade econômica da família.

Minhas irmãs usavam saias rodadas, amplas, abaixo dos joelhos e às vezes fita no cabelo. Eram bonitas (gostou Ana Maria?).

Depois cresci um pouco e cheguei à puberdade, adolescência. Finalmente pude me livrar das calças curtas e dos suspensórios. Também no colégio a calça já era comprida, mas a gravata permaneceu.

Creiam que, aos 14/15 anos já usava terno especialmente comprado para ocasiões especiais. Festas de bodas de prata, casamentos, e solenidades públicas às quais meu pai por dever de ofício tinha que comparecer.

Nessa época já se paquerava as coleguinhas para valer. Nos bailes residenciais, um must nos anos 1950 e 1960, a gente dava uns amassos discretos e roubava um beijinho roçado nos lábios.

Mas nos clubes valia uma coxeada e uma chamada mais apertada na cintura, quando havia reciprocidade, dava liga, ou rolava uma boa química como se diz hoje em dia.

Nas residências, cortado o bolo (se era um aniversário), ou mesmo não sendo, as horas quantas os móveis eram encostados nas paredes e o espaço interior era tomado pelos jovens casais que dançavam ao som de Ray Conniff,  Percy Faith ou Metais em Brasa (Henry Jerome e sua orquestra).

O mais tardar às 23 horas tinha que acabar a festinha. Como regra geral, estes encontros de amigos e colegas de escola eram realizados em casas térreas. Poucos amigos moravam em apartamentos. Nós mesmos só mudamos para apartamento quando eu já tinha 13 anos de idade.

A bebida normalmente servida era um refrigerante, um ponche ou o indefectível cubra libre (Rum com Coca-Cola). Na infância havia outras opções de refrigerantes, como o Crush, o Grapette e o Guará.

Este último, o Guará, tinha um jingle que ficou marcante e era usado até como vinheta nos bailes de carnaval. Era assim: "Guará, Guará, Guará, melhor refrescante não há" (bis), e concluía com "eu vou ali, já volta já, estou com sede vou beber o meu Guará". E repetia o refrão.

As moças usavam anágua e discreta pintura nos lábios e unhas.

Usava brilhantina no cabelo, que era de uso de meu pai e não usei o Gumex, que quase todos os meninos usavam. As mulheres usavam laquê.

Todos fumavam porque os atores e atrizes dos filmes americanos fumavam sempre. As meninas fumavam meio escondido, no banheiro ou na varanda dando pequenas tragadas (uma pitada) nos cigarros dos rapazes.

O cheiro que hoje me incomoda terrivelmente não era observado.

Nunca usei topete como os da moda introduzida pelo Elvis Presley. Cortava meu cabelo nos estilos “principe danilo” ou “meia cabeleira” que os barbeiros conheciam bem.

Frequentei as matinês do Cine Rio Branco, onde eram exibidos dois filmes por sessão. E a programação mudava durante a semana: de segunda a quarta eram dois filmes e de quinta a domingo outros dois. E, acreditem, muitas vezes também tinha pequenos seriados (de caubói) na programação.


Ria muito com as comédias do "Gordo e o Magro", representados por Stan Laurel e Oliver Hardy.

A “praia das vitaminas”, assim denominada a que margeava a Rua Visc. de Rio Branco, no trecho entre a estação das barcas e o início do morro São Diogo, defronte à Vila Pereira Carneiro, tinha dois pequenos espaços de areia. Um deles, mais próximo às barcas, era ocupado por barcos de pescadores; no outro, bem em frente à Feliciano Sodré e à Silva Jardim, nos dias de maré baixa, dava para jogar futebol.

Entre estes dois espaços de areai visível (praias) havia um trecho no qual o mar chegava até o paredão da calçada. Antes de arrentar contra o paredão, as ondas tinham que superar as muitas grandes pedras ali colocadas em alinhamento, para fazer o papel de quebra-mar.

Era sobre estas pedras que pescávamos os carapicus o que, a par de ser uma diversão, ajudava no cardápio das famílias mensos abastadas como a minha.

A isca, colocada no anzol mosquitinho (pequeno), geralmente era de baratinha, daquelas que nasciam e cresciam nas aberturas (ranhuras) do paredão e nas pedras de musgo do quebra-mar. Excepcionalmente usávamos pequenos pedaços de sardinha, que generosamente os peixeiros do Mercado São Pedro (na localização antiga), davam para nós garotos (em geral as amassadas, ou faltando pedaço, em função do manuseio).


Eu tinha 9 anos de idade. Notem que os homens usavam chapéus. Também meu pai usava.

Não havia o aterro que ampliou a área terrestre onde hoje tem o terminal rodoviário, o Shopping “Bay Market” e estacionamentos.

Andávamos de bonde, ou a pé mesmo dependendo da distância a ser percorrida. De nossa residência até o Liceu, por exemplo, eu ia e voltava caminhando todos os dias. Eram oito quadras em linha reta e depois mais três já na Av. Amaral Peixoto.

Nunca tive bicicleta, e aprendi a andar nas dos colegas. Quando ainda menino, praticava um pouco, na de entrega de compras do Armazém Dragão, quando o Aristides, o caixeiro, ia fazer entrega lá em casa ou em alguma outra casa da vila.

O Aristides deixava eu dar uma ou duas voltas ali mesmo na vila, de um lado ao outro, porque eu enchia a saco dele pedindo uma voltinha. A bicicleta tinha na frente um suporte que se destinava a colocação do caixote de entrega das compras.

Em compensação, aos 16/17 anos comecei a praticar, com meu pai ao lado, a dirigir automóvel, no nosso então possante Buick 1938. Tanto que, completados em abril os 18 anos, na primeira semana de maio de 1958 obtive minha carteira de motorista. Conservo-a até hoje como lembrança.

Bem, não pretendi, e não conseguiria, esgotar o que era moda ou foi costume naquela época. Por isso convido e peço aos leitores eventuais que através de comentários acrescentem ou retifiquem algum equívoco.

Se você é “de casa”, manda um post e publico aqui. Mais tarde, quando você estiver com a minha idade, ou mais, gostará de lembrar.

11 comentários:

Jorge Carrano disse...

Não mencionei as diferentes coleções que iniciávamos e o mais das vezes abandonávamos.
Entre elas, as flâmulas de colégios, clubes de futebol e instituições militares.
Mas a primeira ade minhas coleções foi das estampas que acompanhavam o sabonete Eucalol, que tinham caráter instrutivo, pois exibiam as bandeiras dos diferentes países, tipos regionais, episódios históricos, etc.
Eram comuns as coleções de lápis com propaganda dos estabelecimentos.

Freddy disse...

A essa altura já acho meu futuro post bem resumido. Haveria vários detalhes a acrescentar, aproveitando ganchos existentes aqui, no abrangente texto do Carrano.
Como não é razoável refazê-lo, provavelmente inserirei adendos na área de comentários, tanto agora (pra que postergar?) como depois da publicação. Os que cabem agora dizem respeito a suspensórios, bermudas e fumo, temas abordados.

Eu fui dos poucos na escola primária a usar suspensórios, justo pelo motivo alegado no texto: eu era gordo! Como eu ficava por demais esquisito e diferente dos demais (que não usavam), foi abolido assim que entrei no ginásio (Liceu).

Aí me aconteceu o segundo bullying de inúmeros que eu sofri na vida: meus pais não se deram conta de que quem entrava no Liceu já era "crescido" e apesar do colégio permitir, usar bermudas era pagar mico: fui imediatamente taxado de "bicho de bermuda". Bicho era sinônimo de calouro. Bermuda, de criança.
OK, o incidente foi rapidamente contornado e meu uniforme passou a ser com calça comprida.

Fumo... Eu fui chato! Eu era o anúncio ambulante das mazelas que o fumo pode causar, enchendo o saco de meus amigos fumantes. Só que secretamente (já fiz psicoterapia, gente!) eu associava fumar a ser legal, independente, forte e bonito - como nos anúncios!

Eis que numa determinada época eu passei uma crise emocional muito profunda e... quis morrer.
OK, quem já fez psicoterapia às vezes usa expressões fortes e diretas, por isso vamos lá.
Como não era razoável me matar, resolvi fumar! Ao menos teria algum prazer antes da morte. Portanto, acendi meu primeiro cigarro com 16 anos e 10 meses, plenamente consciente do que estava fazendo e imune a qualquer tipo de conselhos de terceiros, como meus pais.

Bem mais tarde, com 32 anos de idade, o cigarro começou a me dar dor de cabeça. Não passava com nada! Diminuí o fumo, foi melhorando. Aboli o fumo, passou! Voltei a fumar, ali estava ela a me lembrar! Parei de fumar definitivamente.

Definitivamente? Para ser sincero, afirmo que fumar me dá prazer. Acendi novamente um cigarro com 39 anos numa festa. Depois outro e então comprei um maço. Voltou a dor de cabeça! Eu tinha a escolha simples: fumar ou ter dor de cabeça. Dei o maço a um colega antes mesmo de terminá-lo e parei de vez!

Em tempo: Carrano não explicou o motivo do apelido "Praia das Vitaminas" (rs rs)

<:o) Freddy

Riva disse...

Como somos da mesma cidade, Niterói, a diferença de hábitos entre nós não mudou quase nada, apesar da diferença de uns 10 anos de idade entre nós.
Música sim .... no meu caso os "bailes residenciais" eram à base de Beatles, Stones, Jovem Guarda e outros americanos e ingleses.

Ah, sim, eu não suportava a tinta para caneta azul lavável. Só usava a azul permanente, bem mais escura ... mas se caísse na roupa ....

Coleções ? As minhas eram de canetas, adesivos plásticos (que até furtávamos de automóveis alheios), maços de cigarro estrangeiros, bolas de gude (cheguei a ter uma maleta metálica com 800 "olhinhos").

Jorge Carrano disse...

O Mercado de Peixe São Pedro era localizado quase no meio do trecho da Visconde Rio Branco, compreendido entre a Vila Pereira Carneiro e a estação das barcas da Cantareira.
Já fiz uma má comparação certa feita aqui no blog com a Ponte Vecchio aqui no blog. Só que diferentemente da ponte florentina, o mercado não ligava um solo a outro porque o final da ponte dos pescadores era o mar.
Após alguns anos resolveram fazer um prolongamento da construção, mar a dentro, e neste trecho recém-construídol, também com barracas de um lado e de outro, vender frutas, legumes e hortaliças.
Os legumes já sem boas condições de uso eram descartados no mar e se aglomeravam na praia ou ficavam boiando por ali mesmo no mar, nas proximidades da calçada.
Acresce que no Rio de Janeiro ainda havia o velho Mercado Municipal, do qual foi conservado uma das torres, onde funciona o restaurante Albamar.
O mercado do Rio também despejava na baia os restolhos (ou parte deles) inservíveis.
Trazidos pela maré também ficavam boiando aqui na praia defronte a Rua Visc. do Rio Branco. Com tantos legumes na água era inevitável que fosse apelidada de praia das vitaminas

Freddy disse...

Obrigado, Carrano, pela explicação da Praia das Vitaminas.
Vou aguardar os próximos posts para não queimar assuntos antes de conhecer as opiniões dos demais colaboradores.
Abraço
Freddy

Riva disse...

Revelações surpreendentes no blog !

Enquanto isso tudo acontecia embaixo do meu nariz, sem eu perceber, eu só queria saber de me divertir e de não me aborrecer com nada. E aproveitar o máximo possível daquela maravilha que foram os anos 60.

Jorge Carrano disse...

A partir de amanhã serão publicados posts de amigos e parentes. Como não poderia deixar de ser, como quase todos são da mesma geração (ou próximas), as modas e costumes são praticamente os mesmos.
Mas têm nuances em função dos bairros, do poder aquisitivo da família e, claro, das áreas de interesse: música, esporte, baile, cinema, etc.

Neide disse...

Lendo a postagem minha mente foi, imediatamente, remetida aos meus (não tão velhos ...rs)tempos. Não sabia o que era praia, menina de interior e pobre que era, mas corria lépida e fagueira pelos campos (que chamávamos de "pastos", talvez porque era onde o gado se alimentava ou “pastava” como era o nosso dizer ; pescava nos riachos com iscas de minhocas que arrancávamos da terra com enxadas ou enxadões; pulava amarelinha; brincava de pega-pega, balança caixão e passar anel; jogava bola queimada e peteca; andava a cavalo...Bicicleta vim conhecer bem mais tarde ,quando mudamos para a cidade. Mas não tive uma... olhava “aguada” para a de uma amiga ! O vidro de tinta Parker me fez lembrar que certa vez, no Grupo Escolar, vestia eu uma blusa de de frio azul, novinha, não em folha porque era de lã, e a indócil colega da frente balançou a carteira e o meu vidro de tinta caiu derramando todo seu precioso líquido na minha tão filha única blusa de lã...Imagine o que aconteceu quando cheguei em casa !!! Ah! realmente bons tempos ...sem o conforto e as adoráveis parafernálias modernas mas eu era feliz àquela maneira...se era !!!

Jorge Carrano disse...

Obrigado, Neide, por sua visita virtual e pelo comentário enriquecedor.

Alessandra Tappes disse...

Ah Ray Conniff... em minha estante musical mental, existe uma prateleira lustrada, limpinha e única para Ray Conniff. Lembro dos natais da minha adolescência e eu louca esperando ganhar mais um LP dele.

Também peguei a era Crush. Lembro dela como magia em minha vida pois só bebíamos na casa de meus avós paternos. Casa de avós é sempre cheia de netos em época de férias e a casa de meus avôs era como um quartel general familiar: o ponto de partida para reunir a família.

Mas ouso dizer aqui que na sua época (a citada) os homens e as mulheres eram de uma elegância única. O cabelo com brilhantina, as unhas e lábios discretamente pintados, as roupas sempre bem alinhadas, os chapéus, o cavalheirismo enfim, uma época que reflete até hoje nos bons costumes. Quando se fala em bons tempos, logo vem a imagem das crianças brincando engomadinhas, os meninos em seus carros encerados, as moças com suas saias rodadas, laços nos cabelos ou até com sombrinhas, todas acanhadas. Porque novela de época faz tanto sucesso? As pessoas logo assimilam a época com romantismo, educação, bons costumes. Mesmo com a invasão do Rock, o topete de Elvis, a sua época não perdeu a essência. Visto as memórias vivas em você, visto a memória vivas em todos aqui.

Unknown disse...


ASSIM TAMBÉM É COVARDIA, NÉ, CARRANO?
BETH
(QUE SAUDADE QUE ME DEU DA MINHA CANETA PARKER 51... POXA... E A TINTA ERA AZUL REAL LAVÁVEL)