5 de fevereiro de 2010

Deus, uma grande invenção.

Não é possível titubear quando a pergunta for, qual a maior invenção do homem? Só pode ser uma: DEUS.

A criação de "deus" foi uma brilhante resposta do homem, bem a altura do enigma indecifrável que lhe colocaram, que é o da criação do universo. Deus sempre será uma solução cômoda. Ou verdadeira, “só deus sabe”.

Tal idéia (censurável, admito), me ocorreu ao ler, estampado no vidro traseiro do automóvel, num indefectível plástico adesivo, em letras garrafais: DEUS É FIEL! Fiquei matutando se poderia haver um deus que fosse infiel e se seria necessário aquele marketing. Eu e meus botões, com os quais dialogo nessas ocasiões, chegamos a conclusão de que é oportuna esta campanha de melhoria da imagem do deus da vez.

Com efeito, desde tempos imemoriais fomos levados a temer a deuses de ocasião. E todos com procedimentos reprováveis. E o atual, quase uma unanimidade, também carece de propaganda institucional. Afinal, desde que ele mutilou Adão, extraindo-lhe uma costela, para dar vida a Eva, ficou meio que no ar um certo receio de canibalismo, tal como ocorre com aviões. Tiram-se peças dos que estão em piores condições, para fazer substituição naqueles que ainda têm alguma condição de voar. Não sei se por falta de peça sobressalente, ou se por economia de mão-de-obra, o fato é que o criador resolveu não fazer um novo ser humano integral, partindo do projeto.

Alguns deuses da antigüidade* clássica foram extremamente infiéis. Júpiter, o mais importante deles para os romanos, além das sete mulheres com as quais casou, protagonizou inúmeros casos de adultério, inclusive com pobres mortais, que lhe deram filhos bastardos. Alguns famosos. Mais infiel impossível. Nem se fale do incesto, porque aí ele passou dos limites. Aliás, em matéria de escrúpulos, o Jupiter não tinha nenhum. Tramou contra o pai e, juntamente com seus irmãos, tirou-o do trono, expulsando-o da sociedade dos deuses, após impingir-lhe cruéis torturas.

As relações de deuses com mortais não ficaram restritas aos tempos dos gregos e romanos, descritas na mitologia. O nascimentos de Jesus, filho de Maria, é uma história mal contada. Sei não, José deveria ter sido ouvido nesta história.

Bem, deixar o filho desamparado na cruz, a ponto do próprio se queixar, em termos lamurientos, “pai, porque me abandonaste”, não foi, convenhamos, um ato muito louvável e exemplo de amor e lealdade.

Nem se pense que o sol e a lua só foram adorados, como deuses, por alguns povos indígenas. Não, desde o mundo antigo, com o nome de Hélios, o sol já tinha seus adoradores entre os gregos, com templo, e até uma cidade lhe foi consagrada no Egito. O sol e a lua não têm em seu curriculum qualquer procedimento desabonador, embora não se possa atribuir a eles total lisura. Nunca se sabe o que fazem quando ocultos, nos eclipses, tanto um quanto o outro. E a cidade de São Paulo sempre foi discriminada pelo sol, que por lá aparece uma vez ou outra, e olhe lá.

Voltando a campanha institucional (Deus é Fiel), admitamos que ela é válida e oportuna. “Deus permita” que não seja enganosa, pois há uma legião de crentes esperando pelo milagre de que o ser humano, idéia e criação dele, resulte numa obra boa. Até agora foi um fracasso.

Nota do autor: Este texto é de agosto de 2004. A republicação comprova que perdi, por inteiro, qualquer vergonha em relação aos meus escritos.
Cumpre informar que nos dias que correm, mais precisamente há 44 dias, contínuos, a cidade de São Paulo vem sendo assolada por chuvas incessantes que têm provocado muita destruição e fazendo vítimas humanas. Em compensação, no Rio de Janeriro, o astro rei - o sol - deus ou não, vem brilhando intensamente e pruduzindo calor no limite do suportável. Ontem, sensação térmica de 48 graus.

* Quando foi escrito ainda se usava o trema. Esta edição não foi revisada.

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