25 de julho de 2012

Mal necessário


Há muito tempo funcionavam nas cidades algumas casas, ditas de tolerância, onde era possível comprar sexo. Eram também chamados de rendez-vous.

Os nomes destes estabelecimentos variavam um pouco mas os frequentadores conheciam os apelidos mais usuais, e sinais exteriores,  e não tinham dificuldade em localizar estas casas em qualquer cidade. Era suficiente perguntar onde era a "casa das primas". 

Quais eram estes sinais? Em geral luzes vermelhas na fachada, como nos existentes no   morro da Basileia, em Cachoeiro de Itapemirim, no Espírito Santo. Como já lá se vão alguns anos, é possível que eu tenha me enganado e fosse no Aquidaban. Pouco importa, porque a característica comum destes puteiros era a luz vermelha, tênue, nas varandas ou nos frontipícios. 

Livro de Lucius de Melo
Casa da Eny, foto de 2007, encontrável
no livro ao lado.
Os nomes pelos quais eram conhecidos, eram os das gerentes, proprietárias ou cafetinas que as mantinha e administrava. Como, por exemplo, o da Eny, em Bauru – SP, uma das casas mais famosas e  frequentadas do interior paulista.

Em Niterói havia um, na Rua Desembargador Lima Castro,  identificado apenas como “churrascaria”, mas que tinha por nome comercial "Churrascaria Ranho Alegre". Fazia sentido porque era possível comer carne embora não necessariamente pela via oral. E havia outros endereços mais ou menos conhecidos pelos nomes dos gestores: casos da "Casa da Berenice", defronte à Churrascaria, e, ainda, as da Dinah e do Beto.

Alguns estavam instalados em locais de mais difícil acesso, como a estrada Amaral Peixoto, no trecho que chamávamos de subida da”caixa d’água”, antes de Tribobó.

O Rio de Janeiro era pródigo em estabelecimentos,  para todos os gostos e bolsos. O endereço clássico para os menos afortunados, de dinheiro, era o Mangue. Muitas casas, muitas mulheres e muitas doenças venéreas era possível encontrar na região, agora urbanizada.

As “mulheres da vida” (podem rir, era assim mesmo que eram  chamadas), ficavam nas portas e janelas. Diferentemente da Holanda, em Amsterdã, onde ficavam (ou ficam, não sei mais) em vitrines.

Como já confessei aqui no blog, eu preferia diminuir a frequência, mas, como direi... comer melhor. Como se, mal comparando, ao invés de comer sempre chã de dentro, comesse menos, mas em compensação comer, já nem digo filé mignon, mas pelo menos uma alcatra ou contra-filé vez ou outra. Na rua Alice, em Laranjeiras.

Se você pergunta o porquê deste tema hoje, sem razão aparente, informo que é por causa da Gabriela. Personagem de Jorge Amado, em romance do mesmo nome, agora adaptado para a TV, numa novela (ver post anterior).

Ocorre que tenho assistido. E na velha Ilhéus do roteiro, das décadas de 1920 e 1930, existe uma casa de diversão, com dança, música, show de variedade e... sexo. Oferecido pelas quengas.

Bataclan da novela
Alguns coronéis defendem a existência e a manutenção em funcionamento do Bataclan (assim se chama o bordel) a fim de que os homens possam descarregar suas energias, acalmar seus hormônios com as prostitutas, não molestando suas namoradas, as moças de família, que devem se manter castas e puras, preservando suas honras até o casamento. A virgindade era um tabu, hímen onde se concentrava a honra das senhoritas.

Sabem como definiam a prostituição e a existência de bordeis quando eu era jovem? "É um mal necessário".

Exatamente nesta linha de visão que os coronéis de Ilhéus, no romance e na vida real tinham. Suas filhas, sobrinhas e netas não podiam correr risco de perder a virgindade e ficarem desonradas.

Oficialmente minha primeira relação sexual ocorreu em Miguel Pereira, quando ainda distrito de Vassouras, onde havia  um prostíbulo, um pouco retirado da cidade e para onde fui levado pelo Evaristo, motorista de um dos únicos dois taxis da cidade, conhecido de meu pai, a pedido e às expensas deste.


4 comentários:

Jorge Carrano disse...

Já sei, ficou grosseiro e machista o trecho em que falo dos tipos de carne que comia.
Perdão, mas foi irresistível fazer a blague.

Ricardo dos Anjos disse...

Sobre prostituição, veja a visão do meu poetavô Augusto dos Anjos, no poema "Monólogo de uma Sombra":

(...) sátiro peralta
que o sensualismo sodomita exalta
nutrindo sua infâmia a leite e a trigo...

Como que, em suas células vilíssimas
há estratificações requintadíssimas
de uma animalidade sem castigo.

Brancas bacantes bêbedas o beijam.
Suas artérias hírcicas latejam
Sentindo o odor das carnações abstêmias,
e à noite, vai gozar, ébrio de vício
no sombrio bazar do meretrício
o cuspo afrodisíaco das fêmeas.

E no poema "A Meretriz" fala de sexo como “danação carnal”, “orgasmo bastardíssimo da plebe”, “contorções sombrias”, “apetites bárbaros”, “concupiscências infinitas”, “homofagia hedionda”, “prostituição ofídia aziaga”. E num epíteto, num eufemismo digno de letra latinamente dramática de bolero ou tango, chama a mulher prostituta de “funcionária dos instintos”...

Jorge Carrano disse...

Caro Ricardo,
"Bazar do meretrício", é mais um dos vários nomes, designações e apodos, dos velhos e bons prostíbulos.
Viva o poetavô!
Abraço

Freddy disse...

Apesar de nunca os ter frequentado, os defendo. Não vejo problema algum na profissão, que em alguns países é oficializada, com carteira de saúde e tudo. Muito civilizado.

As coisas do sexo são muito polêmicas, com restrições exageradas em todas as grandes religiões. Imagino que seja para exercer domínio sobre as pessoas. Como é o maior dos prazeres do mundo e estaria, em termos, ao alcance de toda a humanidade, desde o mendigo até o príncipe (princesa), as sociedades arranjaram logo modos e jeitos de restringirem sua prática, alegando milhares de motivos.

Sou defensor do sexo livre em todas as idades e de todas as formas. Por questões puramente sociais (afinal estou inserido numa sociedade que defende com unhas e dentes sua restrição) sigo as regras e não o pratico fora do casamento, que aliás perdura por 35 anos...

Abraço
Freddy