Não chegou a ser um grande mico; contarei mais em função do contexto (personagens, empresas) do que da vergonha momentânea que passei.
Fui procurado pela Francisca, encarregada de arregimentar jovens executivos, fumantes, que constituiriam um painel de discussão, como parte do trabalho de pesquisa de mercado, na fase de pré-lançamento de uma nova marca de cigarros.
Eu era fumante, na época, habito que só abandonei em 1982.
Cheguei ao local combinado e me incorporei a um grupo que já estava sentado ao redor de uma mesa retangular. Seríamos oito participantes, no tal grupo de discussão.
Numa das cabeceiras, Mario Castelar*, meu amigo até hoje, para minha alegria, iria moderar os debates. Ele era expert na área de pesquisa de mercado, e estava vinculado a uma firma do ramo chamada Marplan, que por sua vez havia sido contratada pela Cia. de Cigarros Souza Cruz, dona da marca a ser lançada**.
Feitas as apresentações de praxe e explicada a mecânica do painel. Teve início a discussão.
Como eu era o primeiro à direita do moderador, e a palavra seria dada aos participantes obedecendo o sentido anti-horário, recebi dois maços de cigarros, no tamanho clássico.
Ao me entregar os dois maços o Castelar me pediu que dissesse qual a diferença, entre os dois, que me chamava a atenção desde logo.
Peguei os dois maços, olhei, olhei, girando-os nas mãos em busca de diferenças, e nada.
Depois de provavelmente um minuto, que pareceram uns dez, finalmente respondi: não vejo qualquer diferença. Silêncio absoluto. O moderador, me olhando fixamente, indagou: nenhuma mesmo? E eu, convicto, respondi que não.
OK, então passe os maços para o Fulano, que era o participante logo a minha direita.
Mesma pergunta e o participante ao meu lado, sem vacilar, respondeu: um é marron e o outro verde.
Eu, daltônico, não consegui diferençar os dois maços pelas cores. Fiquei muito encabulado por não ter podido contribuir, pelo menos até aquele ponto, para o objetivo do painel. Pedi a palavra para justificar meu mico, explicando que tenho discromatopsia.
A discussão continuou, e quando foram abordados outros pontos pude participar com minhas opiniões.
O cigarro era o Richmond, e deveria ser posicionado no nicho acima do Luiz XV, por exemplo, outra marca já consagrada da empresa. Lembro bem que havia uma preocupação com o fato de que poderia haver dúvidas entre os consumidores, sobre a correta pronúncia do nome. Ao que alguém retrucou que o automóvel Galaxie (primeiro supercarro brasileiro), passou por esta prova, da pronúncia, sem maiores problemas, por causa do público a que se destinava. O nome Richmond pretendia fazer associação com a cidade do estado da Virgínia, onde era disputada uma prova clássica na época.
Enfim, o nome foi aprovado, a cor do maço escolhida foi o verde forte (bem escuro), o cigarro foi lançado e não aconteceu. Não sei quanto tempo ficou no mercado, pois eu mesmo nunca fui consumidor da marca. Mas durou pouco.
* também citado no post Mico, em 18 de novembro.
** Também participei do grupo que discutiu na fase de pré-lançamento da revista VEJA. Ter amigos bem posicionados, tem entre outras, a vantagem de propiciar oportunidades e experiências.
2 comentários:
Gostei! Mas, acho que talvez tivesse sido pior se a diferença fosse mais banal, como o tamanho ou o fato de um ser cigarro e o outro uma borracha daquelas compridas.
Juliana,
Obrigado pela visita e pela opinião.
Mas veja que se as diderenças fossem do tipo que você mencionou, o caso seria de cegueira.
Bj. Vô
Postar um comentário