6 de setembro de 2011

Impunidade

Bem, para quem me conhce há muito tempo, caso de filhos, irmã, sobrinhas e amigos mais chegados, não chega a ser novidade minha postura radical quanto as benesses e regalias no cumprimentro de penas. Mais ainda, para  certos crimes, não vejo alaternativa senão a pena de morte. Até para poupar vidas de inocentes, pois é muito mais comum do que divulgado que assassinos postos em liberdade por cumprimento da pena ou em razão das malsinadas progressões de regime (liberdade condicional, etc), voltam a matar.

Lei recentíssima, a mais nova do processo penal, cria uma outra falácia. Maquiada como ferramenta importante para reintegração social de ex-detentos, a lei em questão estabalece uma redução da pena para os detentos que estudarem. Foi criada uma tabela, tantas horas em sala de aula (no próprio presídio) correpondem  a uma redução da pena estabelecida na condenação.

Parece ser de elevado alcance social, mas na verdade visa reduzir a população carcerária, diminuindo o tempo de reclusão. Abrirá vagas nos presídios. Você acha que sou contra propiciar estudo aos presidiários? Absolutamente, acho que trabalho e estudo deveriam ser componentes obrigatórios no sistema prisional. Sou contra, apenas, a redução da pena numa escala proporcional ao tempo de permanência em sala de aula. Por que este benefício se o interesse deveria ser do próprio recluso? Ele deveria desejar e se empenhar no sentido de se qualificar para a vida futura, fora das grades.

O recente assassinato de uma juiza, em Niterói, é mais do que um crime de homicídio. É um crime contra a instituição:  Poder Judiciário. Ou seja, o crime ameaça o poder constituído. E a impunidade desta execução tornará os bandidos mais ousados e não me surpreenderei se os atentados alcançarem instâncias superiores, esferas mais elevadas de poder. Já foram assassinados jornalistas, prefeitos, juizes e faltará pouco para mais ousadias... é só esperar.

Não estou sozinho na opinião de que as penas são brandas e, pior, ainda assim não são cumpridas por inteiro. Ressoacialização, recuperação, reinserção na sociedade, e mais isto e mais aquilo como finalidade da pena é uma coisa hipócrita. Estou com Anthony Daniels (ver abaixo) os intelectuais deveriam ter suas falas censuradas (podem e devem rir, leitores).

Se uma das finalidade da pena é a recuperação do sentenciado para a vida em sociedade, todos aqueles que deixam os presídios poderiam pleiter indenizações do estado, porque este não cumpriu seu papel.
Não neste post, mas num próximo vou contar uma história verídica, dando nomes, de um ex-detento que tentou (e este se esforçou mesmo) mudar de vida e não conseguiu.

A seguir um apanhado de opiniões de personalidades do mundo da ciência, das letras  e do universo jurídico, sobre a brandura das penas no Brasil.

Lya Luft - escritora e professora

"Bandos de crianças e pré-adolescentes fazem arrastões em hotéis ou lojas numa grande cidade. Alguns, presos, são devolvidos às mães. Houve-se claramente uma dessas pseudomães criticar a filha não por ter roubado, mas por ter ”roubado no mesmo lugar, sua besta”.
"Nem acredito que essas crianças enfurecidas, pequenos selvagens que apanhados destruíram, literalmente, postos de policia e salas de atendimento de menores infratores, chutando policiais, atirando objetos longe, quebrando e rasgando o que chegava ao alcance de sua violência, tenham possibilidade de melhoria, se devolvidas a sua pseudofamilia. Retornadas as ruas, são como um perigo para si e para todos. A lei deveria ser muito firme nestes casos, para socorrer estes fantasmas com carinha de criança e alma de sombra, acalmando sua violência, incutindo-lhes o que seja convívio, dignidade, respeito por si e pelo outro: longo caminho, longo aprendizado, longo esforço da sociedade em compensar essas pessoinhas pelo abandono em que as deixou."

Digo eu: mas atribuir culpa  a sociedade, é minimizar as causas. É como diz o João Ubaldo (ver abaixo) culpa-se a causa e não o agente do delito.

Com a palavra o consagrado escritor, jornalista e advogado (não militante), João Ubaldo Ribeiro:

"Mesmo que houvesse punição, o Brasil é muito avaro com elas. De vez em quando se anuncia que fulano foi condenado a, sei lá, seis anos de cadeia, mas logo se descobre que, se valendo disso e daquilo, estará em regime semi-aberto dentro de alguns meses e praticamente solto. Outro dia, muitos de vocês devem ter isto na TV um rapaz sorridente confessar numa delegacia de polícia que foi coautor ou cúmplice de um assassinato. Mas, como o próprio delegado explicou, ele se apresentou espontaneamente, era réu primário, patati-patatá e foi imediatamente solto, só faltando um abraço no delegado e um aceno para as câmeras."

"O culpado é a causa, não o agente do delito. E a função da pena é a “recuperação” do condenado, mesmo por crimes muito graves, sua “reinserção na sociedade”. Creio que continua politicamente correto pensar assim, mas já há especialistas que acham que essa “recuperação” é no mais das vezes falaciosa."

"Mas, no Brasil, as penas são leves e suavizáveis a pretexto de praticamente qualquer coisa. "

"Apesar e algumas mudanças recentes, a tendência tem sido procurar as “causas” do comportamento antissocial, o que acaba de levar a conclusão de que ninguém é culpado ou responsável por nada."

Reproduzo palavras de  Anthony Daniels, ou Theodore Dalrymple, médico psiquiatra e escritor:

“A taxa de reincidência para bandidos condenados a prestar serviços comunitários é de 70%. Nada garante que, enquanto estão soltos, prestando serviços comunitários eles não cometam novos crimes. Em média cada detento na Inglaterra já foi condenado outras dez vezes a penas alternativas. Ou seja, não adiantou nada”.

“O pensamento intelectual dominante procura explicar o comportamento das pessoas como uma consequência de seu passado, de suas circunstâncias psicológicas e de suas condições econômicas. Infelizmente, essas teses são absorvidas pela população de todos os extratos sociais. Quando trabalhava como médico em prisões inglesas, com frequência ouvia detentos sem uma boa educação formal repetindo teorias sociológicas e psicológicas difundidas pelas universidades. Com isso, não apenas de sentiam menos culpados por seus atos criminosos, como de fato eram tratados dessa maneira. Trata-se de uma situação muito conveniente para os bandidos, pois permite manter a consciência tranquila. Podem dizer que roubam porque não tiveram oportunidades de estudo, porque nasceram na pobreza ou porque sofreram algum trauma de infância, entre outras desculpas".

Ao falar da alegada injustiça contra os pobres que seriam as maiores vítimas das penas de prisão, assim se expressou o doutor Anthony Daniels: “Um dos argumentos contra as penas de prisão é que a maioria dos detentos é pobre, e que isso é injusto. Ocorre que a maior parte de suas vítimas também é pobre. E, como o número de vitimas é sempre muito maior do que de bandidos, prende-los não é uma punição aos pobres, mas um benefício a eles".

"Na Inglaterra, anos atrás, quando houve uma onda de furtos de carros. Os bandidos envolvidos nesses crimes, além de lucrar com isso, realmente gostavam da emoção de furtar muitos veículos em curto período de tempo. Alguns criminologistas psicólogos, ao analisar o fenômeno começaram a dizer que furtar carros era uma forma de vício. Sobre essa teoria produziam-se inúmeros estudos, alguns dos quis incluíam até exames de ressonância magnética do cérebro dos bandidos, para provar que se tratava de uma doença neurológica. Em pouco tempo, os ladrões de carro começaram a me dizer na cadeia que eram viciados em furtar veículo. Eles obviamente não chegaram a esta conclusão sozinhos. Apenas estavam repetindo uma tese produzida por arrogantes intelectuais de classe média que desconsideram o fato dos bandidos serem capazes de escolher entre o certo e o errado independentemente de fatores externos. Negar sua capacidade de discernimento é o mesmo que diminuir sua humanidade".

Para encerrar a opinião da (competente) ex-ministra do Supremo Tribunal Federal - Ellen Gracie - recentemente aposentada:
"Sou rigorosa em matéria penal. Acho que é preciso ser. No Brasil, depois da democratização, passamos por um período de rechaço absoluto a tudo que significasse repressão. Mas qualquer pais democrático precisa ser rigoroso em matéria penal."

"É preciso que haja consequência para o delito, que o direito penal seja efetivo".

"No entanto quando for aplicada a a pena, é necessário que o sistema prisional cumpra sua finalidade de ressocialização. As penas não existem apenas para punir. Elas devem preparara a pessoa para que saia em condições de ser reabsorvida pela sociedade. E isso não acontece hoje.

Grifei (negrito) alguns trechos dos pronunciamentsos/entrevistas para destacar pontos, a meu juizo, relevantes.

Este texto estava pronto, quando me deparo com uma manchete de jornal, que torna a situação mais preocupante ainda. Dizia a manchete: "Estado do Rio arquiva 96% dos inquéritos de homicídio".

Ou seja, além de penas brandas, para os condenados, temos um absurdo número de inquéritos que são arquivados no meio do caminho. Em Goiás, segundo a reportagem, este percentual chega a 97%. Quanta gente deveria estar cumprindo pena e está por aí, em liberdade, comentendo, certamente, outros crimes. A impunidade é coisa absurda, dramática, inaceitável. E o pior é que, confirmando o que afirmou o Anthony Daniels sobre as maiores vítimas dos criminosos, também no Brasil o maior número de vítimas está na população mais pobre.

Então temos que todo o discurso de que condenamos muitos pobres, é postular contra os pobres, pois são estes as maiores vítimas da impunidade.

Fotos: Google imagens

5 comentários:

Freddy disse...

Carrano, como leigo em advocacia, pergunto:

Se tanta gente inteligente e formadora de opinião sabe que a justiça no Brasil está usando um código penal com validade vencida, PORQUE não se faz nada com a devida URGÊNCIA ?

Jorge Carrano disse...

Prezado Carlos,
Quem faz os Códigos assim como as leis em geral, é o Congresso. Você acha que eles iriam legislar contra eles mesmos? Amanhã poderão ser alvo da própria lei. Com raríssimas exceções e bota raridade nisso, são corruptos, fraudadores, bandidos em suma.
E os intelectuais são nocivos, hipócritas. E não sou eu só que penso assim. Você leu o que pensa o Anthony Daniels?
Advogados são, como regra geral, principalmente os criminalistas, um pouco bandidos também.
Abraço

Gusmão disse...

Li a entrevista com o Dr. Daniels e fiquei contente porque no número seguinte da revista VEJA foram publicadas várias cartas de apoio e concordância com a opinião dele. Por sinal, corajosa.
Abraço
Gusmão

Jorge Carrano disse...

Sabe, Carlos Frederico, o que mais me tocou, de tudo que li? É que na linha predominante de pensamento, e aí entra a intelectualidade, é preciso investigar as causas. Logo, a culpa está na causa, percebe?
O delinquente, o meliante não tem culpa.
Eu sou mais pragmático e penso que devemos punir o marginal. Estudo de causas é para acadêmicos que têm tempo a perder.
Abraço

Freddy disse...

Também acho, Carrano, mas sei que as leis, como você disse, são elaboradas por pessoas que têm passado/presente irregular, de modo que nunca farão revisões de grande profundidade no Código Penal vigente.
Minhas esperanças se foram.
Essa reforma fica pra meus filhos, ou futuros netos..., isso SE o Brasil se recuperar.