O autor do texto abaixo, meu filho homônimo*, desde a adolescência caminha com as próprias pernas pela vida, guiado pelo cérebro privilegiado, que armazena bons valores morais e éticos, e conceitos filosóficos de várias correntes, tudo obtido e/ou temperado pela leitura e observação dos fatos e coisas da vida. Além do nome que lhe impus, penso ter, de alguma maneira não intencional, influído em seu gosto musical no que respeita ao jazz, da mesma forma que ele me ensinou, há anos, a apreciar o rock do Supertramp, do Pink Floyd e do Dire Straits todas bandas britânicas, assim como Eric Clapton, um branco que nada tem a ver com a cultura americana, e que toca blues com a emoção de um Robert Johnson. O texto do meu filho agora publicado revela que sentimento pode ser hereditário. Tomara que ele transfira para os filhos.
Os velhos e o jazz
"Quando eu era menino, achava que jazz era música de velho. Aquelas caras de cabelos brancos, sentados num silêncio quase de ritual, enquanto um som quase imperceptível saía de um piano ou saxofone mais “cool”. Ou então aquela aparente cacofonia, músicos que pareciam tocar, cada um, sua própria melodia, mas que conseguiam fazer o caos funcionar um pouco, e dali saia música.
Levei mais de 30 anos para entender o que é isso. Na verdade, foi exatamente aos 30 anos, quando fui comemorar a data numa viagem para Nova Orleans. A culinária “creole”, resultado da influência francesa e espanhola, os funerais animados que já havia escutado nos velhos discos de vinil do Louis Armstrong do meu pai, a arquitetura bem peculiar.
Mal sabia que eu que iria aprender, num mesmo lugar, e na mesma noite, duas coisas igualmente importantes.
A primeira é a riqueza e variedade do que se chama “jazz”. Não é um gênero musical, talvez seja mais um estado de espírito, como já li em algum lugar. No balcão do hotel, na hora do check-in, perguntei ao recepcionista: se eu tivesse só uma noite em New Orleans, onde eu deveria ouvir jazz? Ele respondeu: “Bem, se você tivesse uma ou mil noites, o lugar seria o mesmo: Preservation Hall.”
E partimos para lá. O lugar, no coração do quarteirão francês, era uma decadência só. Velho, feio, descascado, escuro. O ingresso, a bagatela de 3 dólares por pessoa. O show começava às 19h, mas quase duas horas antes já havia uma pequena fila, umas vinte pessoas, sentadas no chão, encostadas na parede, vendo a vida passar.
Nos juntamos à fila, meio sem saber o que esperar. Um saxofonista que mais falava do que tocava, era o anfitrião na calçada, e anunciava a melhor música do mundo. Até que um carro estaciona na porta, e um velhinho sai com um instrumento dentro de uma caixa (que só mais tarde eu saberia ser um clarinete). Então o nosso anfitrião anuncia, aos berros, “senhoras e senhores, este é o grande Willie Humphrey, o melhor clarinetista do mundo!”.
E outros músicos chegaram, menos reverenciados, mas todos anunciados. Quando o portão se abriu, entramos num salão sem ar condicionado, sem cadeiras, sem nada. Sentamos todos no chão, e os músicos entraram e começaram a tocar. Simples assim.
Sentei naquele chão todos os dias de minha permanência em New Orleans. Felizmente, o Preservation Hall sobreviveu ao furacão Katrina, e hoje, dia 11 de fevereiro, lá se apresentará Leroy Jones, que fará 53 anos este mês. Um menino, que adora jazz."
*Jorge Carrano, diretor da Tau Virtual
http://www.tauvirtual.com.br/pt/
http://www.cavernaweb.com.br/
5 comentários:
Voltei aqui ... rsrs.
Não curto jazz ... ainda .... na verdade tenho algumas gravações no meu iPhone com Herbie Hancock que gosto muito, principalmente quando existem convidadas a cantar com ele tocando. Muito bom mesmo. E em Friburgo tenho uns 3 CDs de jazz com base em saxofone, instrumento que me arrepia todo, e que infelizmente não consigo tocar.
Fui no Preservation em 2000, quando fui a NO para um congresso de Facility Management. Visitei o local, mas à noite fui a um show de blues em uma daquelas dezenas de bares com música ao vivo. E não me arrependi, som sulista da melhor qualidade, fenomenal.
A gastronomia creole é deliciosa, na minha opinião. Não esqueço de, naquela época, deixar 100 dólares em um jantar a base de feijão, arroz e camarões em um daqueles restaurantes maravilhosos do Quartier Latin.
Não fiz a tal incursão nas fazendas do outro lado do rio Mississippi, mas amigos que foram voltaram maravilhados com a visita : cultura local e gastronomia do dia a dia daquelas pessoas de lá.
Voltarei, espero.
Pouco mais de 4 anos após a publicação, o post foi comentado.
A narrativa do Jorge (filho) é muito pertinentes e ninguém se manifestara. Ainda bem que agora o Riva referenda algumas das opiniões expressas no post.
Aprender a tocar sax não deve ser difícil pra quem toca piano ou teclado, Riva.
O Ben Webster, por exemplo, um de meus favoritos no sax tenor, começou como pianista (bom).
Instrumento de sopro é outra história ... rsrs. Até gaita é complicado para mim.
O próprio fole do acordeão que estudei por 3 anos é complicado.
No entanto, mesmo não sabendo tocar sax, conseguia fazer arranjos para sax, pois a banda que tive na década de 80 tinha um saxofonista, que atendia pela alcunha de CURVAL !! kkkkkkk .... o cara absorveu a curva do sax em seu próprio corpo !! kkkkkk
Outra cidade por onde passamos de carro, Savannah, na Georgia, come-se uma comida creole dos deuses, e também a que chamam de CAJUN, com muita cebola, pimentão, aipo, alho, deliciosa. E uma pimentinha ....... rsrsrs
Voltando ao meu prato predileto, a AMERICA, uma das coisas que nos fascinam por lá é essa gama monstruosa de gastronomia, em função das diversas etnias por lá estabelecidas. Como São Paulo também é, mas lá é o país inteiro !!
Errata : não sei de onde tirei essa de Quartier Latin !!! É French Quarter !! rsrsrs.
Em NO, na North Rampart St, que é a principal via do French Quarter, tem o famoso Louis Armstrong Park, onde ficam diversos músicos tocando solitariamente ou em dupla. É simplesmente demais a qualidade da música que tocam.
Acho melhor parar de relembrar, caso contrário vou acabar comprando passagem ....
FLUi
Um bom seriado com o titulo de Downton Abbey, tem uma personagem, representada pela ótima atriz Maggie Smith, que é a condessa viúva, de nome Violet, que num dado episódio fez um comentário sarcástico bem ao seu etilo exatamente com fez o Jorge no texto.
Segunda ela parecia que cada membro da banda tocava uma coisa diferente.
Já vi alguns filmes de jazz e por várias vezes tive essa sensação, de que cada um tocava uma coisa diferente .... rsrsrsrs
O Led Zeppelin, super banda de 70-80, em suas jam sessions que muitos chamavam de concerto, tinha trechos mais ou menos assim, era nítido. Ficavam naquelas famosas 3 notas, se divertiam por uns 15 minutos, e a um sinal ensaiado, juntavam os instrumentos na continuidade da música. Como a platéia era composta por pelo menos 70% de doidões, tudo era lucro. kkkkkkkkkkkkkkk
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