29 de fevereiro de 2012

Reflexões sobre o Universo - Impetuosidade x Comedimento

   Por
  Carlos Frederico M B March
  (engenheiro de telecomunicações,  fotógrafo diletante  e astrônomo amador)


Sob ponto de vista de astrônomo amador, nesse segundo texto de "Reflexões sobre o Universo" (o primeiro foi "70 Voltas", publicado neste blog em 23.06.2011 ) abordarei um aspecto do desenvolvimento das estrelas e sistemas planetários que acho que pode gerar analogias com o nosso comportamento como seres humanos.

Caso geral as estrelas se formam em ambientes ricos em hidrogênio. Em muito menor quantidade, os demais elementos podem fazer parte do processo, na forma molecular ou em forma da chamada poeira interestelar. Através de atração gravitacional, os átomos ou moléculas desses materiais vão se aglutinando e, atingida uma certa massa crítica, formando as estrelas. Em seu entorno permanece na maioria das vezes um disco de matéria que acabará formando (ou não) sistemas planetários.


PILLARS OF CREATION - berçário estelar (HST - NASA)
Dependendo da configuração na nuvem primordial, de sua concentração de hidrogênio e/ou de elementos mais pesados ou poeira, formam-se estrelas maiores ou menores. Estima-se que, inclusive, vez por outra se formam astros que nem chegam a irradiar no espectro visível, as chamadas anãs marrons. Até recentemente, quando a maior parte da observação era visual, não as conhecíamos. Instrumentos de pesquisa em outras faixas de radiação, como a infravermelha, estão mais aptos a detetar os mais próximos de nós.

Primeiro caso - as maiores

Segundo a física estelar, está comprovado que estrelas gigantes, hiper brilhantes e quentes, irradiam sua energia em voluptuosas quantidades, iluminando (em várias faixas de radiação, desde infravermelho até ultravioleta passando pelo visível) tudo a seu redor e por vezes prejudicando as redondezas com sua impetuosidade. Por conta desse descalabro no consumo de suas reservas de energia, duram muito pouco tempo: 1 milhão de anos, 2, 10... Então morrem em titânica explosão (supernovas), numa reação nuclear quase instantânea que produz uma grande quantidade de elementos químicos de maior peso atômico que hidrogênio. Essa explosão produz belas nuvens de matéria que se expandem pelas redondezas, deixando no lugar da estrela original um objeto que pode ser uma estrela de neutrons, um pulsar ou mesmo um buraco negro.


M1 - Nebulosa do Caranguejo (HST - NASA)

Segundo caso - as menores

Por outro lado, estrelas comedidas, pequenas e econômicas, duram bilhões de anos, sem afetar em nada a vizinhança. Nada perturbam em torno, não emitem radiação destrutiva... Se eventualmente formadas num cenário como mencionado mais acima, ponto central de um disco de matéria, podem até ganhar à sua volta uma prole: planetas. Serenas, calmas, têm a capacidade de mantê-los ali, quietos e aconchegados.

Claro que tudo isso é uma simplificação, entre grandes e pequenas temos estrelas de tamanho intermediário, e as nuvens de matéria que formam todos esses tipos podem conter ou não matéria remanescente de explosões anteriores de supernovas nas redondezas. Este, em particular, é um fator relevante em nossa argumentação.

Segue que nosso Sistema Solar tem em seu centro uma estrela relativamente sossegada, pequena mas nem tanto - expectativa de vida de uns 10 bilhões de anos, quase metade dos quais já se passou. Sabemos também que é um sistema de 2ª geração. Certamente a nuvem primordial que o formou continha elementos pesados remanescentes de explosões anteriores de supernovas, ou não teríamos planetas rochosos como Mercúrio, Vênus, Terra e Marte.

Fato: estrelas enormes, energéticas, hiper luminosas, morreram para que nós existíssemos.

Um resumo:

- Estrelas (pessoas?) grandes, fulgurantes, enquanto existem iluminam o mundo à sua volta com seu glamour e exuberância. Não raro esse ímpeto desmedido espalha o terror nas redondezas, estar próximo delas é extremamente arriscado, quando não destrutivo . Morrem cedo mas deixam como legado uma grande quantidade de elementos químicos variados (criações, insumos) que tornarão as gerações futuras de estrelas bem mais interessantes.

- Estrelas (pessoas?) pequenas e econômicas duram muito, muito! Conseguem manter a si e à sua prole (os eventuais sistemas planetários) numa existência sossegada e estável por éons. Em nada afetam a vizinhança, morrem de velhas em relativa paz e obscuridade.

- Analisemos o caso de estrelas pequenas e econômicas, contudo criadas a partir dos resíduos de estrelas fulgurantes e impetuosas - chamadas estrelas de 2ª geração. Usufruem do subproduto das que levaram uma existência exuberante, criativa mas autodestrutiva, só que sem correr riscos. É o caso do nosso Sistema Solar, Terra incluída. Paradoxalmente, é por conta dessa existência calma e duradoura em cima dos frutos herdados que ocorrem as condições ideais para o aparecimento da VIDA, talvez a maior das criações.

Onde eu gostaria de chegar?

Há várias analogias, algumas talvez polêmicas. Destaco essas a seguir:

- Sem guerra não há progresso (apesar de que nem sempre o progresso é algo benéfico). A guerra - aguda, feroz, destrutiva - estimula a pesquisa frenética por novas soluções em busca da vitória, das quais mais tarde usufruímos nos tempos de paz.

- Sem que desbravadores tenham se arriscado para alargar nossos horizontes, reais ou virtuais, estaríamos ainda no contexto da Idade Média. Incluo aí, por exemplo, os grandes navegadores dos séc. XV e XVI, alguns destaques na ciência, nas artes, na política...

- Muitas atitudes polêmicas, sejam de pessoas ou de sociedades inteiras, bem sucedidas ou não, foram necessárias para que gerações futuras vivessem com mais liberdade, dignidade e conforto, físico ou espiritual. Posso incluir Jesus Cristo?

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Imagens obtidas no site Astronomy Picture of the Day

http://apod.nasa.gov/


Pillars of Creation é uma das mais famosas foto-montagens realizadas a partir de originais tiradas pelo telescópio espacial Hubble, sendo que a parte escura da foto é uma porção do céu não capturada pelas lentes. Mostra um imenso berçário estelar dentro da Nebulosa da Águia, uma região onde estão sendo criadas estrelas e sistemas planetários.

M1 - Nebulosa do Caranguejo apresenta a visão atual da nuvem de destroços (elementos pesados) gerada pela explosão da Supernova do ano de 1054. Ao centro se encontra um pulsar, ou seja, uma estrela de neutrons em vertiginosa rotação, que é o que sobrou da estrela original.

17 comentários:

Gusmão disse...

As fotos são magníficas.
O texto ainda estou ruminando.
Abraços

Jorge Carrano disse...

Entendo seu comentário, Gusmão.
Já li mais de uma vez, pois afinal recebi do Carlos March via email e, lógico, li o texto antes da publicação.
Depois de editado, li de novo para ver como ficou.
E, confesso, também estou matutando sobre o assunto.
Abraços, para você e para o Carlos.

Ana Maria disse...

Aleluia
Roberto Carlos

Quando o sol aquece de manhã
o Planeta Terra onde eu vivo,
não importa em que lugar estou,
Olho a natureza pensativo:
O vento assanha as águas do oceano;
Surfa pelas ondas da canção;
Quem compõe a música do vento?
E quem acendeu o sol, então?

Aleluia, Aleluia!
Conclusão dos pensamentos meus.
Aleluia, Aleluia!
Em tudo isso tem a mão de Deus.

Quando cai a chuva e molha o chão,
meu planeta fica tão florido;
Vem a tarde e as tintas lá do céu,
pintam um horizonte colorido;
Folhas, flores, frutos se misturam
nesse quadro: ¨Amor e a Perfeição¨.
Quem é esse agricultor divino?
É o mesmo autor do quadro, então?

Aleluia, Aleluia!
Conclusão dos pensamentos meus.
Aleluia! Aleluia!
Em tudo isso tem a mão de Deus.

Quando vem a noite, eu olho o céu,
as estrelas brilham no infinito;
Vejo a lua clara sobre o mar.
E nesse momento eu reflito:
Um ser supremo em tudo isso existe!
Deus, a luz maior, a explicação!
Tudo vem das suas mãos divinas:
O céu, a terra, o mar, a vida.

Então:
Aleluia! Aleluia!
Conclusão dos pensamentos meus.
Aleluia! Aleluia!
Em tudo isso tem a mão de Deus.(4x)

Fernandez disse...

Concordo com o Gusmão, as fotos são lindas e concordo com Ana Maria, via Roberto Carlos: em tudo tem a mão de deus.
:D Fernandez

Paulo disse...

Mas o que é Deus ?

Freddy disse...

"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!". E eu vos direi, no entanto,
Que para ouvi-las, muitas vezes desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
A Via-Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do Sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e entender estrelas."

Olavo Bilac, Soneto XIII (1888)
Abraço
Carlos

Ana Maria disse...

O que é Deus?
Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas.
Onde podemos encontrar a prova da existência de Deus?
Num axioma que aplicais às vossas ciências: não há efeito sem causa. Procurai a causa de tudo o que não é obra do homem, e a vossa razão vos responderá
Livro dos \espíritos - Allan Kardec

E pra ficar ecumênica, cito um rabino....
"A fé não é saber qual é o mistério do universo, mas sim a convicção de que existe um mistério e que ele é maior do que nós." (Rabino David Wolpe)

Freddy disse...

Quem estuda Astronomia o faz por diversos motivos. Pode ser por ter se maravilhado com um céu absurdamente estrelado (longe das cidades, decerto), pela beleza de imagens artificialmente coloridas, como as que hoje são divulgadas na mídia, ou há até quem o faça para tentar embasar cientificamente um interesse em Astrologia. O outro tipo de motivação é buscar as origens do Homem, ou da Vida, ou de tudo que nos cerca. Uma busca por Deus?

Na minha modesta opinião, a não ser o "porque existe um Universo", todo o mais me parece absolutamente casual. O aparecimento da vida é natural dadas as circunstâncias adequadas, dali florescer inteligência em diversos níveis é uma consequência também natural e sua evolução para patamares por nós desconhecidos é também plausível, até inevitável.

O que Deus tem a ver com isso tudo? É a "pergunta de um milhão de dólares", que ninguém até hoje conseguiu responder. Desde os primórdios as religiões evoluem nessa busca, numa tentativa de entender o que nos cerca. Hoje - século XXI - temos algumas de grande porte coexistindo de forma quase beligerante. O simples fato de existir mais de uma já é questionável como espelho da verdade. Podem ter certeza de que nenhuma delas representa a resposta definitiva, dado que se um Deus existe, não ia se comprazer com uma bagunça dessas...

Abraço
Carlos

Ana Maria disse...

Talvez Deus não seja aquele velhinho barbudo, às vezes bastante irado que vcs concebem.
Há uma ordem inteligente e não existem coincidências. A essa energia criadora damos o nome de Deus.

Paulo disse...

Finalmente !!!!!! Concordo 1.000.000 % com a ANA MARIA ...
Sds

Freddy disse...

Sem cotar com o machismo da coisa... Quem é que pode afirmar que Deus seria um velhinho barbudo e às vezes irado e não uma mãezona de colo farto e acolhedor?
<:o)
Carlos

Freddy disse...

Tenho a impressão de que os comentários acerca de Deus seriam mais pertinentes ao meu outro texto "Reflexões sobre o Universo - 70 voltas", postado pelo Carrano em 23/06/2011.

Na verdade, neste aqui eu quis abordar a questão de que vidas fulgurantes, nas quais certos indivíduos desgastam suas energias numa explosão de criatividade, por vezes incomodando o status quo e não raro morrendo cedo, são importantes pelas sementes que deixam. As gerações futuras se aproveitam das mudanças geradas por esses personagens invulgares.

Achei interessante que no cenário estelar a coisa se processa mais ou menos do mesmo jeito... Não fosse a morte explosiva (e prematura) de estrelas altamente energéticas nas vizinhanças de nosso Sistema Solar, não estaríamos aqui a debater sobre a origem do Universo, Deus, etc.

Abraços
Carlos

Riva52 disse...

Carlos, releia seu último parágrafo e vai ver porque nós "resolvemos" falar de Deus.

Freddy disse...

Eu vou ter de fazer um curso de reciclagem de língua portuguesa. Definitivamente não consigo me fazer entender...

Ou por outro lado, quando as pessoas querem debater sobre um assunto, não adianta você tentar recolocar nos trilhos, sempre alguém retoma o atalho e a discussão que deseja.

=8-/ Carlos

Paulo disse...

vc conheceu Leonel Brizola ? rsrsrsrsrsrsrs

Jorge Carrano disse...

Boa Paulo!
Só é preciso explicar aos mais novos o artifício que era usado pelo citado político que só respondia as perguntas falando do que queria, do que lhe interessava.
Era mais do que tergiversar. Era um recurso para abordar somente assuntos de seu interesse qualquer que fosse o tema suscitado pelo interlocutor.
Era isso, Paulo?
Abraço

Paulo disse...

Bingo, Carrano .... 100% isso rsrsrsrsrs