3 de outubro de 2022

Sociologia política

Na grade curricular de formação do Bacharel em Direito, na década de 1960, estudávamos introdução a ciência do direito, economia política, sociologia jurídica e ciências afins. No primeiro ano, como preparação para as disciplinas diretamente relacionadas com os direitos substantivos, como o civil, o penal e do trabalho, e seus respectivos códigos processuais.

Constato que não aprendi coisa alguma, ou esqueci ao cabo de 60 anos. Ingressei na Faculdade de Direito da UFF em 1962.

Como explicar para o distinto público, ou mesmo apenas como introjeção, certos fenômenos sociais.

Estou matutando como é possível, e é porque aconteceu, um certo Ricardo Salles propor a exploração econômica predatória da Amazônia, defendendo em reunião ministerial que seja "aberta a porteira", facultando atividades tais como garimpo ilegal, extração de madeira e ampliação de pastagens, via queimadas e derrubada da floresta, acabar aleito para a Câmara Federal?

Mas não é só isso, que por si só já conduziria a reflexões sobre a percepção  de eleitores quanto a relevância de uma floresta de pé, sendo explorada sustentavelmente.

Há algo menos explicável sob qualquer  parâmetro. Como é possível Marina Silva que tem algum prestígio internacional, com seu nome vinculado a causas de preservação ambiental, ter uma votação menor na disputa de vaga para a mesma Câmara Federal, representando o mesmo Estado ?

Como é possível - como se explica? - um general ungido como ministro da saúde, que numa gestão desastrada foi  responsável pela morte de 680.000 pessoas, ao atrasar a  compra de vacinas, omitir-se em relação a campanhas esclarecedoras e incentivadoras de vacinação, homologando tratamentos com produtos sem qualquer tipo de comprovação quanto a efetividade dos mesmos para aquele fim, qual seja a prevenção da Covid-19.

Alguém que cometeu ato de indisciplina ante aos regulamentos militares, por participação em atividade política partidária, ser agraciado com um sigilo de 100 anos no que concerne  a apuração  e eventual sansão aplicável, acaba de ser eleito deputado federal, sendo o segundo mais votado no Estado do Rio de Janeiro.

E  Fernando Haddad, em São Paulo, prestes a perder, em segundo turno, a corrida pelo governo do Estado, para um carioca que saltou de paraquedas no Estado mais importante da República, sem qualquer histórico de atuação política por lá?

Outras aberrações, fenômenos inexplicáveis a luz da  razão, do bom senso e da lógica poderiam ser aqui registrados mas vou poupa-los disto.

Enfim, talvez Dostoiévski, José Saramago ou Nelson Rodrigues, interpretes da alma e comportamento humanos, fossem capazes de explicar socialmente tais fenômenos.

9 comentários:

Jorge Carrano disse...


Perplexo é pouco. Estarrecido talvez defina melhor meu estado, em face do resultado das urnas.

Jorge Carrano disse...


Só a gyisa de exemplo.

Mandeta foi avaliado como bom ministro da saúde, sendo aprovado por sua gestão durante a pandemia.

Foi cogitado, até, para concorrer à presidência. Não se elegeu senador.

Nosso festejado astronauta, incolor, inodoro e insosso ministro da ciência, que acreditava em tratamentos alternativos, foi eleito.

Inexpressivo no uso das palavras, estará no parlamento.

Michele elegeu Damares, que nos ensinou que meninos vestem azul e meninas rosa.

Para evitar crises de vômito paro por aqui, porque tenderia a piorar.

Se Lula vencer reinará mas não governará. Não com o congresso que restou desenhado.

O tal "orçamento secreto" aberração de amplitude mundial, ficará consolidado, com ou sem Bolsonaro.

Jorge Carrano disse...


Mencionei o caso Mandeta a guisa de exemplo das excrecências eleitorais. Não se elegeu.

Pazuello se elegeu. Os cariocas merecem as agruras e sofrimentos que experimentam no dia-a-dia.

Jorge Carrano disse...


Pazuello teve 205.000 votos.

E Crivela, acreditem, 110.000. Vou vomitar até desidratar. Socorro!

Jorge Carrano disse...


E a dupla Romário e Bebeto?

Um no Senado o outro na Câmara.

O que esperar do parlamento?

Aplaudi a ambos com a camisa do Vasco, de chuteiras; mas de paletó e gravata ... só rindo.

Carlos A. Lopes Filho disse...

Lamentável, Carrano, profundamente lamentável.
E você esqueceu o Onix Lorenzoni, o Hamilton Mourão e alguns outros. No Brasil sempre existiu o chanado "voto de cabresto", o "curral eleitoral", a "milícia". Não sei se esse é o caso, mas não é possível que pessoas normais tenham eleito esses candidatos, tendo conhecimento do que foi a passagem deles pelo governo após 2019. As mortes pela COVID, o incentivo ao uso da cloroquina e a negação à vacina, apenas para citar um dos vários maus exemplos de governança, parecem não ter tido maior importância para esses eleitores. Não estou estarrecido, pois acho que já me acostumei com tudo isso, o que é mais grave. Isso é o Brasil, o país onde nascemos, vivemos e vamos acabar morrendo...

Jorge Carrano disse...


Parece, caro amigo, que nós e alguns outros brasileiros, uma minoria pelo visto, estamos imunizados contra estes comportamentos de rebanho, seduzidos por mitos de pés de barro.

Aqui vivemos e provavelmente aqui morreremos, nas suas palavras. Mas não deixaremos vergonha como herança para filhos e netos.

Estou já no final da leitura do último volume (Dictator) da trilogia de Robert Harris sobre Cicero.

Há um trecho, relatado por seu secretário (dele Cicero), após o assassinato de Cesar, no qual (trecho) o grande orador romano teria dito em conversa com Cornuto senador: Os títeres são elevados, louvados e apagados.

Isto dito em alusão a Marco Antonio, agora o seu inimigo.

Cicero, a par de outras virtudes (e alguns defeitos) foi o grande defensor da República, na Roma antiga.

Abração.

ET: informação aos não iniciados.
O que significa ter os pés de barro?
Esse termo tirado da Bíblia, que serve para identificar na vida pública os falsos valores políticos, ou seja, os líderes, carentes de méritos intrínsecos. Então se diz que se trata de líderes com pés de barro. (Google)

RIVA disse...

Mas vocês, de uma geração antes da minha, não se sentem culpados do que está aí ?





Jorge Carrano disse...


Nós, de uma geração antes da sua, corrigimos rota de colisão com valores estranhos para nós brasileiros.

Defenestramos a petista com um solução altamente tóxica.

Enfrentamos um problema da cada vez. Apoiamos Castelo Branco, e os que o sucederam até a libertação do país da possibilidade de se transformar numa "república sindicalista".

Acabamos com o regime militar, já então com contornos de ditadura pelos excessos (torturas, prisão ilegal, fechamento do congresso).

Aprovamos uma constituinte e devolvemos o regime democrático ao Brasil.

Agora é necessário extirpar lunáticos com aspirações ditatoriais, que usam antolhos, vendo risco comunista onde não existe. Pode ser até que saibam que não há este risco, mas não deixa de ser um bom argumento para se fixarem no poder.

Comparar os militares de 1964 (até o AI5), com estes que dão apoio ao capitão indisciplinado, jubilado do Exército, é miopia política e sociológica.