11 de agosto de 2012

Leis que não pegam ou desnecessárias


Todos já ouviram falar das leis que não pegam. Esta é, juntamente com a jabuticaba, uma das poucas coisas que só existem no Brasil, parafraseando Mario Henrique Simonsen.

São muitos exemplos, mas desnecessários neste post eis que falarei não de uma que não pegou, embora tenha ficado inócua de um tempo a esta parte, mas de uma desnecessária.

Acaba de ser aprovado na Câmara dos Deputados, um projeto que revoga dispositivo do Código Penal, na parte que se refere às contravenções.

Dito projeto, de autoria do Ministro da Justiça, ao tempo que exercia mandato parlamentar, revoga dispositivo da lei penal codificada que criminaliza a vadiagem.

Dispõe a lei que aquele que se entrega habitualmente a ociosidade, sendo válido para o trabalho, poderá ser punido com pena de 15 dias a 3 meses de prisão.

Aqueles que são da minha geração ou próxima a ela, hão de lembrar que o homem tinha que portar sempre a carteira profissional, porque se abordado pela polícia, precisava comprovar que era trabalhador sob pena de ser conduzido ao Distrito Policial para averiguação.

Acreditem, tinha polícia nas ruas e os malandros cortavam um dobrado para escapar “da cana” como se dizia então. Ir “em cana” era ser preso, mesmo não sendo apanhado em flagrante delito, senão o de estar nas ruas e nos bares, entregue ao ócio.

O Estado Novo, de Getúlio Vargas, amparado popularmente pelas classes trabalhadoras, criou a carteira de trabalho, documento de grande importância social, para lá de seu caráter contratual de relação de emprego.

Criou, também,  o ditador populista um órgão com a sigla de DIP, que era o temido Departamento de Imprensa e Propaganda, que censurava qualquer culto a malandragem e alusão ao ócio.

Muitas músicas foram censuradas porque as letras induziam ao ócio, a malandragem, a não trabalhar.

Vejam este samba de Ataulfo Alves e Wilson Batista, que valoriza o trabalhador, em consonância com os princípios do trabalhismo criado por Vargas:

“Quem trabalha é quem tem razão
Eu digo e não tenho medo de errar
O bonde de São Januário leva mais um operário
Sou eu que vou trabalhar”



Esta referência a São Januário tem razão de ser, também, pelo fato de ser no Estádio do Vasco da Gama, que fica na rua mencionada na letra, que nos dias 1º de maio o presidente fazia seus famosos discursos dirigidos aos trabalhadores, e que começavam invariavelmente com a frase: “Brasileiros, trabalhadores do Brasil”.

Wilson Batista já havia composto um samba enaltecendo a figura do malandro chegado a vadiagem, intitulado “Lenço no pescoço”, que é de 1933, ainda antes do patrulhamento dos vadios.  Diz assim a letra:

“Com meu chapéu de lado
Tamanco arrastando
Lenço no pescoço
Navalha no bolso
Eu passo gingando
Provoco e desafio
Eu tenho orgulho
De ser vadio”

Sambas deste gênero passaram a ser politicamente incorretos e censurados pelo DIP.

Malandros típicos
Mas voltando ao início do post, o projeto visa revogar o dispositivo que criminaliza a vadiagem porque, segundo o autor do projeto: “É evidente que a simples pretensão de punir aqueles que a sociedade já condenou a exclusão social, a fome e ao desespero revela uma crueldade talvez insuperável em nosso ordenamento jurídico”.

Lindo, não? Mas desnecessário e demagógico. A uma porque ninguém é preso hoje por vadiagem. Ninguém é retirado das ruas pela polícia porque esteja vadiando. A duas porque se não há, nas penitenciárias e cadeias das delegacias de polícia, espaço para trancafiar marginais perigosos, haveria para prender vadios? Ademais, nem mesmo as atividades municipais ligadas a área de bem estar social, conseguem tirar das ruas os pedintes e desocupados. E olha que não seriam conduzidos à prisão e sim a abrigos mantidos pelo Estado onde, mal ou bem, teriam um prato de comida e uma cama para dormir.

Esta lei ficou ultrapassada atualmente e, logo, pode ser revogada. Mas todo o Código Penal, que é de 1941 precisa ser revisto e atualizado porque já não atende as características e padrões de comportamento da sociedade atual. Assim é que delitos muito específicos, como os praticados com recursos da informática e no ciberespaço, e os crimes ambientais, preocupação da moda, não estão capitulados especialmente no código em vigor. Os delitos do gênero acabam por ser enquadrados em dispositivos gerais, por associação de princípios que os definem.

Bem, dia de ficar a toa, de dolce far niente é o domingo. "E abençoou Deus o dia sétimo, e o santificou; porque nele descansou de toda sua obra que Deus criara e fizera" (Gêneses 2:3)

11 comentários:

Anônimo disse...

Deixa ver se entendi. Fizeram uma lei para revogar uma lei caduca, já em desuso. Foi isso? E essa nova lei revogatória,cumprida sua finalidade que é revogar, o que acontece com ela? Se autodestrói?
:D Fernandez

Gusmão disse...

Bom dia pessoal!
Alguém aí tem notícias do confrade bissexto Luvanor Belga?
A coisa lá para os lados de Corumbá anda feia.
Quanto a lei, tem gente que gosta de aparecer. É o caso deste Cardozo, autor do projeto.
Bom final de semana apara todos.

Jorge Carrano disse...

Pois é, Gusmão, o Luvanor anda arredio. Não tem marcado ponto aqui, desde que foi com neto para Atibaia, se não me falha a memória.
Tomara que esteja tudo bem como ele, frequentador ocasional muito educado e ponderado deste espaço.

Fernadez,
A coisa e um pouco complexa para encaixar num comentário. Quem sabe me animo e trato num post futuro.

Abraços

Anonimous disse...

VIVA ZAPATA !!!

Jorge Carrano disse...

Caro Anonimous,
Vou passar atestado de inculto, ignorante da história mexicana. Mas não entendi a relação que possa existir entre o líder revolucionário Emiliano Zapata, personagem real, de carne e osso, cuja aventura, na luta pelos trabalhadores rurais, juntamente com seu irmão Eufemio Zapata, foi retratada pelo escritor (Nobel de literatura) John Steibeck, em livro, depois adaptado para o cinema intitulado "Zapata - Viva Zapata".
Zapata e Pancho Villa, outro revolucionário mexicano, foram, por assim dizer, os primeiros lideres envolvidos com reforma agrária.
Do livro, guardo na lembrança uma passagem que me impressionou vivamente, que relata o castigo imposto por Eufemio a um espanhol. Amarrou-o em uma espécie de cactus que cresce muito rapidamente, sendo que um dos brotos (como se fosse um galho)transpassou o peito do inimigo.
Até hoje não sei se existe de fato este tipo de cactus, que tenha este vigor.
Mas, voltando ao início, poderia explicar para este pobre blogueiro provecto, o que Zapata teria a ver com leis que não pegam?
Obrigado.
Abraço

Anonimous disse...

Simplesmente aproveitei o espaço ao tomar conhecimento da derrota do Brasil de Mano e Neymar para o México, frustrando o ouro inédito.
Só isso! E dei um "Viva Zapata", que equivale a "Viva México!"

Jorge Carrano disse...

Simples assim, não Anonimous?
Eu elocubrando e a associação estava diante de meus olhos. Arriba México!
Viva Zapata!
Claro, simples e pertinente.
Os estoques de tequila se esgotarão, com justo motivo.
Abraço

Gusmão disse...

Vocês sabem que em São Paulo existe uma lei estadual mais ou menos recente (novembro/2011), que proíbe a venda de bebida alcoólica a menores e obriga o estabelecimento comercial a pedir identidade?
Pois bem, alguns estabelecimentos levam ao pé da letra e mesmo que você seja grisalho, e esteja apoiado em bengala para se manter de pé corre o risco de ter exigida a exibição do RG para poder comprar cerveja.
Parece que se o comprador, sendo menor, levar uma declaração assinada pelo responsável, com firma reconhecida, poderá fazer a compra.

Outra aberração sem sentido, também de São Paulo, é exigir a execução do hino nacional antes das partidas de futebol. Não tem qualquer cabimento. Prestem atenção no comportamento dos atletas e do público e respondam se o ato tem algum significado patriótico ou reverencial.

Não sabemos fazer leis? Não é o caso. Não sabemos é votar.

Riva disse...

.... Gusmão fechou o pano, na última linha. Nada a acrescentar.

Riva

Jorge Carrano disse...

Querem um bom exemplo de lei inócua, que não é aplicada e cumprida? A prioridade para idosos na tramitação de processo judiciais.
Experimentem.

Jorge Carrano disse...

E a lei dos extintores de incêndio, agora não mais obrigatórios?