Há três anos, quando completou quarenta anos de casamento com a Cristina, por volta de meia-noite pediu silêncio, com sua possante voz, pois queria “proferir algumas palavras”.
O burburinho, decorrente das conversas paralelas dos muitos amigos e parentes presentes, distribuídos em várias mesas, cessou e o Bazhuni começou a falar.
Enalteceu a mulher, mencionou os filhos, e por cerca de três minutos discorreu sobre nossa amizade, mencionando o quanto ela era duradoura, sólida, e importante para ele. Entre tantos presentes, distinguiu somente a mim. Porque, não sei. Generosidade seria a resposta mais adequada.
Fiquei tão emocionado, que abracei Wanda, minha mulher, pelos ombros, como um mecanismo de proteção, a fim de que as lágrimas não corressem pelo meu rosto. Não esqueci deste momento gratificante.
Conhecemo-nos há cinquenta e três anos, nas lides estudantis. Ele, tesoureiro e eu diretor social, depois de esportes, da Federação dos Estudantes Secundários de Niterói, que mais tarde ele veio a presidir.
Ao longo deste mais de meio século compartilhamos bons momentos, e sonhos.
Quando “dei baixa” do serviço militar, em 1958, lá estava ele fornecendo o arak (nome genérico de uma bebida muito forte, aromatizada com anis), para comemoração. Voltamos de Copacabana - éramos ao todo seis pessoas - muito tontos.
Também nas idas ao puteiro (porque não, se éramos solteiros e saudáveis), na Rua Alice, em Laranjeiras, estivemos juntos algumas poucas vezes (era caro e eu não tinha cacife para ir mais frequentemente).
Pescaria foi uma só, mas de gratas recordações. Passamos a noite de 1º para 2 de novembro, em 1971, véspera de finados, na vã esperança de que pescaríamos o suficiente para o almoço. Nem ele, nem os irmãos e muito menos eu pescamos alguma coisa.
Foi uma noite fria, com o vento soprando forte na praia de Piratininga, esquentados, apenas, pela batida de côco que consumimos rapidamente. Quando, vencido pelo cansaço e, porque não dizer, nocauteado pela batida de côco, adormeci na areia, foi ele quem conseguiu, não sei como, uma japona velha para que eu não ficasse congelado. Coisa de amigo.
Pela manhã, logo cedo, antes das seis, apareceu a bola e, mesmo de ressaca, jogamos três contra três até as pernas não mais obedecerem. Ai fomos em direção a peixaria, pois não poderaimos chegar em casa de mãos abanando.
Pela manhã, logo cedo, antes das seis, apareceu a bola e, mesmo de ressaca, jogamos três contra três até as pernas não mais obedecerem. Ai fomos em direção a peixaria, pois não poderaimos chegar em casa de mãos abanando.
Viajamos, juntamente com vários outros amigos, para Juiz de Fora, nos idos de 1959, quando transformamos numa farra a viagem de negócios que ele empreenderia, para fazer compras de mercadorias (meias e outros artigos) para abastecer a loja de tecidos e armarinho da família, na qual ele trabalhava, auxiliando o pai.
Outra viagem não menos emocionante, já aí com outro grupo de estudantes, entre outros, Silvio Lessa, Emetério Rodrigues Leitão, fizemos à cidade de Cachoeiro de Itapemirim, onde também aprontamos.
O que aconteceu nestas duas cidades, não contarei nem sob tortura, pois não quero que meus netos tenham mau exemplo. Minha imagem vai ficar comprometida.
Tadavia, para que imaginações mais férteis não exagerem na avaliação, afirmo que era tudo muito inocente se comparado com o que a juventude apronta hoje.
Querem um exemplo? Tirar foto limpando a bunda de uma estátua, de corpo desnudo, existente no Parque Mariano Procópio, em Juiz de Fora. Sobre Cachoeiro de Itapemirim não mencionarei coisa alguma, posto que acabei casando lá, há 45 anos, não muito tempo depois da malsinada viagem.
Casados, nos últimos anos reuníamos com freqüência para jogar buraco, em duplas, alternando o local das partidas, entre a minha e a casa dele.
Bazhuni era rotariano, sócio fundador e mais tarde presidente do Clube Líbano Fluminense. Com sacrifício pessoal e da família (tinha 3 filhos), construiu a sede campestre deste clube, lá passando os finais de semana acompanhando as obras.
Foi, durante anos, diretor da Escola do SENAC, em Niterói e dono de restaurante.
Gourmet e gourmand, cozinhava muito bem, em especial as iguarias árabes. Aprendeu com seus pais libaneses.
A loja Leão de Ouro, que pertencia ao pai e foi passando, primeiro para ele, e depois sucessivamente para os irmãos mais novos, era o ponto de encontro dos amigos comuns. Ficava na Trav. Alberto Victor, no centro de Niterói.
Aos sábados, durante anos, costumávamos nos reunir na loja e depois de muita conversa jogada fora disputávamos na porrinha quem pagaria a fatia de pizza no italiano ao lado.
Ajudou muita agente. Muita gente mesmo. Até pessoas que talvez não merecessem. Mas ele era assim, um coração generoso.
Como somos de uma mesma geração, é possível que nos reencontremos ainda em alguma parte. Seria uma alegria.
Um comentário:
Bela matéria, meu caro. Bela homenagem ao seu amigo.
ABrs,
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