31 de maio de 2010

Verissimo

O Verissimo, LF, é tão brilhante quanto o pai Erico. Em estilos diferentes. Assim como a Fernanda Torres é tão boa atriz quanto a mãe, Fernanda Montenegro. Também com estilos interpretativos e escola distintos.

O Verissimo cronista, contista, articulista que ocupa as páginas do jornal O Globo, é uma das minhas leituras obrigatórias.

A par de escrever bem, com todos os predicados que lhe são atribuídos, como criatividade, humor, senso critico, frasista emérito, etc, ele tem um bom gosto admirável.

Seja em relação aos doces, principalmente os encontrados nas docerias parisienses, seja em relação ao jazz, seja em relação ao futebol, seja em relação as mulheres bonitas.

Quem antes dele tinha prestado atenção na Patrícia Poeta? Agora que ela está com grande visibilidade, apresentando o Fantástico, ficou mais fácil. Mas ele foi o primeiro a enaltecer a beldade.

Lembro sempre de um comentário dele, de alguns anos atrás, sobre a Vera Fisher (a dos áureos tempos). A Vera seria tão... - como direi sem ofender os mais pudicos - vá lá, atraente, que serviria como medição para definir a macheza dos homens. Segundo ele, o cara que encarasse a Vera sem bambear as pernas, sem tremer a ponto de seus joelhos ficarem batendo um no outro, poderia afirmar que era homem de verdade. É verdade. Ótima imagem. A Vera - esta do passado - era tão “cheguei”, que poderia dar tremedeira mesmo.

A Vera Fisher eu incluo no rol da Rose Di Primo, da Luma de Oliveira, da Kate Lyra, da Rose Rondelli, assim como a Alcione Mazzeo, mulheres que, no passado recente, mexiam com a cabeça e outras partes da anatomia dos homens; e outras não menos atraentes, vistosas, mulherões mais jovens, cuja listagem me abstenho de mencionar para não cometer injustiças traído pela memória.

Voltando ao meu personagem de hoje, o Veríssimo, lembro de um ensinamento dele, relacionado à Paris. Segundo o cronista, para conhecer Paris, a ponto de ficar sabendo os endereços das docerias melhores, o sujeito tem que fazer no mínimo 3 viagens àquela cidade.

Na primeira, evidentemente, é imperioso fazer o passeio de bateau mouche, ir ao Louvre, à Torre Eiffel, andar pela Champs-Élysées, partindo do Arco do Triunfo, e outros pontos mais ou menos badalados, como as igrejas Sacré Coeur, de Montmartre, e Notre Dame.

Só depois de esgotar as visitas a estes lugares, é que, andando a pé, você fica conhecendo os bons bistrôs, as boas padarias e bons cafés.

Só discordo do Veríssimo em relação à política. Neste particular fico mais próximo do João Ubaldo Ribeiro, seu vizinho dominical, nas páginas d’O Globo.

30 de maio de 2010

O assunto é futebol

Leio que a indústria de aparelhos de TV está vendendo como nunca. A razão é uma só. Novas tecnologias permitirão acompanhar com muito melhor definição de imagem, as partidas da Copa do Mundo de Futebol.


Fico a matutar se seria possível mensurar, traduzir por exemplo em dólares, o volume de negócios que são movidos pelo futebol, em especial de quatro em quatro anos, quando é realizada a competição mundial.

Nas sedes, além de construção e reforma de de estadios, o que gera muita atividade de obra civil, e consequentemente venda de materiais de construção, há sempre necessiadade de ampliar a rede hoteleira, melhorar os meios de transporte e comunicação, que exigem pesados investimentos.

Os negócios vão desde a grama empregada nos campos de competição, até a infinidade de uniformes de jogo, bolas, redes das balizas, chuteiras, caneleiras, etc.

As gráficas trabalham muito com folhetos, ingressos para os jogos, albuns de figurinhas e talonários de notas fiscais, já que o comércio vende muito mais no período. Também a indútria de bebidas se beneficia com o aumento de vendas.

O patrocínio das trasnissões pela TV e enissoras de rádio atinge cifras fantásticas. Os direitos de transmissão custam aos veículos muito dinheiro que é pago a FIFA e gira em forma de prêmios a juda aos países partucipantes.

O imenso número de profissionais, de todo o mundo, que se deslocam para cobertura dos jogos, e ocupam praticamente todos as acentos das aeronaves, geram grandes receitas para as companhias aéreas.

Igualmente a indústria têxtil se beneficia, em todo o mundo. Afinal precisam ser confeccionadas bandeiras e flâmulas, camisas para as torcidas, faixas e adereços para cabeça.

Ficaria aqui ocupando um enorme espaço neste post se me dispusesse a mencionar os negócios gerados pelo fenômeno copa do mundo.

E traduzir isto em moeda é negócio para os economistas que têm por ocupação fazer projeções sem qualquer compromisso com a realidade.

Quem há, todavia, de negar que se trata do maior evento de nível mundial. A começar pelo fato de que a FIFA tem mais países a ela ligados do que a ONU, como é sabido.

São mais de uma centena de países desde as eliminatórias continentais, até que cheguem aos 32 que vão para a disputa das fases finais.

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Já louvei o José Mourinho, que reputo um dos melhores técnicos de futebol em atividade. Bom estrategista, é adépto do futebol de resultado. Privilegia a tática.

É partidário do rigor tático de tal sorte, que se poderia afirmar que ele não é um técnico ou treinador, mas sim um adestrador. Com ele no comando, cada atleta em campo tem uma função que deve assumir rigorosamente. E, lógico, é preciso que ele tenha a confiança do grupo. Que todos creiam que ele sabe o que está fazendo.

Na Europa, como regra geral, esta disciplina tática é uma característica comum a todas as grandes equipes, sejam inglesas, sejam espanholas ou italianas, só para citar os campeonatos mais festejados.

Outro dia assisti entrevista, na ESPN, do jogador André Dias, que já passou por Flamengo e São Paulo, e que atua na Lazio, em Roma, Itália.

Ele confessava que é muito mais fácil jogar na Itália, posto que ele deve apenas cumprir o que é determinado pelo técnico, como função tática. Exemplificou dizendo que assim que chegou ao clube, sempre que se aventurava um pouco em jogadas de ataque, o treinador gritava para que ele voltasse para seu lugar, na defesa. Não poderia ultrapassar a linha divisória do campo.

É evidente que a habilidade individual facilita o desempenho do papel. De atacantes em especial, mas também dos defensores. Mas a obediência ao esquema adotado é mais relevante. Afinal trata-se de confronto em busca de resultado.

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Fernando Calazans, comentarista esportivo e articulista de O Globo, e também da equipe do canal ESPN, é um destes críticos severos do futebol defensivista, e irônico e mordaz com relação aos volantes que ele chama de cabeças de bagre, brucutus. É, declaradamente, adepto do chamado futebol arte.

Bem, estou citando o Calazans porque na sua coluna deste domingo ele volta a se referir aos cabeças de bagre, tema recorrente em seus comentários, ressalvando que no passado alguns volantes, que ainda não eram assim chamados, eram jogadores habilidosos, criativos e inteligentes.

E citou o Danilo, center-half do Vasco, como exemplo de jogador que se caracterizava pelo toque fino da bola.

Já citei o Danilo como integrante da equipe do Vaco que me fez ser torcedor do glorioso gigante da colina. Ele a Ademir, grande artilheiro do Vasco e da seleção nacional que disputou a Copa do Mundo de 1950.

Danilo tinha o apelido de Príncipe, tal sua maneira elegante de jogar, sempre de cabeça erguida, com ampla visão de todo o campo, o que lhe propiciava passes e lançamentos precisos.

E usava um corte de cabelo que durante as décadas de 40 e 50, do século passado, era o adotado pela maioria dos garotos. Os dois cortes mais conhecidos, na época, eram o “príncipe danilo” e o “meia cabeleira”. Era só sentar na cadeira e o barbeiro perguntava: à príncipe Danilo?

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Uma ótima notícia para os vascainos. O Zico aceitou convite para ser dirigente de futebol no Flamengo. Pé frio emérito, vai levar à banca rota, ao fracasso, o rubro-negro carioca.
Isto não é exatamente uma profecia, está mais próximo de uma praga. Toamara que pegue!

28 de maio de 2010

Teatros

Ontem foi reaberto o Municipal do Rio de Janeiro. Também o Colon, em Buenos Aires, há alguns dias.
Ambos foram restaurados, interna e externamente, através de obras que duraram de dois a três anos. O Municipal do Rio, que vi por fora recentemente, ficou lindo. À noite, então, com a nova iluminação externa, impressiona.

E ficou muito charmoso o Assyrius, reaberto, agora com café na calçada, na 13 de Maio.  Vale a pena conhecer.
E o Colon, a julgar pelas notícias recentes, também foi inteiramente recuperado, voltando ao explendor que possuia.

Dois belíssimos teatros.

Prédios magníficos e palcos com históricos de apresentações de grandes talentos, em diferentes manifestações artísticas, como balé, ópera, montagens de peças teatrais de consagrados autores, protagonizadas por atores e trizes de fama internacional, como Sarah Bernhardt, por exemplo.

Em tempos idos, o Municipal carioca abrigou bailes de gala, carnavalescos, e desfiles de fantasias. O que, convenhamos, é um vilipêndio.

Em matéria de teatro, tive oportunidade de visitar, mesmo que parcialmente, outros com arquitetura portentosa, clássica, austera, que são o Royal Opera House Convent Garden, em Londres, e o Dresden Semperoper, na cidade do mesmo nome, na Alemanha.

Todavia, entre todos, o que mais me impressionou, não só pelo majestoso prédio, mas pela rica programação anual, variada, e pelo quadro de funcionários efetivos, mais de mil, mantidos parcialmente pelo estado, composto de artistas (músicos, tenores, sopranos, etc), eletricistas, engenheiros, costureiras, iluminadores, etc., foi o teatro da Ópera de Viena, ou, em alemão, como no catálogo que comprei, Wiener Staatsoper.

O orçamento anual é da ordem de 100 milhões de euros e, como disse acima, o estado banca 50% deste valor. São produzidas entre 50 e 60 óperas por ano, totalizando cerca de cerca de 200 apresentações.

O teatro possui cenários para montagem de 120 óperas e um guarda-roupa (figurinos) com cerca de 150.000 indumentarias e adereços.

Não, não sei isto de cór. É óbvio que se eu não tivesse anotado estes dados, relatados pelo guia local, que falava um português meio arrevezado mas inteligível, eu não saberia destas coisas.

Não deu para assistir coisa alguma neste teatro, eis que os ingressos são (ou eram, na época), vendidos com muita antecedência. Existem os frequentadores habituais, que assistem a quase todas as apresentações ou récitas. Já pensou, 50 óperas anuais?

Em contrapartida, assiti no Palácio de Schombrum, residência dos imperadores austríacos, da casa dos Habsburgos, uma apresentação de parte da famosa filarmônica, de arrepiar. Sensacional. E cantores líricos de muito bom nível.

Como não sou expert em música clássica ou erudita, minha opinião está calcada no quanto me emocionou. Não se trata de sentimento, mas sim de emoção. O mesmo acontece em relação a uma tela ou uma escultura. Se me emociona, então é o quanto basta.

Guardo com muito carinho o programa do dia. Ah! No intervalo foi servido champanhe. Chic, não?

Em resumo, indo a Viena*, ou Wein, é obrigatório ir a um coffeehaus, e tomar um dos melhores cafés do mundo. Comer um pedaço da famosa sachertorte, no hotel Sacher, e ir ao Teatro da ópera, se possível para assitir algum espetáculo.

Para que meus amigos paulistas não se sintam discriminados, devo admitir que o Municipal de São Paulo também é muito bonito e elegante. Lá assisti, em 1994, a montagem da opereta Porgy & Bess, com orquestra e vocalistas americanos. Bonito espetáculo, mas senti falta de Ella Fitzgerald e Louis Armstrong, que fizeram uma gravação memorável da obra dos Gershwins.


* Se você é ligado em arquitetura, vale a pena pegar um bonde e circular através da Ringstrasse. Você embarca e desembarca, querendo, no mesmo lugar. Também bastante interessante é a Escola de Equitação, espanhola, onde são treinados aqueles belos exemplares de cavalos andaluzes, brancos e imponentes.

27 de maio de 2010

Motivação em âmbito nacional

Seria interessante um estudo do DNA do futebol, particularmente do gênero Copa do Mundo e da espécie Seleção Brasileira.

Não existe no mundo evento que mobilize tanto as pessoas.

O que se discute, o que nos preocupa, o que nos une como cidadãos, é a Copa do Mundo que se aproxima. Mesmo as pequenas divergências sobre convocação, não comprometem a paixão nacional pelo futebol. Aliás, fazem arte. O clima é de festa.

Bancos, indústrias e prestadores de serviço estão adaptando seus horários para que todos possamos acompanhar aos jogos do Brasil.

Os comerciais veiculados nas TVs, quase sem exceção, têm a Copa do Mundo como mote. A alusão pode ser explícita ou velada. Mas está lá.

As lojas comerciais se embandeiraram, bolas de soprar enfeitam vitrines, o verde e amarelo está pintado nas calçadas e nas fachadas de algumas residências.

Estou pensando em aderir e vir ao escritório, nos dias de jogos, com minha camisa amarela com detalhes verdes (risos, por favor). Acho que seria um certo exagero chegar ao ponto de pendurar bandeirinhas na sala, assim como receber meus clientes e amigos ao som de vuvuzelas. Mas acho que não surpreenderia. Ninguém se espantaria.

Minha sugestão, de que deveriam tentar descobrir a estrutura da molécula de DNA deste fenômeno, seria no sentido de poderem ser identificados os gens específicos da paixão por futebol.

A partir daí seria introduzido um genoma completo, com seus milhões de pares nos seres humanos, cujo DNA seria modificado.

Como já foram mapeados os 3 bilhões de bases químicas do DNA humano*, quem sabe isto seria possível?

Quem sabe, modificados geneticamente, passaríamos a nos mobilizar, a nos motivar, para numa corrente indomável, numa manifestação conjunta incontrolável, transformar o país.

Com o mesmo empenho e vontade com que torcemos pela seleção do Dunga. Seria fantástico canalizarmos toda nossa energia, nosso desejo, no sentido de consertar o país. Isto sim seria uma corrente p'ra frente.
Já pensaram em políticos (uma grave doença nacional) com genes do patriotismo, do interesse coletivo sobre o individual (o dele, sempre)?

Talvez fosse possível transformar o Brasil, efetivamente, e nosso IDH passaria a ser o melhor no planeta.



* Estas informações científicas foram extraídas da edição nº 2166, maio de 2010, da revista VEJA, páginas 104/107.

26 de maio de 2010

Meus tipos inesquecíveis

Já contei aqui no blog que nós líamos, na infância (entre os 9  e 12 anos), a revista seleções do Reader’s Digest. E também mencionei a seção “Meu tipo inesquecível”

Pois bem. É chegada a hora de falar de meus tipos inesquecíveis, amigos ou não, que me impressionaram pela inteligência e/ou cultura, ou pela capacidade de se relacionar, ou pelo brilho profissional, enfim, por um traço qualquer de sua personalidade.
Todos são, ou foram (pode ser que alguns tenham morrido), vencedores.

Devo ter algo que consegue conquistar a simpatia e o respeito de pessoas especiais, pela inteligência, cultura e caráter.
A ordem de citação não hierarquiza importância ou mais estima ou respeito pelo personagem. Trata-se de uma ordem aleatória.

1) Caio Assis de Aragão

Até onde sabia, havia iniciado sua carreira profissional como advogado da General Electric (GE) empresa de capital americano que fabricava desde lâmpadas até turbinas para aviões.

Foi, também, Procurador da Previdência Social.

Da GE, transferiu-se para a Cia. Fiat Lux, de Fósforos de Segurança, maior fabricante de fósforos do país, que detinha, na época, 80% do mercado, por opção. Era necessário descaracterizar monopólio (trust). Foi, na Fiat Lux, Diretor Jurídico e Administrativo.

Mais tarde, convidado, transferiu-se para a Xerox do Brasil, que havia pouco se instalara no país, como Diretor Superintendente. Por mera coincidência, fui uma das primeiras pessoas a saberem de sua ida para a Xerox. Estava em São Paulo, no Hotel Jaraguá, a serviço da Fiat Lux, e também ele estava hospedado neste mesmo hotel. Casualmente estávamos juntos quando ele recebeu, na recepção, o recado de que o Sergio Gregory (presidente da Xerox), telefonara e pedira um retorno da ligação. Era para negociar a ida do Caio para a firma americana.

Extremamente elegante, no trajar e na postura, e muito sedutor, estava sempre disposto a prestar favores aos seus pares e pessoas mais bem posicionadas social e economicamente.

Este foi o traço de sua personalidade que fez dele um dos meus tipos inesquecíveis, qual seja, atuar jogando  com o tráfico de influências.

É óbvio que a cada favor que ele prestava, estava abrindo uma linha de crédito com o favorecido. Nada a condenar.

A passagem que mais me recordo, e me envergonho, aconteceu quando eu era estagiário no Departamento Legal e ele, como já mencionei, Diretor Jurídico.

O presidente da empresa tinha terrenos em Niterói, na região oceânica, e surgiram problemas quanto ao imposto territorial devido. Naquela época a Prefeitura de Niterói era um caos absoluto (surpreendentemente já foi pior do que é). Pois bem, como eu morava em Niterói, coube-me a tarefa de ir a PMN - nada mais lógico - para tentar solucionar a pendência. Demorei-me mais do que o normal, em face do precário atendimento na Prefeitura. Cheguei muito tarde no escritório da Fiat, na rua Visconde de Inhaúma, no Rio, e antes mesmo que eu me dirigisse a sala onde trabalhava, a secretária dele me abordou dizendo que ele queria falar comigo com urgência. Estava brabo. Suponho que o Jules Poncinet, então presidente da Fiat Lux, tenha pedido uma resposta sobre o caso e ele não a tinha.
Perguntou, antes mesmo se eu resolvera ou não o caso, porque eu demorei tanto. Respondi falando das dificuldades, até mesmo para o funcionário encontrar os registros dos terrenos, que dirá calcular, naquelas antigas máquinas de somar, o valor dos impostos com multa e juros.

Bem, aí ele perguntou, “e porque você não me telefonou?” Respondi que a ligação telefônica custaria Cr$ 0,50 centavos. Veio então o comentário que não esqueço: “e minha tranqüilidade não vale cinquenta centavos?”.

Para situar melhor às circunstâncias, vale dizer que naquela época, anos 60, não havia celulares. Nem orelhões. As ligações telefônicas de favor, eram feitas em bares, botequins ou farmácias, que cobravam pela ligação local 0,50 da moeda da época. E eu, com baixo salário, não podia me dar ao luxo de gastar os 0,50.

Anos depois, inclusive por indicação dele, fui guidado a gerente e as coisas melhoraram.

Não faz muito tempo, fui localizado pela ex-secretária  dele (na Fiat Lux e na Xerox), através da internet. Trocamos alguns mails, mas não falamos do Caio, a quem ela servia com uma fidelidade impressionante. Era difícil não respeitá-lo e estimá-lo.

2) Mario Castelar da Silva

O Castelar é um caso especialíssimo. Tinha tudo para não dar certo. De família pobre, muito pobre mesmo, conforme ele mesmo revela até hoje, superou todos os obstáculos que encontrou em sua ascensão social e profissional, com base na sua inteligência, memória, facilidade de expressão, raciocínio rápido, disponibilidade para aprender e, principalmente, capacidade de se relacionar com gente. Com humildade estudada, conquista as pessoas pela simplicidade.

Em face de sua boa cultura geral e de sua facilidade de comunicação, transita bem nos meios mais elitizados, cultural e socialmente, e também tem conversa para pessoas mais humildes, o chamado povo.

A simplicidade planejada, mascara seu bom gosto pelas artes, boas comidas e bebidas.

Foi, quando estudante, orador laureado e escrevia suas poesias. Foi, ainda, professor na Escola Superior de Propaganda e Marketing.

Exerceu cargos diretivos em grandes agências de publicidade, como a Norton e outras, e empresas nacionais e multinacionais como o Grupo Grupo Matarazzo, Rhodia têxtil e Nestlé.

Hoje é palestrante e consultor em marketing, e autor de livros relacionados à área.

Dentre suas tiradas, que demonstram seu raciocínio rápido e espírito criativo, uma das melhores aconteceu quando vínhamos de São Paulo para Niterói, pela Dutra, e um ônibus da Cometa, no sentido contrário, acendeu o farol alto, muito forte, que praticamente o cegou, estando ao volante: “pô, o cara ligou o sol na minha cara”.

Acompanhei, desde a Cia Internacional de Seguros, onde começou como office-boy, toda a trajetória profissional do Castelar. Fui responsável, e talvez ele jamais me perdoe por isso, pela sua ida para o Grupo Matarazzo.

Ele, todavia, foi responsável pela minha ida para São Paulo, o que também não perdôo.

Somos, que sortudo sou, amigos leais.


3) Marcos Telles de Almeida Santos

Certamente uma das pessoas mais inteligentes e cultas que conheci.

Poliglota, falava inclusive um pouquinho de holandês, eis que foi casado com uma nativa daquele país.

Lembro que, certa feita, fui incumbido de recepcionar, na Portaria, um diretor de firma suíça, fabricante de teares modernos, que dispensavam a lançadeira de acionamento eletro-mecânico.

Evidentemente que, com o meu parco inglês (acabara de concluir o básico do Yazigi), estava me saindo com dignidade, naquela base do muito prazer, sente-se por favor, o Dr. Marcos já está a caminho e outras amenidades, quando o Marcos inrompe na sala, saúda alegremente, “bom dia!” e pergunta, “que idioma estamos falando?” Para ele seria simples, mesmo que a opção fosse pelo alemão. A pergunta nada tinha de afetação ou esnobismo, era o jeitão brincalhão dele.

Mas não é esta a maior tirada do Marcos ou o fato mais interessante que tenho registrado na memória.

Grande sinal de sua agilidade mental e capacidade de ironizar sem ferir, deu-se numa reunião de excutivos, a qual estava também presente um trainee, formado em engenharia, filho de um importante industrial. Este estagiário, à horas quantas, durante uma narrativa de um dos gerentes presentes, deu um bocejo, que embora discreto foi percebido pelo Marcos, que presidia a reunião (ele era o Diretor Geral). Seu comentário veio rápido e certeiro como uma flecha: “Américo, você não imagina o quanto estamos invejando você”.

Lógico, numa alusão a que poderia ser fruto de uma noite mal dormida, em função de programa madruga a dentro.

Mas surtiu o efeito admoestador que cabia.

Era preciso estar sempre muito ligado ao conversar com ele, pois seus apartes eram muito sutis, fruto de uma inteligência viva e ótima cultura geral.

O Marcos tinha rotinas das quais não abdicava; a primeira coisa que fazia logo cedo, era jogar tênis no Paulistano, que ficava muito perto de seu apartamento de cobertura, localizado em Cerqueira Cesar (Jardins?).

Era dos poucos sócios do tradicional clube, que tinha uma quadra a sua disposição por uma hora diariamente. Com horário estabelecido. E escolhia os adversários.

Dono de uma selecionada pinacoteca, dirigia uma Variant (espécie de camionete) amarelo ovo, e acompanhava novelas na TV. Este era um lado fascinante de sua personalidade. O contra-senso. Lamento demais termos perdido contato, pois ele foi um excelente amigo. Quando deixei o Grupo Matarazzo e retornei para Niterói, ofereceu para mim e para Wanda, como sói acontecer com pessoas de alta nobreza, um requintado jantar em seu elegante apartamento.

4) Victor José Velo Perez

Este espanhol, valenciano, era ou é (espero que esteja vivo) outra mente diferenciada com quem tive a sorte de conviver.

Morava no bairro do Paraíso, em São Paulo, numa casa de 4 pisos. Um ao nível da rua, de acesso ao imóvel, com salas, cozinha, etc. Outro, acima deste, levava aos dormitórios.

Nos dois abaixo no nível da calçada, ficavam a garagem e, por último, uma adega de invejar.

Esta adega, à qual tive a felicidade de freqüentar, era um espaço bem amplo, cujo acesso se dava através de uma porta de madeira maciça, grossa, e por isso pesada.

No seu interior, uma luz tênue, encimava uma mesa redonda, cujo tampo também era de madeira, na verdade um segmento de tronco de árvore de grande diâmetro.

O cheiro no interior desta adega era qualquer coisa de estimulante. Uma mistura dos restos de bebidas (licores, conhaques e vinhos), que por vezes derramavam na mesa, com os embutidos, presuntos e salames pendurados no teto, mas ao alcance das mãos.

Havia os escaninhos adequados para guarda dos vinhos, e locais para conhaques e licores.

Tive o privilégio de ser convidado, com a Wanda, para um jantar inesquecível, composto de sopa de frutos do mar, seguida de paella valenciana, doces, licores (digestivos) café e chocolates/bombons, tudo comme il fault.

O Victor, com formação acadêmica em física (concluído na USP), chefiava o departamento de engenharia de manutenção de fábricas têxteis, e chegou à vice-presidência do Grupo.

Amante de música clássica (tem uma irmã que é cantora lírica, com discos gravados) é um anfitrião perfeito.

Conhecedor profundo da história de seu país de origem e de assuntos religiosos, sabia tudo sobre jesuítas, agnus dei, templários, etc.

Sua marca maior, para mim, era a capacidade de explanar com linguagem clara, assuntos tão áridos quanto manutenção de máquinas e equipamentos industriais, conseguindo manter viva a atenção dos ouvintes, pela maneira de explicitar fazendo piadas, comparações esdrúxulas e dramatizando situações corriqueiras.

Organizadíssimo, enriquecia suas palestras (várias) com gráficos, planilhas, etc.

Cresceu no Grupo Matarazzo a custa de muito trabalho sério e enorme capacidade de convencimento.

O fato ligado a ele mais curioso de que me lembro, foi quando, ainda encarregado da área de engenharia, teve a incumbência de fazer a implosão do casarão dos Matarazzo na Av. Paulista. A Luiza Erundina fôra eleita prefeita e a primeira mediada que adotou foi desapropriar o palacete. Aquela velha e surrada história de capital ser inimigo do trabalho, este ranço comunista, levou a prefeita recém eleita a adotar esta atitude, posto que os Matarazzo eram o símbolo maior, no Brasil, do capitalismo.

Pois bem, encarregado da implosão, até para comprometer a desapropriação, mas sem qualquer experiência na matéria, o que ele conseguiu foi destruir, explodindo, e não implodindo, apenas uma parte da mansão.

Eu já não trabalhava no Matarazzo, mas morri de rir com esta história contada por ele mesmo. Grande Victor. Também faz muita falta o contato com ele, sempre enriquecedor.

5) Jorge Carrano e Ricardo Carrano

And last, but not least, na galeria de meus tipos inesquecíveis, estão meus filhos Jorge e Ricardo. Se não bastasse o vínculo afetivo natural, porque biológico, são, ambos, pessoas que me encantam por suas histórias de vida.

Ultrapassaram a barreira intelectual e cultural dos pais, que poderia ser limitadora, para, com esforços e méritos pessoais, conseguirem êxito como profissionais e, acima de tudo, como pessoas, seres humanos dignos desta classificação, pela retidão de caráter, pela perseverança, pela honestidade de propósitos e meios utilizados para alcançar o sucesso.

Inteligentes e de cultura geral muito acima da média das muitas pessoas com as quais convivo ou convivi, são tipos inesquecíveis. Para mim e para tantos quantos tenham a felicidade de conviver com eles.

Pai e tio que encherão de orgulho aos meus netos, quando estes forem capazes de avaliar a importância daqueles.

Contei, sobre os outros tipos inesquecíveis mencionados nesta série, casos curiosos, situações cômicas, etc.

Não o farei em relação aos “meninos” eis que os assuntos de família serão objeto, assim espero, de trabalho especial.

Numa próxima opotunidade, falarei de tipos igualmente inesquecíveis, mas pela bizarrice, pelo inusitado do comportamento ou vocabulario.

24 de maio de 2010

Queremos raça...

Ora, com que então as torcidas querem dos jogadores de seus clubes que eles se empenhem, que deixem no campo o suor e o sangue, se necessário, na busca da vitória.

Este clamor, das arquibancadas, é uma coisa comum nos estádios brasileiros. As vaias, nos estádios europeus, quando a equipe está apática em campo, não deixam dúvidas de que a torcida quer é a vitória, ou, pelo menos, empenho máximo dos jogadores com este objetivo.

Na contramão, alguns críticos, seja porque são realmente românticos, seja porque querem fazer tipo contestador, ficam falando sempre em futebol arte, em contraposição ao futebol objetivo, competitivo.

Palavras como comprometimento, superação, entrega, doação, utilizadas por alguns técnicos para definir o que esperam de seus comandados, em especial utilizadas pelo Dunga, são uma versão mais acadêmica, mais erudita, do que é entoado pelo povão: “queremos raça, queremos raça...”

Não que uma coisa exclua necessariamente a outra. Poderíamos ter uma equipe de talentos na arte do domínio da bola, com visão de jogo e a habilidade de uma foca adestrada e, não obstante, esta mesma equipe ser aguerrida, combativa, com os atletas focados na vitória.

Dois dos melhores jogadores da atualidade, Messi e Wayne Rooney, mesmo quando são desarmados, correm atrás do adversário para recuperar a bola. Mas são uma honrosa exceção.

Mas a história comprova que não é isto que acontece. Seleções brasileiras como as de 1982 e 1986; a húngara de 1954; as holandesas de 1974 e 1978, só para citar exemplos de seleções - excluindo clubes que investiram fortunas em equipes dos sonhos - sucumbiram diante das pragmáticas alemãs, das defensivistas italianas e da guerreira uruguaia, como em 1950.

Neste último campeonato citado, tínhamos um time de virtuosos: Zizinho, Danilo, Jair, Chico, só para citar alguns, e perdemos para o guerreiro chamado Obdúlio Varella. Poderíamos até empatar, e conseguimos abrir o marcador. Mas os uruguaios foram à luta e viraram o resultado para 2x1.

Eu, de minha parte, fico com o critério do Dunga, diga-se de passagem um injustiçado. Tido e havido como um cabeça de bagre, foi um jogador importantíssimo, inclusive autor de passes precisos, muito bem executados. Só não vê quem não quer, pois os vídeos teipes estão aí mesmo.

Quando defendo a postura combativa, não estou endossando o pontapé, o carrinho pelas costas, o agarrar, e outras atitudes antidesportivas. Falo da marcação serrada, não deixando espaços para o adversário. Antecipar as jogadas.

Isto é o que o povo quer.

23 de maio de 2010

Internazionale di Milano

Acabo de assistir a conquista da Internazionale Milano, sobre o Bayern Munchen. Este jogo, que decidiu qual é a melhor equipe européia no momento, segundo a crítica especializada colocaria frente a frente equipes com características diversas. O Bayern, do Louis Van Gaal, ofensivo, de posse de bola, contra a Inter do Mourinho, defensivista, apenas aplicada, presa em esquema tático.

Realmente a posse de bola foi inteiramente do Bayern. Mas quem se sagrou campeã, com resultado inconteste de 2X0, foi a Inter.

Nem se diga que a decisão, ou finalíssima, em uma só partida, oferece, por vezes, um resultado questionável.

A Inter, para chegar à disputa da final, superou equipes reputadas, antes do início da competição, como absolutamente favoritas, tais como o Chelsea e, principalmente, o Barcelona.

Ultrapassou os dois obstáculos, em confrontos diretos, tendo jogado contra o Barcelona, na cidade de origem deste, uma partida irrepreensível sob o ponto de vista tático.

O José Mourinho provou, uma vez mais, que é um dos melhores treinadores da atualidade.

Montou uma equipe competitiva, onde o sistema defensivo, composto pelo Lúcio, pelo Samuel e pelo Cambiasso, este dois últimos argentinos, tiveram papel de destaque. Sem contar com Julio César no gol.

Meus caros eventuais leitores, se tem um assunto que me fascina e do qual entendo, é de futebol. Afirmo, sem medo de errar, que numa partida de futebol, vence aquele que quer vencer (com perdão pela construção lingüística).

E o querer é fazer por onde, é lutar, é se empenhar até a exaustão, é ser determinado.
Se queres show, espetáculo, sugiro o Ringling Brothers, o Cirque du Soleil, os Harlem Globetrotters, ou a Disneylandia.

O próximo post seguirá com este tema.

19 de maio de 2010

Woody Allen, again.

Mal saiu de cartaz, como se dizia antigamente, o último filme (Tudo pode dar certo), do insuperável cineasta*, e ele já está a postos, preparado para dar início as filmagens de “Midnight in Paris”, aproveitando o verão europeu que vem aí.
E, consta, no próximo ano, tão logo acabado o filme ambientado na França, ele virá ao Brasil, filmar no Rio de Janeiro.
A propósito, acho que já comentei aqui neste blog, que tão logo foi veiculada esta notícia, de que o Allen faria no Rio um filme na linha do Vick Cristina Barcelona, no qual a capital da Catalunha é reverenciada, meu filho Jorge sugeriu o título do filme a ser feito aqui no Rio de Janeiro.

Simples: “Perdeu, cara!”

Maldade, mas não se pode perder uma boa piada.

O ator escolhido para o “Midnight in Paris” foi o Adrien Brody, vencedor de Oscar, com ‘O pianista”.

A primeira dama da França, Carla Bruni-Sarkozy também estará no elenco.

Além da madame Sarkosy (boa escolha), estarão no elenco Owen Wilson, Marion Cotollard, Kathy Bates e Michael Sheeen, entre outros. Ninguém recusa papel em filme de Woody Allen, mesmo que o cachê não seja lá uma grande coisa. Prestígio é o que motiva.

A história, segundo li, gira em torno de uma família em viagem de negócios. Será uma comédia romântica, estilo que ele manipula com maestria.

Comentando o “Tudo pode acontecer”, o colunista Artur Xexeo, em sua matéria do dia 2 de maio, n’O Globo, exagerou dizendo que o mundo se divide entre os que amam o Woody Allen sobre todas as coisas e as demais pessoas. Amar o Allen sobre todas as coisas também é, digamos, falta de imaginação, no mínimo. Mas me incluo no lado daqueles que são admiradores de seus trabalhos, como roteirista, diretor e ator.

Na revista Veja (edição de 28 de abril), também sobre “Tudo pode dar certo”, a crítica Isabela Boscov intitula seu comentário aludindo a que o cineasta reciclou um velho roteiro, e que faltou óleo. Será que faltou azeitar? Penso diferente.

Realmente foi divulgado, em várias mídias, que ele realizou o filme a partir de um roteiro que tinha na gaveta há muito tempo: décadas.

Mas e daí? Quantos artistas, nas diferentes formas de expressão, revisitam alguns temas**, sem que tal fato enfraqueça o resultado. Em certos casos, antes pelo contrário, as revisitas dão mais consistência, encorpando  as variações sobre o tema.

Que bom que temos um filme de Woody Allen por ano.


* Insuperável em número de filmes realizados, ou seja, quase 50 em seus 74 anos de vida, e em premiação de roteiros (mais de 14).

** Quem há de censurar Claude Monet, por exemplo, pela infinidade de telas sobre as ninféias de seu belísimo jardim. Quem já não viu pelo menos reproduções do Ciclo da Ninféias? E estava quase cego.






17 de maio de 2010

Copa do Mundo FIFA 2010

Pouco menos de um mês nos separa do início da Copa do Mundo. Todos os países que irão competir já apresentaram à FIFA uma lista preliminar com 30 jogadores convocados. Destas listas, ou não, pois a regra é estranha, sairão os 23 jogadores de cada seleção nacional, que representarão os respectivos países. Muitos destes jogadores não são nativos dos países pelos quais competirão; obtiveram a cidadania. Tem brasileiro, de nascimento, em muitas outras seleções.

Digo que a regra é estranha, à falta de outro adjetivo, pois a partir do momento em que são definidos os 23 inscritos, pinçados da lista preliminar de 30, no caso de lesão de um destes 23 jogadores, o país poderá substituí-lo por outro, até a véspera do primeiro jogo, e o curioso é que o novo convocado (substituto) não precisará ser um dos 30 pré-selecionados. Poderá ser um jogador qualquer, de livre escolha do técnico.

Por exemplo: escolhidos os 23 que disputarão a Copa, e estando já na África do Sul, em fase de treinamento, o Grafite, ou o Luis Fabiano, sofre uma lesão grave. O Dunga poderá, querendo, convocar o Adriano para o lugar do lesionado, mesmo ele não constando da lista inicial de 30 nomes. Esta substituição deverá ser feita até o jogo de estréia do Brasil, ou seja, 15 de junho.

Pelo que tem sido divulgado na imprensa, quase todas as convocações foram questionadas nos diferentes países. Os técnicos não conseguem mesmo unanimidade.

Aliás que em matéria de escolha de técnico, eu faria também restrições, embora não tenha nada a ver com isso. Só para dar dois exemplos, o Arsène Wenger não é o técnico da França e o José Mourinho não é o técnico de Portugal. Vai entender, não é? Pior para França e Portugal, pois eles são excelentes treinadores. Dois dos melhores em atividade.

Voltando à convocação, muito questionada aqui no Brasil, entendo que é realmente questão de opinião pessoal de cada treinador. Eu, por exemplo, e mais uma vez digo que nada tenho com isso, não deixaria de convocar, se técnico da Argentina, os jogadores  (Javier) Zanetti  e (Estebam) Cambiasso. Mas isso é problema do Maradona.

Não havendo sérios desfalques, e a partir das listas dos inscritos pelos competidores, anuncio meus candidatos ao título, e as finais prováveis:

Argentina e Holanda seria uma delas; Inglaterra e Espanha, seria outra. E nestes casos os vencedores seriam a Argentina e a Inglaterra.

Mas poderá dar Brasil contra qualquer uma destas outras 4 seleções. Tomara.

Bem, escolhi 5 num universo de 32. A Costa do Marfim poderia ser uma zebra, se houver uma, o que é muito pouco provável.

14 de maio de 2010

Três por quatro

Três por quatro, de frente e sem chapéu. Este era o formato padrão de fotos para documentos, exceto passaporte.

E fundo branco. Este era o aviso, melhor, a advertência, que recebíamos quando necessário tirar fotos para documentos, inscrição em concursos e coisas do gênero, que fossem mais solenes e formais.

Nesta época eu possuia uma caneta Parker 51, que abastecia com tinta azul real permanente. Existia uma lavável. Acredite.

Bem, o mata-borrão já não era tão necessário, pois as canetas-tinteiro de ponta metálica, substitutas das penas, que eram molhadas vez por outra na tinta, estavam caindo em desuso, em face do surgimento daquelas que tinham internamente sua carga de tinta, fruto de uma bombinha com a qual era abastecida diretamente do tinteiro, que vinha a ser um potinho cheio de tinta, fabricado pela própria Parker. E havia  outra boa caneta, da marca Sheaffer, concorrente da Parker. Mais ou menos como Windows e Linux.

Depois vieram as esferográficas. Que dificilmente serão superadas em praticidade, preço e eficiência. Perdem, apenas, no quesito luxo. Quem faz questão compra a Mont Blanc, uma versão Rolls Roice da velha Parker 51. Ah! Sim, havia uma Parker 21, mais barata e pouco menor.

E os campeonatos de foot-ball? Observem que a competição não era de futebol, coisa que somente ocorreu muito tempo depois, por causa das várias manifestações nacionalistas e dos vigilantes do idioma. Ficamos a salvo do balípodo, juro, que era uma das propostas para fugirmos do anglicismo.

E a locução de uma partida de futebol exigia conhecimentos rudimentares da lingua e pronúncia inglesa. A grafia não era essencial, os jornalistas cuidavam disto na imprensa.

Assim, o zagueiro que fazia papel de líbero, era o stopper. O goleiro era o goalkeeper, o impedimento era chamado de off side, o escanteio era corner. Bem, ainda é. O centro avante era o centerforward, assim como a centro médio, ou médio volante armador, era chamado de certerhalf. Havia dois halfbacks, o da direita e o da esquerda. Hoje chamados laterais.

A primeira rolada de bola, para início da partida, era chamada de kick off. O locutar anunciava: foi dado o kick off. E a falta ainda era cobrada como foul.

Então tinhamos que para ouvir um  mero jogo de futebol, eram necessários conhecimentos básicos de inglês ou, como no meu caso, um bom ouvido, para poder reproduzir as palavras, sem  a menor idéia de como eram escritas. Para início de conversa, o jogo era um match  e a seleção do Dunga seria o scratch nacional.

E no Bob's, rede de lanchonetes que surgiu algum tempo depois, o prato de ovo frito (estrelado) com presunto era comandado assim pelo atendente: sai um "romanegue" (ham + egg)

Era interessante ver o negão, discutindo, afirmar que Danilo era melhor “centeralfe” do que Bauer.

Ah! De novo. Podia-se chamar o negão de negão, sem que parecesse discriminação ou algo ofensivo. Vejam os poetas populares falando, muitas vezes, deles mesmos.
"A nega do peito é aquela,
que faz o feijão costumeiro,
 não vou mudar de mulher,
só porque ganhei dinheiro"

Curioso que os nacionalistas, com a penetração da informática e uso já disseminado da internet, queixam-se que os termos são ingleses. Vai levar tempo até que se aportuguesem as expressões americanas, como já ocorreu com deletar, por exemplo, que já é um verbo introduzido em nosso dia-a-dia, e constará certamente dos futuros dicionários do idioma pátrio. Se já não está.

12 de maio de 2010

A lista do Dunga

Oskar Schindler era polonês e proprietário de uma fábrica de utensílio de cozinha. Ganhou muito dinheiro empregando judeus, que eram mão-de-obra mais barata. A estes, mais do que bom salário, importava manterem suas vidas.

Depois salvou a vida de centenas daqueles judeus, subornando, com parte dos lucros que obteve em sua fábrica, os oficiais da Gestapo, a fim de que fossem enviados para a Tchecoslováquia, e não para Auschwitz, os nomes constantes de uma lista com mais de mil nomes.

Dunga, de certa forma, mal comparando, também se manteve fiel ao grupo de jogadores que se engajaram em sua filosofia de trabalho, com entrega, atitude e determinação, recompensando-os com a inclusão de seus nomes na lista dos convocados para disputar a Copa da África do Sul, ontem divulgada.

Portanto, nenhuma novidade na lista do Dunga.

A imprensa, ou boa parte dela, vem massacrando o treinador. Menos por discordância com alguns nomes incluídos e nomes outros não incluídos, do que com o cerceamento de suas liberalidades (mais que liberdades) ou corte de seus privilégios.

Lembro bem (eu assisti) de uma entrevista concedida à Fátima Bernardes, da TV Globo, por jogadores da seleção, às duas horas da manhã, horário da Alemanha, em face das diferenças de fuso horário, na apresentação do Jornal Nacional.

Esta farra, este condenável procedimento, seja dos jogadores, seja da imprensa, não irá se repetir. É preciso que todos estejam focados na competição, que será das mais disputadas.

Fiquei muito bem impressionado com as manifestações de alegria dos jogadores convocados. Mesmo alguns veteranos se comportaram como se fosse a primeira vez que envergarão a camisa da seleção e participarão de uma Copa do Mundo.

O Brasil pode até não se sagrar campeão. Esta será uma das mais difíceis copas, pelo alto nível de muitas seleções. Mas espírito de luta e vontade de ganhar não faltarão.

Assim espero.

11 de maio de 2010

Peladas

As peladas do título não são as mulheres desnudas. Afinal este é um blog família, e as crianças estão na sala.
Quero falar das partidas de futebol entre amadores, disputadas em campos improvisados. Elas são a mais pura e genuína expressão do jogo de futebol. Solidário, alegre e solto. Bom modelo de vida em sociedade.

E as peladas autênticas, que são as que não têm qualquer formalidade, são as melhores. Os jogos, minimamente estruturados que sejam, entre solteiros e casados de uma firma ou as disputas intercolegiais, têm características de pelada mas não são autênticas, porque envolvem, em geral, uso de uniformes, chuteiras ou tenis, exigem a presença de árbitro e têm tempo de jogo cronometrado. Nada disso existe na verdadeira pelada.

Nelas, os times são escolhidos na hora, entre os presentes no campo. Campo? Bem, um terreno baldio qualquer, nem sempre de dimensões regulares. Os dois jogadores reputados como os melhores, e todos os presentes sabem quem são, pois são geralmente os mesmos participantes, escolhem, um a um, alternadamente, depois de um par ou impar, para ver quem será o primeiro, as duas equipes. Óbvio que o critério é o da qualificação, da habilidade para jogar. É claro que os melhores vão sendo escolhidos primeiro, ora para uma equipe, ora para a outra. Esta sistemática confere um certo equilíbrio de forças entre os dois times. E a disputa da partida fica melhor.

Alternativamente, ao invés da formação das equipes ser decidida pelos dois mais hábeis jogadores, a tarefa fica com os dois piores jogadores, que em geral serão os goleiros. E o resultado final não discrepa, eis que o critério de escolha alternada, vai privilegiar os melhores, numa ordem descrescente de mérito, até que os times estejam completos, ou que não haja mais ninguém para jogar naquele momento. Se as equipes se completam, com onze de cada lado, quem sobrar sobrou. É a pena que devem pagar os sem preparo técnico ou determinação. E fica na espera para entrar no jogo, até que alguém tenha que sair. Se as equipes não estão completas e chega alguém atrasado, deverá esperar que chegue um outro, para que seja possível entrar um para cada lado e manter o equilíbrio de forças.

Nada de uniformes; quando muito um time joga com camisas (as que trazem vestidas) e o outro sem camisa. Todos descalços. Juiz? Nem pensar. As decisões são tomadas em consenso. Como os campos muitas vezes não têm qualquer tipo de marcação de seus limites, a bola saiu (está fora de jogo), ou não, por decisão da maioria.

Pode acontecer controvérsia e discussão, quando, por não haver travessão superior, apenas duas balizas, é necessário definir se vale o gol ou não, dependendo da altura em que a bola transpasse a linha imaginária, no espaço delimitado apenas pelas traves verticais. O critério da altura para que o gol seja validado, é o de fazer a estimativa da altura máxima atingida pelo goleiro num salto vertical. Se com este salto o goleiro fosse capaz de alcançar a bola, então o gol é válido. Ora, se o goleiro é muito baixinho, não valerá como gol uma bola que trasponha a linha numa altura que, embora pequena, esteja fora do alcance de suas mãos, quando saltando. Se eventualmente o goleiro fosse maior, talvez aquela bola, naquela altura, fosse tida como gol. É a decisão diferenciada em face das circunstâncias. E todo mundo acata.

As faltas, sejam as de jogadas mais violentas, sejam as de colocação da mão na bola, são decididas no grito. Se alguém grita “parou!”, para mesmo. Quem sofreu, afirma que foi atingido e machucou. O autor da falta nega. Mas outra vez o consenso decide. Não há violência explícita. Não há má-fé. O adversário de hoje, amanhã poderá estar no seu time. Depende do par ou impar.
A pelada é alegre e franca. A partida é disputada pelo puro prazer que proporciona. Não há cobrança de torcida. Quando muito, haverá gozação com a vítima de uma finta mais humilhante, ou de um frango do goleiro.

A pelada tem suas caracteristicas. Uma delas, pertinente, é a de que não há jogador em impedimento. Todos podem jogar e fazer gols em qualquer situação. Como não há juiz, não há tempo controlado. As partidas terminam quando uma das equipes atinge o número de gols previamente estabelecio. Assim, depois da escolha das equipes, é decidido que a partida será de dez, virando em cinco. Ou seja, quando um time fizer dez gols, a pelada acabou. Atingido o quinto gol, mudam de lado, para que os defeitos do campo, a posição do sol e a força do vento não prejudique uma só equipe.

Ninguém beija a camisa após um gol. Não há mercenarismo. Não há patrocínio. Não há dirigente. Este é o grande segredo do sucesso das peladas. Não há dirigentes. Já imaginaram um mundo onde não há espaço para Ahmadinejads, Saddans e Osamas; Chaves, Morales ou Bushs? Os participantes decidem e controlam eles mesmos o que vale e o que não vale. A pelada é democrática e liberal: o mérito individual tem peso; há alternância de poder e equilíbrio de forças, pois as equipes não têm sempre as mesmas constituições; e as decisões são tomadas pela maioria. Tudo com e pelo prazer.

N do A: Estas memórias são fruto da infância vivida na Rua São Diogo, na Ponta d'Areia. Hoje esta rua é asfaltada e nela transitam ônibus. Na década de 40 e  início dos anos 50, por ela passavam um ou dois carros, por dia. Os verbos deveriam, pois, estar no passado.

10 de maio de 2010

Lista de convocados

Amanhã, dia 11, será divulgada a lista dos 23 jogadores convocados para compor a seleção brasileira que irá disputar a Copa do Mundo, organizada pela FIFA, e que será realizada a partir de 11 de junho, na África do Sul.

Há uma expectativa enorme em relação aos nomes que serão anunciados. Neste momento, é irrelevante querer antecipar qual dos candidatos já anunciados, que disputarão o pleito para presidência da república, irá vencer nas urnas e será responsável pelo destino do país nos próximos 4 anos.

Mais importante, agora, é saber nos pés de quem estará o destino da seleção nos campos de futebol.

A mão que assinará as leis, sancionando-as ou não, ou os decretos regulamentadores, perde em importância para as mãos do Julio César, provável goleiro titular.

Se temos um bom universo de jogadores convocáveis, de bom potencial, o mesmo não ocorre com o elenco de candidatos à presidência.

Mas a esta altura tem mais importância o que sairá da cabeça do treinador Dunga, do que o que resultará de nossas cabeças, como eleitores, ao final do ano.

Neste passo é Copa do Mundo. Depois, se muito ou pouco tempo depois, a depender do resultado da competição de futebol, é que iremos cuidar da presidência da república e, de quebra, do parasitário Congresso Nacional.

Espero que estejamos de bom humor na hora da eleição, com o “peito em festa e o coração a gargalhar”, como diria o velho prefeito Odorico Paraguaçu, e tenhamos sabedoria para votar.

6 de maio de 2010

Jorge Carrano III

Não, meu neto não foi registrado e batizado como Jorge Carrano III. Mas por meu gosto teria sido. Ainda tenho esperanças no futuro, e terei um descendente com este nome.

Quem sabe ele, meu neto, dará ao filho o nome de Jorge Carrano III. Afinal, Luis XVI era neto, e não filho, de Luis XV, aquele que perpetrou a famosa frase: “Depois de mim, o dilúvio”.

Logo, não haverá problema em ser saltada uma geração.

Não há necessidade de vínculo imediato, paterno, para adoção do nome a ser prestigiado. Napoleão III era sobrinho do Napoleão I.

Até minha neta, sabe-se lá, poderá dar ao filho o nome de seu pai, que, não por acaso, é também o meu. E não haveria como fugir do III (terceiro).

Historicamente isto já aconteceu um sem número de vezes. Ricardo I, conhecido como Coração de Leão, e que liderou a 3ª Cruzada, juntamente com Felipe IV, o Belo, não foi o pai de Ricardo II, também da Inglaterra. Este último, por sua vez, não foi o pai do Ricardo III, imortalizado por Shakespeare , que atribuiu a este monarca a conhecida frase “A horse! My kingdon for a horse!

Não vou exemplificar com o papado pois, em tese, um Papa não deixaria descendentes diretos, em linha reta. Mas as homenagens que fazem aos antigos prelados, demonstram o quanto eles se identificam com um Pontífice antecessor, mesmo que não tão imediato.

João XXIII, estava há séculos de João I. Embora João Paulo II estivesse bem próximo do João Paulo I.

E não vou recorrer a empresários, tipo Henry Ford III, pois antes a família deveria construir a fortuna deles.


N.A: O Rei-sol, o Luis XIV, da frase "L'État c'est moi", seria, há controvérsias, filho de Luis XIII. A controvérsia fica por conta do fato de Luis XIII e Ana de Austria terem sido casados por 23 anos e nada de filhos até então . O futuro Luis XIV, portanto, segundo alguns historiadores, poderia não ser filho biológico do Luis XIII.

4 de maio de 2010

Dinheiro não tras felicidade

Sei. Me engana que eu gosto.
Algumas destas frases prontas, genéricas, utilizadas de forma indiscriminada, guardam em si mentiras absurdas. Ou são meias verdades.

Por exemplo: o vinho, quanto mais velho melhor. Mentira! Depende do vinho, se é tinto ou branco, se é espumante ou tranqüilo e, mesmo entre os da mesma natureza, como por exemplo os tintos secos, há os que são de guarda, e aí sim melhoram com o tempo, se mantidos em locais e condições apropriados, ou devem ser degustados enquanto jovens, como Beaujolais nouveau.

Esta – frase - aí do título, por exemplo, merece um reparo. O dinheiro não tras, mas leva você à felicidade. Ao estado de felicidade.

Não fosse a falta de dinheiro (eu ia acrescentar também de tempo, mas seria redundante, pois se tivesse dinheiro faria o meu tempo), a esta hora estaria em Viena.

Trago ainda, na memória olfativa, o aroma dos cafés vienenses. Os melhores que jamais tomei. Refiro-me a infusão da rubiácea propriamente dito, embora possa afirmar, em acréscimo, sem vergonha ou medo de errar, que os locais onde são servidos (os Cafés), são os mais elegantes do planeta.

Podem não ser os mais charmosos, pois os franceses ganhariam neste quesito.

Antes que alguém queira me contestar, faço a ressalva que estou me referindo a locais até onde meu parco dinheirinho me permitiu conhecer. Se você tem muito dinheiro (e bom gosto) é possível que tenha conhecido locais mais sofisticados.

Falo comparando os Cafés da rua Graben, em Viena, ou, ainda na capital austríaca, localizados na simpática rua de pedestres chamada Karntenstrasse (o nome está nas minhas anotações de viagem), com os localizados em St. Germain-des-Près ou Montparnasse, em Paris.

Outra cidade encantadora, que tem bons cafés, é Dresden, na Alemanha, que quando conheci estava ainda em fase final de reconstrução, bombardeada que foi, ao final da 2ª Guerra Mundial (13 para 14 de fevereiro), por determinação do Churchill, segundo consta numa atitude desnecessária. A guerra já havia praticamente terminado.

Estou divagando, mas retorno ao café infusão, e aos Cafés estabelecimentos de Viena. Aqueles de excelente qualidade (só importam grãos de primeira) e estes elegantes, clássicos, com a nobreza possivelmente herdada dos Habsburgos.

3 de maio de 2010

Entreouvido no Manel´s

O nome foi inventado pelo Carlinhos e pelo Irapuan *. Mas o bar existiu mesmo. Ficava na Domingues de Sá. O dono, de trás-os-montes, chamava-se Manuel.

Já falei deste bar em post mais antigo, e volto hoje, já que escrevi recentemente sobre a bobagem do politicamente correto, para contar uma situação muito engraçada, presenciada lá no Manel´s.

As conversas, como sempre, rolavam soltas. As poucas mesas ocupadas. Entre cinco e seis da tarde (atualmente batizado de happy hour), era o horário de praxe para reunião do grupo liderado pelos dois citados amigos, os mais assíduos frequentadores do bar, onde tinham conta pendurada. Que pagavam e, para comemorar, tomavam várias portuguesinhas**, dando início a um novo pendura***. Eu era bissexto, pois a grana era extremamente curta mesmo.

Na mesa ao lado conversavam três rapazes. Assim como nós éramos. Todo mundo tinha entre 15 e 18 anos, com uma margem de erro de 10%, para mais ou para menos.

À horas quantas um deles estava relatando uma situação que vivera na véspera, cerca de 11 da noite, muito escuro, perseguido por um cão de rua, porque correu com medo de um negão enorme que vinha na mesma calçada, em sentido contrário, alí no pedaço de Santa Rosa, hoje apelidado, por razões mercadológicas, pela indústria imobliária, de Jardim Icarai.

Ele contava que não só girou nos calcanhares, dando meia volta, como atravessou a rua e saiu em disparada, com receio de ser abordado pelo negão. Com isso, chamou a atenção do cão que correu atrás dele por duas quadras. Chegou em casa quase evacuando nas calças.

Solitário numa mesa, que ocupava, segundo o Manuel contou depois, desde uma da tarde, e já tendo tomado pelos menos umas 5 cervejas e duas talagadas de cachaça, um negro forte, meia idade, perguntou, com voz ameaçadora, para o rapaz que acabara de contar o seu caso: - Por que tu disse que o cara era um negão enorme? Que qui tu qué dizer. Se fosse um branco tava limpo? Você não corria?

Restabelecido do susto, o rapazinho respondeu irônico, mas sem poder disfarçar que estava assustado: - Falei porque era um negrão mesmo, um armário. Não poderia ser um branco, porque os brancos são uns tísicos, quero dizer, todos franzinos como tuberculosos.

Por via das dúvidas, apressou-se em explicar a questão do tísico. A isto chamavamos de botar o galho dentro. Às vezes é melhor mesmo.

Bem, ao fim e ao cabo tudo terminou em batucada, para desespero do Manuel, que gostava de ordem em seu estabelecimento. Era gente boa p'ra lá, amigão p'ra cá, e com isso reinou a paz. O negrão cantava bem, muito embora a lingua meio enrolada, tinha suingue. Às 9, como de praxe, o bar fechou.



* Carlos Augusto Lopes Filho e Irapuan Paula de Assumpção

** A cervejaria Antarctica mantinha um rótulo com a marca Portuguesa, que era bem leve.

*** As contas pendentes, de fregueses confiáveis, ficavam espetadas num prego existente na parede atrás do balcão. Daí o penduradas.

1 de maio de 2010

Filhos e pais

Se os filhos soubessem a falta que o pai vai lhes fazer, quando o mesmo morrer, tratariam-no à “pires de leite como se fosse uma úlcera.”

Peço licença ao Nelson Rodrigues para usar sua metáfora, aplicando-a nesta abordagem, à falta de outra, de cunho próprio, que desse uma idéia do quanto os filhos, devem valorizar a importância dos pais.

E irão se arrepender por não terem tido um convívio mais próximo, por não terem desfrutado mais, quando era possível, a amizade e a lealdade daquele que com toda a certeza foi seu melhor amigo.

A perda do pai é uma dor que custa muito a ser anestesiada e produz uma saudade que se não é contínua, é intermitente e infinita. E não é “enquanto dura”, é e como dura.

Estou falando de filhos e pais emocionalmente equilibrados, socialmente ajustados e que se amam.

Pai que atira a filha pela janela, ou filha que mancomunada com o namorado mata os pais a porretadas, são animais irracionais, bichos peçonhentos, absolutamente selvagens, não podendo portanto conviver em sociedade humana. Estes e outros animais que povoam as páginas policiais não se encaixam nesta minha digressão sobre respeito e amor filial e paternal.

A saudade a que me refiro vem quando menos se espera, de forma inopinada, mas com mais força nos momentos de nossos êxitos, quando gostaríamos de com ele compartilhar, e também nos momentos de aflição, sabendo que poderíamos contar com um ombro amigo e uma palavra de esperança e conforto.

Colocando-me como referência, no papel de pai e também no de filho, de coração aberto, o que somente o ter alcançado a idade provecta permite fazer com isenção e clareza, afirmo que tanto num quanto noutro papel, sinto-me e me senti realizado e feliz. Sou um privilegiado.

Em relação aos meus filhos, mais do que com recomendações, advertências, conselhos ou ensinamentos, penso que me desincumbi com exemplos. E eles deram certo. Como homens de caráter, responsáveis e respeitados, e amorosos.

Com meu pai, noutra época e outros costumes, a relação foi sempre muito mais de respeito do que de afeto. Havia um certo distanciamento. Os pais se colocavam, pois era a cultura da época, num nível acima.

Mas com o tempo, me dei conta do quanto ele me amava, e que as restrições e castigos impostos, que me aborreciam, eram fruto de cuidado e amor.

Sem contar, o que mais tarde enxerguei com nitidez, o orgulho que ele sentia de mim, sem que eu tenha dado motivos relevantes para tal. Mas seu amor era tão grande, que mesmo pequenos detalhes, coisas sem expressão maior, eram motivo de alegria e orgulho.

Dou como exemplo um fato banal, quase bizarro. Prestei a maior parte de meu serviço militar na 2ª Circunscrição de Recrutamento, unidade, digamos, burocrática do Exército.

Certa feita, num dos corredores, parei para prestar continência ao General Comandante da Infantaria Divisionária da 1ª Divisão de Infantaria, do I Exército (que título, hein !?) que estava em visita àquela repartição.

O general parou diante de mim, e de forma muito educada, diria mesmo cordial*, disse-me que a continência estava errada e, ato contínuo, pegando minha mão que levara ao bibico**, posicionou-a corretamente.

Eu colocara a mão quase na frente do casquete***, quando o correto, segundo ele, seria bem na lateral, na têmpora. Minha maneira, copiara a de um oficial protagonista de um filme de guerra americano. Errada para nossos padrões.

Este episódio, que relatei em casa, foi comentado com ele, ao me apresentar a amigos, numa oportunidade em que fui ao seu local de trabalho.

Vejam o que quero dizer. Uma coisa tola, sem maior expressão, ficou para o meu pai como um fato de dar-lhe orgulho. O general, em pessoa, corrige a prestação de continência de seu filho.

Só um pai muito amoroso, muito orgulhoso registraria aquele acontecimento como coisa significativa. E eu, ao contrário, achando que ele se comportara como um tolo,  não dei o devido valor ao fato, percebendo que nele se continha um prova de orgulho e afeto.  

Estas e outras lembranças, que hoje valorizo, e o vazio no coração, dão-me, com freqüência, uma enorme saudade dele, mesmo passados 47 anos de sua morte.

Não sei se consegui passar a idéia que faço da importância do convívio entre pais e filhos. Mas estou convicto de que este convívio deve ser explorado o quanto possível, em proveito recíproco. Mais tarde restará saudade.


* Na 2ª CR, serviam os soldados que tinham pistolão. Eram, em geral, como no meu caso (primo de oficial), parentes de oficiais graduados. Era necessário ter o ginasial completo, pelo menos.


** o mesmo que casquete


*** casquete é um chapéu, usado por soldados, reto em cima, fazendo dois bicos, um à frente e outro atrás.