17 de setembro de 2012

Embalagens II


Em razão do enorme sucesso do post sobre embalagens, cuja publicação ensejou muitos comentários, que resultaram em polêmica de alto nível, animei-me em escrever mais sobre o tema.


Aos desavisados, aos obtusos e aos desatentos informo que se trata de uma pilhéria. Não que o assunto não seja embalagens, pois é,  mas que o post anterior tenha gerado polêmica e muitos acessos. Basta acessar.

É que gostaria de registar a existência, no passado, de embalagens clássicas que depois de consumido o produto, eram recicladas e se transformavam em objetos de uso doméstico, utilidades práticas ou brinquedos.

Querem um exemplo? Goaibada  cascão em caixa. A par de ter inspirado um bom samba do Dudu Nobre, cujos versos iniciais são:
“Goiabada cascão, em caixa,
é coisa fina sinhá,
que ninguém mais acha.”

Pois é, vejam na imagem ao lado, que a caixa, que era feita em madeira fina e clara, depois de saboreada  (mesmo, pois tinha sabor de goiaba) a goiabada, se transformava numa ótima carroceria de caminhão. O caminhão, que fazíamos rusticamente em casa, utilizando um formão, serra tico-tico e martelo, era a prova mensal de trabalhos manuais (matéria obrigatória), ao tempo em que a professora era Clotildes Mello Barbirato.

Bastava lixar bem, com lixa de madeira nº 2, para tirar as inscrições do nome do produto e fabricante. E depois pintar.

O mesmo processo de lixar para eliminar o nome do produto, aplicávamos na embalagem antiga, em madeira clara, que acondicionava o mate Leão.

A caixinha, muito bem acabada, sem pregos, só com encaixes, depois se transformava em vários objetos a gosto da criança. Podia ser um baú, num caminhão. Eu preferia transformar em cofre para guardar as parcas moedinhas que ganhava, em geral vendendo jornais velhos e garrafas vazias.


Depois de lixada e pintada (nem seria necessário pintar, pois, como disse, a madeira era clara e ficava bonita ao natural), bastava fazer um pequeno talho na tampa  (parte superior do embalagem ) suficiente para passagem da maior das moedas em circulação que, na época a que me refiro, era a de dois mil reis. Vejam ao lado a caixa de madeira do tradicional produto.

E o leite condensado Moça? Sua latinha se transformava, nas camadas mais pobres da população, em canecas para tomar café. Retirada a tampa por inteiro, era necessário martelar bem a eventual rebarba que ficava em volta, no sentido de não cortar os lábios quando levada a boca. Quem podia mandava fazer alças (de latão mesmo). Como era necessário rebitar para fixar a alça na caneca, era imperativo recorre a um profissional ( que colocava rebite ou soldava).

A figura do paneleiro desapareceu, mas era um profissional comum nas décadas de 1940 e 1950. Eles percorriam as ruas dos bairros e soldavam alças ou cabos de panelas que se desprendiam (ou trocavam os parafusos) e, acreditem, até soldavam furos que apareciam no alumínio, dado o constante uso, das panelas.

Estas latas do leite Moça, prestavam-se, ainda, para fazer telefone . Quem se lembra do fio grande de barbante preso em duas latas e que nos permitia falar à distância. O barbante precisava ficar bem esticado. Na hora de falar, colocava-se a lata na boca e o interlocutor a levava ao ouvido. Na hora da resposta invertia-se a situação.

Estou aqui me perguntando se isto funcionava mesmo ou era imaginação infantil. Não lembro,  perdeu-se nas brumas do tempo.

Outra embalagem que mudou desde então, foi a dos padres. Uma enorme mancada da Igreja. Abolir o latim e facultar a vestimenta comum aos padres  foi, na minha visão, uma enorme bobagem. Tirou a reverência das crianças (que beijavam a mão dos sacerdotes) e esculhambou a liturgia e o mistério que era blindado pelo idioma, que o povão mesmo não entendia, e era um fator positivo.

Dom Marcel Levebvre
Como já mencionei no blog, à exaustão, hoje sou ateu não praticante, mas já fui católico praticante (e até coroinha), e torci muito pelo Cardeal Marcel Levebvre, na queda de braço com o Vaticano. Pena que ele foi voto e voz perdedora.


7 comentários:

Freddy disse...

Não vou me meter a criticar os marqueteiros, vendedores, atravessadores, intermediários, pois já sou criticado ferozmente por ser totalmente avesso à maneira como a atividade comercial é exercida desde os tempos bíblicos. Quer me ver arrepiado dos pés à cabeça em ódio é citar-me a "lei da oferta e da procura", através da qual o indivíduo que detém o bem de que você precisa usa sua necessidade para auferir maior lucro.
Pronto, falei...

Quanto à Igreja abolir o latim, não é a primeira vez que você cita em comentários ou posts. Sou a favor, e diria mesmo que só consegui ler a Bíblia (parte dela, a bem da verdade) depois que foi lançada a versão "Bíblia na linguagem de hoje", ou seja, não só em português como trocando aquelas palavras e/ou expressões que ninguém entende por outras do cotidiano popular.

Quanto ao telefone de latas, é uma brincadeira instrutiva que é usada até hoje, sendo que há necessidade de um truquezinho no ponto onde se prende o barbante, para gerar mais vibração e assim poder transferir melhor a voz. Tem a ver também com a maneira com que se segura as latas, para não prejudicar a transdução voz/metal.
Abraços
Freddy

Jorge Carrano disse...

Freddy,
Qual é o truquezinho, para que funcione o telefone de latas e barbante?
Abraço

Gusmão disse...

Melhor consultar um engenheiro de telecomunicações para esclarecer.
Será que um dia o Papa usará calça jeans e camita T-shirt?
Abraços

Jorge Carrano disse...

Gusmão,
O Freddy é engenheiro de telecomunicações. Logo, o truquezinho deve ter embasamento técnico.
Vejamos pois quero ensinar aos meus netos.

Anônimo disse...

Instituições seculares devem manter suas vestimentas tradicionais que lhes confere autoridade e/ou poder.
Caso típico dos militares (forças armadas), da Igreja com suas vestes talares, e da Magistratura e suas becas.
Imaginem os ministros do STF agora julgando o maior processo do pais, sem suas vestes protocolares (toga/beca).
Que tal passeio completo? Aceitariam um blazer de grife?
:D Fernandez

Freddy disse...

O truquezinho é formar através de um abridor ou algo parecido uma lasca do metal do fundo, virada para dentro da lata, bem no meio. Prender o barbante na ponta dessa lasca. O objetivo é aumentar a flexibilidade da parte que recebe a vibração transmitida pelo barbante, ampliando-a. Usar uma linha rococó ou mesmo um fio de nylon de pesca aumenta a capacidade de transmissão, pois barbante é muito macio e perde vibração com a distância.
Esse brinquedo já foi vendido com a cuba em plástico rígido e o truquezinho era uma peça comprida feito um palito de fósforo virada pra dentro.
Abraços
Freddy

Jorge Carrano disse...

Taí pessoal. Simples, não?
Valeu, Freddy, em nome das crianças que poderão se divertir com este telefone, muito obrigado.
Abraço