16 de março de 2015

Motorista-trocador

Fico estarrecido com a omissão e talvez beneplácito das autoridades, no caso dos motoristas que fazem também o papel de cobradores.

O risco que corremos,  os passageiros, os transeuntes, e o próprio motorista é enorme.

Não há como ter um olho no padre e outro na missa. Ou ele bem dirige com atenção e cuidado, para não avançar sinais, colidir com outros veículos ou atropelar um pedestre, ou bem recebe dinheiro e dá troco.

O riso de colisão ou atropelamento é muito grande.

E tem outro fato relevante e ignorado pelos motoristas. Quando embarca o passageiro eles simplesmente fecham a porta e arrancam, antes mesmo de dar o troco, quando há. Tenho presenciado alguns passageiros se desequilibrando e quase caindo ou dando com a cabeça nas barras de sustentação.

E porque eles partem antes mesmo do passageiro pagar e se acomodar? 

Porque têm horários rígidos a cumprir.  São controlados todo o tempo em função de horário e ocupação do ônibus.

Em algumas linhas eles disputam posições, como e fosse uma competição de automobilismo. Posso assegurar que tal acontece nas linhas 47-A e 47-B, que utilizo diariamente. Eles falam em “pular” um ao outro, porque estão sendo  “amarrados” pelos que estão a frente.

Algumas vezes nem mesmo atendem ao sinal de passageiros nos pontos porque estão “atrasados” ou serão “pulados” pelo carro que vem a seguir.

E tem troco de moedinhas, que tanto caem da mão do passageiro, quanto do motorista ao dar o troco. E com o veículo em movimento precisam se abaixar para pegar o dinheiro.

Uma loucura, um absurdo!

Lembro que no passado, há muitos anos, havia coletivos chamados de lotação. Neles só viajavam passageiros sentados. E o veículo era bem menor do que o ônibus tradicional. 


Lotação da linha Meier-Leblon, transitando na Av. Atlantica

Os motoristas destes lotações recebiam, eles mesmos,  o valor da passagem. Até dobravam a nota no sentido longitudinal e colocavam entorno do dedo médio. Eram somente cédulas de dinheiro, e o custo da passagem era redondo.

Abaixo outras linhas, no Rio de Janeiro.


Este modelo não conheci, bem mais antigo
Lotação












O mais importante, que faz toda a diferença:  não lembro se a passagem era paga ao embarcar ou na hora de desembarcar; mas sempre com o veículo parado. Ou seja, o motorista estava atento ao ato de receber e não também ao trânsito.

Ainda alcancei a época em que o tocador fazia jus ao nome funcional, porque ele efetivamente trocava o dinheiro dos passageiros já instalados em seus assentos, a fim de que os mesmos depositassem na caixa coletora, em moeda, o valor da passagem, na hora do desembarque.


Achava engraçadíssima esta frente de ônibus

O dinheiro não era entregue ao motorista e sim depositado numa espécie de cofre transparente (vidro) que fazia o papel de caixa coletora. O motorista apenas olhava para conferir se as moedas colocadas correspondiam ao preço da passagem. Lógico que este recipiente tinha um fundo falso que através de uma cordinha puxada abria, as moedas então caiam, ai sim, num cofre  metálico e fechado logo abaixo.


Linha Estrada de Ferro - Leblon

Se a passagem custava dois tostões e o passageiro não tinha as moedinhas, o trocador fazia a “troca”. O passageiro entregava a moeda de um mil reis ou quinhentos reis, por exemplo, e recebia em moedas de valor menor para poder depositar na saída.

Mas isto é coisa muito antiga. Tempos depois esta ação de trocar o dinheiro, foi substituída por fichas de plástico rígido. O passageiro pagava a passagem e recebia do trocador a ficha com a cor correspondente ao preço do trajeto que faria. Isto porque quem vinha do Rodo de São Gonçalo, por exemplo, para o centro do Niterói, pagava a mais caro do que quem iria descer do ônibus em Neves ou no Barreto, se o caso.

Hoje todos os percursos têm preço único,  mas nem sempre foi assim.

Os meninos trapaceavam e não colocavam as fichas na caixa coletora na saída do veículo (parecidas com as do tempo das moedas), isto porque elas serviam para a “futebol de botão”.

Mas como era feito este truque de não jogar a ficha no cofrinho, e como estas fichas se transformavam em “botões” para jogo de mesa, será contado em outra oportunidade.

Nota do editor: estas linhas (47-A e 47-B) fazem praticamente o mesmo percurso, em 95% do trajeto. A diferença é que um passa diante do MAC e o outro entra numa transversal antes, a fim de atingir a rua Presidente Prudente, na altura do Jambeiro. Já que o passa diante do museu só entra  a esquerda para atingir a rua  Presidente Prudente já no final dela, quase na esquina da rua rua Paulo Alves.
Na sexta-feira, dia 13, por volta das 8:30 h, duas das viaturas destas linhas disputavam uma competição desenfreada. Era uma ultrapassando a outra. Cada um que parasse num ponto, para embarque ou desembarque, era imediatamente ultrapassado. E corriam perigosamente. Imaginem esta disputa com obrigação  de receber o valor da passagem.
Só mesmo neste pais sem lei e sem ordem. Lembram da identificação biométrica para idosos? Pois é, esta duplicidade de funções para aos motoristas tem que acabar também.

2 comentários:

Freddy disse...

Eu sou um dos que malham os motoristas, sejam de ônibus ou van. No entanto, reconheço o que o texto aborda: o comportamento abusivo é estimulado pelas próprias orientações do patrão quanto a horário e ocupação.

Lembro bem dos ônibus de cara engraçada do Rio.

Nas ruas internas do Pé Pequeno, onde eu morei, durante uma época passaram as pequenas lotações, com o motorista fazendo também a cobrança.

A expressão "caiu a ficha" pode ser estranha para os jovens de hoje, não? (rs rs) Outra era a gente chamar as meninas foguentas de "ficha de ônibus": passavam na mão de todo mundo.
<:o)

Riva disse...

Não dá para comparar a quantidade de passageiros daquela época com a atual.

Barcas então ! Construíram barcas para 2.000 passageiros. O sistema de cobrança teve que ir "evoluindo".

Niterói, por exemplo, apesar da grande quantidade de passageiros, não comporta o tamanho atual dos ônibus. São muito grandes, e atravancam as ruas. Isso sem falar que em muitas linhas e horários, eles circulam quase vazios. FALTA INTELIGÊNCIA na Engenharia de Tráfego. Falta também coragem para implementar o que é necessário implementar.

Mas o pior mesmo é que FALTA EDUCAÇÃO à população para a implementação de sistemas mais eficientes e inteligentes. Aqui no BRASIL BANDIDO é simplesmente impossível você ver o que existe em grandes cidades pelo mundo afora.

Eu posso atestar alguns sistemas nos EUA, em grandes cidades, grandes mesmo, que funcionam perfeitamente.

- todas as linhas com ônibus com câmbio automático e ar condicionado, SEM trocador. Passageiro paga em dinheiro ou com passe, que faz a leitura imediata.

- linhas em que o passageiro entra porque tem um passe que comprou. Fiscal entra de vez em quando no ônibus ou trem, pedindo pra ver o passe. Se não tiver, a multa é enorme !

Vai fazer isso aqui no BRASIL BANDIDO !

Caiam na real, por favor. Sem solução pelo menos nos próximos 250 anos .... luz.