23 de julho de 2019

Eu era feliz ...


Era?

Levei anos para saber. Enquanto isso, neste período de ignorância de que éramos felizes ou tínhamos alguns motivos para sermos felizes, vivi, ri, comemorei, vibrei e sofri com as seguintes coisas hoje proibidas, reprimidas, sancionadas:

Empinei muita pipa, por vezes com cerol na linha, mas jamais causei algum dano físico a quem quer que seja. Morava nas fraldas do Morro da Penha, na Ponta D’Areia, na Rua São Diogo.



Perdi certamente mais do que lucrei, material ou emocionalmente, nas toradas com uso do cerol.

Hoje se você usar, fizer, vender ou até mesmo guardar em casa, está cometendo um delito.

“Balãozinho chinês” acho que cheguei a soltar alguns poucos, poucos mesmo, eis que o dinheiro era curto para tal diversão.

Assisti ao lançamento de balões, multicoloridos e adornados com muitas lanternas. Alguns levavam rojões que espocavam no ar.

Hoje tenho consciência de que podem causar prejuízos, danos a terceiros e ao meio ambiente. Sem falar da possibilidade de por em risco aeronaves.



Nunca soube, não sei se porque era criança ou porque não aconteciam mesmo, de desastres provocados por balões ou ferimentos em terceiros (outras crianças) por causa do cerol.

Estamos na década de 1940 e na primeira metade da seguinte, de 1950. Ou seja, até meus 13 anos de idade (1953), quando a família mudou para apartamento longe do morro e da pracinha depois construída entre as ruas São Diogo e Santa Clara.

A vítima do cerol era eu mesmo. Meu dedo indicador ficava cortada numa falange quando empinava a cafifa, ou tinha que recolher a linha.

E as piadas com os portugueses como personagens? Que delícia que eram. Mesmo tendo avó e tios portugueses, nem de longe me ocorria estar ofendendo, mangando, constrangendo ou ridicularizando os patrícios, parentes ou não.

Anões, fanhos, gagos, veados protagonizavam ótimas piadas, criativas, inteligentes, muito engraçadas até hoje. Lembram desta abaixo?

“Manoel chega ofegante, suado, e indagado pela Maria sobre o fato, responde que aquele seu estado era fruto de ter voltado para casa a pé, correndo atrás do bonde.
Diz Maria: não fostes inteligente. Se vinhas correndo atrás de um táxi economizarias muito mais, ó pá.”

E os apelidos? Alguns eram tão adequados, tão criativos, que até mesmo parentes adotavam par se referir ou chamar o dito cujo. Como era o caso de um baixinho, apelidado de “pouca sombra”. Ou da vizinha opulenta, esta chamada à boca pequena de “rolha de poço”.

Bocage
Volto as piadas para relembrar que atribuíamos a Bocage de quem não tínhamos a menor ideia de quem se tratava, algumas piadas mais picantes, na ignorância de que obscenidades eram raras na obra de Manuel Maria Barbosa du Bocage,  celebrado escritor português.

No futebol a alegria do gol era manifestada no ato em que a bola transpunha a chamada linha fatal. 

Jorge Cury bradando a plenos pulmões: Goooooooool !!! Gol do Vasco, Ademir!

Agora há que esperar, até cinco minutos, como aconteceu no jogo Flamengo X Corinthians, para ser validado um gol. A dúvida era simples: estava ou não em impedimento?

No passado, na tal época que aqui e agora enalteço, esta questão seria objeto de novas discussões, dúvidas, gozações, raivas e ficava por isso mesmo, porque numa próxima partida o eventualmente prejudicado era favorecido por um erro involuntário do árbitro.

Neste lance especifico nem no videotape seria possível dirimir a dúvida. Tal a dificuldade pata o olho humano enxergar com clareza a movimentação dos jogadores e da bola.

Ou seja, não estou fazendo apologia do politicamente incorreto, das injustiças que por ventura ocorriam, isto porque jamais teríamos a certeza quanto a marcação, sem este malsinado recurso chamado VAR.

Logo, não sabendo da verdade restava discutir.

Nos bailes ou até nos bailinhos residenciais, nas casas de coleguinhas de colégio, podíamos furtivamente coxear as meninas sem que fossemos acusados de assédio.  Algumas até gostavam de sentir o latejo.

Quantos estupros eram praticados? Tirante os tarados, casos patológicos, só eram comidas as que queriam ser. Como  regra geral era consensual.

Claro que o assunto não se esgota aqui, mas tenho que trabalhar porque hoje em dia os filhos e netos não podem mais ajudar no sustento de seus pais e avós, em idade de aposentadoria. A vida ficou dura para todos que vivem honestamente.

Um comentário:

Riva disse...

Parece que tudo está perdendo a graça, não é ?

Temos que nos proteger, pessoalmente, blindar os nossos o máximo que pudermos, sem deixar que se alienem nesse "novo mundo".

Com certeza, não mais para mim, está chegando um novo mercado de trabalho, de oportunidades, de forma de se divertir, de conhecer, de sobre/viver com um pouco de alegria e qualidade de vida.

E preciso aprender a não enxergar mais a falta de educação alheia, que é hoje o que mais me incomoda, me faz mal mesmo assistir tanta m..... no meu ir e vir ao trabalho.

Exemplo : anteontem quase fui atropelado violentamente por um cara numa bicicleta a toda na calçada, olhando para o celular e não me viu. Me preparei para o pior, mas ele freiou em cima de mim.

Agora temos que estar atentos a tudo, pois não existe mais mão e contramão, nas ruas e nas calçadas.

Então, livros, Sky, Netflix, sexo (ainda), Red Label e violão.