Estou deprimido, angustiado. Pneus arriados e farol baixo. O tempo, que é um placebo natural, espero, tratará de levantar meu astral.
Sem entrar detalhes, diria que conheço a origem de meu abatimento. Não preciso de analista. Ninguém me conhece melhor. Bem, escrever sobre o assunto ajuda no processo de sublimação.
Há um princípio, em administração, chamado “Teoria da Incompetência” criada por Laurence Peter*. A tese é a seguinte: há um nível em que as pessoas atingiram seu limite de eficácia e esgotaram seu potencial de desenvolvimento.
Profissionais competentes são promovidos por suas habilidades para determinadas funções. Porém, à medida que tais habilidades não são as mesmas para outras funções, o profissional torna-se incompetente e chega ao patamar da incompetência.
Esta situação traz muitos prejuízos para a empresa e para o profissional, que pode apresentar alterações físicas e psicológicas e entrar em processo depressivo, pois passa a se dar contar que é “incompetente” para a nova função.
Assim, um bom engenheiro poderia ser guindado a função de supervisor de manutenção e fracassar totalmente pois faltariam alguns predicados indispensáveis para a nova função.
Muita gente atinge seu ponto de incompetência mais cedo.
Lembro de uma caso concreto de um office-boy muito bom, diligente, rápido, responsável, educado, enfim, com desempenho bom. Quando surgiu a vaga de auxiliar de faturamento, cargo melhor remunerado e inicial de carreira, a Supervisora do setor entendeu que era chegado o momento de dar ao menino uma oportunidade de promoção, salarial e funcional.
Resumo da história, o menino revelou-se um péssimo datilógrafo (na época as notas fiscais ainda eram datilografadas), mesmo depois de treinamento intensivo, ele errava muito, inutilizando muitos jogos (vias) de notas fiscais que não podiam conter emendas e razuras por causa da fiscalização da receita estadual. E atrasava o serviço, acumulando pendências.
Criou-se um impasse, ele não poderia reverter a função de office-boy, porque seria humilhante, sem contar que o salário dele já estava majorado e ficaria acima da faixa estabelecida para os mensageiros. Conclusão: teve de ser demitido. Perdemos um ótimo mensageiro de serviços externos.
Poderia dar outro exemplo de cargo de nível mais elevado na hierárquia, como a de um vendedor, recordista de vendas, que atingia com freqüência as metas e foi um fiasco como Gerente de Vendas, pois não tinha capacidade de liderança, não sabia delegar tarefas e perdeu-se nos meandros administrativos da função.
São incontáveis os casos, até mesmo em multinacionais de presidentes ou CEOs que foram afastados por acionistas insatisfeitos com os resultados da empresa, embora o indicado para o cargo tivesse sido um brilhante diretor finanaceiro ou de marketing ou de produção.
Em resumo, há um estágio, um nível, em que a função, o múnus público, o cargo irá exigir um determinado talento que o candidato que seria naturalmente o indicado não possui: atingiu seu nível de incopetência. Claro está, incompetência para aquela nova função superior. Ou simplesmente diferente da habitual.
Um outro aspecto , ainda no terreno administrativo, de avaliação de desempenho, para efeito de promoção vertical ou horizontal numa empresa, ou meramente para reajuste salarial por mérito, quando algumas qualidades pessoais, conhecimentos, predicados, que o avaliado possui, não são essenciais para o desempenho da função, e frustram expectativas. Estas qualidades não são necessariamante fatores de avaliação para exercicio daquele cargo. Nem sequer um plus.
Vou exemplificar: o jovem economista, lotado no departamento de controladoria, fala javanês e sabe muito sobre apicultura hindu no século XIII, mas que relevância estas experiências ou conhecimentos têm para o cargo de analista que ele ocupa?
O próprio nível de QI, muito elevado, no desvio padrão, poderá contraindicar alguém para um determinado cargo, se estivermos tratando, por exemplo, de tarefas repetitivas.
Bem a minha angústia está relacionada com o fato de ver alguém com ótima qualificação para algumas profissões ou atividades sociais (vocação, talento, jeito, etc) e uma total incapacidade para realizar tarefas mais simples ou que exigem menores conhecimentos . Por não possuir o perfil adequado. As características a que me refiro não são físicas, mas se fossem, diria que faltaria o physique du rôle.
Esta pessoa não usa o sistema de auto-censura, e aceita, ou se dispõe, ou até pior, se oferece para assumir responsabiliadades para as quais não é talhada, inobstante a inteligência, a cultura geral e a boa vontade.
E não posso, sem milindrar ou magoar a própria pessoa, e outras que estão ao seu redor, e que também estimo, dizer com todas as letras, fria e cruamente: você é incompetente para este mister. Não tem nem cacoete.
Estou cansado e sem paciência para agir como no passado, quando eu ficava de plantão, dando cobertura ou até assumindo encargos no sentido de coloaborar. Não dá mais.
Esta é a origem de minha angústia, não poder ferir com a verdade. Insinuações, alusões e indiretas não produziram o efeito esperado. Mas vai passar, como diria o Chico Burque.
*Teoria da Incompetência de Laurence Peter, que afirma: “todo mundo é um incompetente em potencial”.
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Laurence Peter
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Laurence Johnston Peter foi um educador, que se tornou mundialmente conhecido por ter criado o "Princípio de Peter". Esse princípio dizia que "Numa hierarquia todo empregado tende a subir ao seu nível de incompetência".
Eu estendo esta tese a todas as áreas da atividade humana. Incompetência para ser pai ou mãe; incompetência para dirigir automóvel, para ser síndico ou advogado, mesmo tendo sido brilhante acadêmico, nos bancos universitários.