4 de agosto de 2014

As canções que fizeram pra mim - parte I






Por
Alessandra Tappes












Falar de música não é complicado. É delicado. Envolve sentimentos, situações, gostos, cheiros, saudade... Enfim, envolve as lembranças que tatuam nossa mente em noites de insônia e também as calorosas noites de amor...

A música sempre fez parte da minha vida. E faz. Não crio temas para a vida. A música se encaixa em cada época, ação, situação. Sou péssima cantora de chuveiro e nunca me arrisquei em karaokê. Mas tudo transformo em música. Sempre tenho algo ligado em casa. Não sei fazer nada se não tiver música de fundo.

Falemos de música. De todos os estilos que influenciaram a minha vida. Relaciono aqui as canções que foram feitas pra mim. Cada uma a sua época.
Mas vamos partir do princípio. Onde tudo começou.

Momento gauchesco

Quando trocamos os pampas por São Paulo, eu então com 10 anos de idade saí do aconchego familiar onde nos reuníamos todo fim de semana aos montes na casa do Tio Paulo e tia Sônia com primos, tios, avós, vizinhos, cachorro e o churrasco em brasa pegando a todo vapor. Juntos as malas e móveis, levamos uma vasta bagagem musical gauchesca. Alguns LPs e fitas cassetes feitas pelo Tio Mairnard (irmão de meu pai) e outras pelo Tio Paulo (irmão de minha mãe, o churrasqueiro de plantão, até hoje...)

A saudade do sul foi acalentada pelas músicas que escutávamos reunidos nós os 5 (pai, mãe, minha irmã mas velha e meu irmão mais novo e eu, claro) sobreviventes na selva de pedra, São Paulo. Uma família que se afastara de suas tradições, familiares, costumes, em busca de dias melhores. Uma família que se unira através da música.
Hoje em dia, quando falo das canções que fizeram parte dos meus dias, não posso deixar de falar das canções gaúchas que tanto marcaram a minha família.
Linguagem única e muito peculiar. Mas como tudo na vida da gente é peculiar, vou tentar ser resumida pra não ser cansativa...

Uma das canções que considero principal é o Canto Alegretense. A família de minha mãe toda é de Alegrete. Seus pais que já fazem morada no céu, seu irmão Tio Paulo, o famoso churrasqueiro e meus outros tios que tive a felicidade de reencontrar através do facebook. Tia Alicinha, Tio Flávio (faleceu recentemente) Tio Nelson, Tio Paulinho (também falecido), Tio Danilo e Tia Lucia. Sem falar em minha mãe e minha irmã mais velha Symonne.

 Essa canção é considerada o Hino do Alegretense.
Ouve o canto gauchesco e brasileiro
Desta terra que eu amei desde guri
Flor de tuna, camoatim de mel campeiro
Pedra
moura das quebradas do Inhanduy
(Neto Fagundes - Canto Alegretense)

Outra canção que se tornou hino mas não só para minha família, como para muitas, é a de Teixeirinha “Querência Amada”. O tradicionalismo no sul é muito forte e evidente até hoje. Os CTGs (Centro de Tradições Gaúchas) ainda promovem a preservação da cultura gaúcha através das danças, hábitos, costumes e músicas.

Osvaldir e Carlos Magrão – Querência Amada





Momento Instrumental (Radio Skalla)
Meu pai era “visita” em casa. Assim minha mãe explicara o porquê dos silêncios quando ele estava presente e o porquê de sua ausência quando não estava. Éramos (e somos) 3 filhos. E meu pai mal nos viu crescer. Ficava sabendo que um ficara para recuperação, que o outro tivera febre, mas no final estava tudo bem.

Quando meu pai chegava a casa tarde da noite, nós os filhos já estávamos dormindo, então eu sabia que era a única oportunidade que eu tinha de “curtir” aquele momento em família. Eu ficava acordada fingindo dormir a espera dele. Ele tinha uma rotina que seguia pontualmente quando chegava a casa: pegava seu radinho de pilha, sintonizava na rádio Skalla FM e ia ao banheiro fazer sua barba.

Vinha aquela enxurrada de música instrumental que eu simplesmente adorava! Foi naquele momento tão esperado por mim que eu descobri Jonh Barry tocando Born Free, 101 Cordas com a interpretação sensível de Autumn Leaves, Glen Miller e a bela Moonlight Serenade e outras orquestras como Paul Mauriat, Franck Pourcel, Percy Faith. Ray Conniff! Lembro que meu pai ganhara de minha mãe no Natal 7 LPs de Ray Conniff, e eu secretamente, dizia que era pra mim o presente... Adorava tanto quanto ele.

No final da barba feita, do banho tomado, meu pai vinha em nosso quarto, verificava se estávamos tapados e beijava nossa face. Um homem que foi criado dentro de um quartel militar, cheios de regras e cobranças particulares, aquele era o ápice de carinho que nos era permitido ter de nosso pai.

Pra mim, era pura magia tudo aquilo: as músicas, o cobrir e o beijo. E eu ali, quieta, fingindo dormir pra não perder um momento qualquer. O rádio tocava a madrugada toda. E eu dormia tranqüila, pois sabia que meu pai estava em casa.




Jonh Barry -  Born Free
101 Cordas  - Autum Leaves https://www.youtube.com/watch?v=FnDVxArSLfk

Momento MPB
Minha mãe ficou com a parte da criação dos filhos e das tarefas do lar. Incluía nas tarefas nos tornar cidadãos de bem, filhos prendados e independentes em todos os sentidos. Era árdua sua tarefa, pois tínhamos (e temos!) personalidades bem diferentes.

Mesmo com tantas dificuldades, do macarrão com salsicha em pleno domingo, do refrigerante de 1 litro ser dividido em 5 copos e ser bebida apenas de domingo, do pão com ovo virar festa ao invés de sopa de legumes, minha mãe se saiu bem. Não tínhamos condição de ter empregada em casa então, dividíamos as tarefas e pra coisa ficar mais saborosa, e, minha mãe ligava a todo vapor um “3x1” da Sharp. 

Era a última geração aquele 3 em 1! Rádio, vitrola e fita cassete. Nossa! Nós delirávamos com o aparelho e no meio as faxinas semanais, fomos apresentados a coleção de minha mãe do “Círculo do Livro” com as vozes nacionais de Chico Buarque, Elis Regina, Emilio Santiago, Maria Bethânia, Caetano Veloso, Nana Caymmi, Belchior, Gilberto Gil... Aos 12 anos minhas colegas deliravam pelos Menudos e eu pedia de amigo secreto na escola um LP de Ney Matrogosso... 

Nem preciso dizer que eu era a queridinha das tias, mães das tias. Acho que minha mãe não tem noção do bem que nos fez ao nos botar pra trabalhar ao som do seu bom gosto musical. Sou grata a ela. Muito mesmo.



Geraldo Vandré – Pra não Dizer que Não Falei das Flores
Elis Regina & Adoniran Barbosa - Tiro ao Álvaro


Nota do editor: continua no próximo post.

8 comentários:

Jorge Carrano disse...

Gostei muito do título dado ao post, Alessandra, muito sugestivo.
Obrigado por topar participar aceitando nossa proposta.

Riva disse...

Belíssimo texto, muita sensibilidade, como sempre. Já até escreveu para o Dia dos Pais ... muito bonito mesmo.

Macarrão com salsicha .... essa me pegou lá no fundo, hein, Freddy ?

Riva disse...

... complementando .... concordo, muito legal o título que deu ao seu post .... sim, porque na verdade a gente é meio que construído internamente pelas músicas que nos rodearam na infância.

Depois, tomamos nosso próprio rumo, mas muito influenciado por essa "construção".

Anônimo disse...

As Canções Que Você Fez Pra Mim
(Roberto Carlos)

Hoje, eu ouço as canções que você fez pra mim
Não sei por que razão tudo mudou assim
Ficaram as canções e você não ficou
Esqueceu de tanta coisa que um dia me falou
Tanta coisa que somente entre nós dois ficou
Eu acho que você já nem se lembra mais

Alessandra Tappes disse...

Boa noite rapazes!

Mais uma vez eu que agradeço a participação no seu blog Jorge.

Quanto ao meu post, sobre música, espero que ele não fique cansativo pois é bem pessoal. Sempre faço desse espaço a cadeira do divã, como assim dizem por aí...

Realmente Riva, somos feitos, formados pelas construções do que ouvimos ao longo das nossas vidas, tirando os jingles dos políticos é claro.


Ana Maria disse...

A vantagem de ler os textos de pessoas mais jovens, é que tudo nos soa conhecido. Tirando a parte gauchesca, que não ouvia(exceto o churrasquinho de mãe do Teixeirinha), vivenciei essas épocas com as mesmas trilhas sonoras.

Freddy disse...

Não somos gaúchos, mas se eu e principalmente Mary, minha mulher, tivéssemos de sair do Rio para algum estado do Brasil, escolheríamos sem sombra de dúvida o Rio Grande do Sul. Não conheço praticamente música alguma do folclore gaúcho, mas quando as ouvimos em estadias na serra (Gramado e arredores) agente aprecia. Mais ainda as danças, assistimos sempre que podemos. Destaco o Natal Gaúcho, encenado durante as festividades do Natal Luz de Gramado.
<:o)
Freddy

Freddy disse...

Ei!
Foi erro de digitação que passou despercebido na revisão!
Não é "agente", e sim "a gente".
<:O)
Freddy