27 de maio de 2018

Mero aborrecimento

Há alguns poucos anos estava a caminho de uma audiência, acompanhado da Síndica  do Condomínio que era o autor da demanda judicial que deu origem a audiência conciliatória.

Ela me perguntou: doutor recebi um aviso de cobrança da NET, mas não estou devendo. Tenho os comprovantes. O senhor acha que eu devo informar a provar que a mensalidade está paga, ou devo aguardar um pouco e se eles insistirem entrar com uma ação de dano moral?

Ela entrou na onda dos pleitos de reparação de dano moral, por tudo e por nada, numa avalanche de ações temerárias que inundaram principalmente os Juizados Especiais Cíveis (chamados de Juizados de Pequenas  Causas, quando criados).

Era tal o volume de demandas que em 2004, se me não falha a atribulada memória, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, uniformizando a jurisprudência que se consolidava, baixou a Súmula 75, que tem a redação a seguir:

"O SIMPLES DESCUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL OU CONTRATUAL, POR CARACTERIZAR MERO ABORRECIMENTO, EM PRINCÍPIO, NÃO CONFIGURA DANO MORAL, SALVO SE DA INFRAÇÃO ADVÉM CIRCUNSTÂNCIA QUE ATENTA CONTRA A DIGNIDADE DA PARTE”.

A ideia, o objetivo, era combater a "chamada industria do dano moral", como se convencionou chamar este tipo de pleito no Judiciário.

Com efeito muita gente ganhou dinheiro,  e despertou a gula de outras tantas pessoas, com o recebimento de indenizações por danos morais.

A partir da edição da súmula supracitada os juízes de primeiro grau e o próprio tribunal de segunda instância passaram a decidir sob outra ótica, ou julgando improcedentes alguma lides ou fixando valores ínfimos - diria mais moderados - para as reparações.

Disto resultou, agora,  num movimento contrário que tem até mesmo desembargadores aderindo, para combater a criação da "indústria do mero aborrecimento", como rotularam os resultados das ações com fixação de valores bem modestos, tipo R$ 2.000,00, por dano moral e/ou estético.

A argumentação que valida esta nova tese é a de que as empresas campeãs de reclamações no Judiciário continuam sendo as mesmas, há anos, tendo as do ramo de telefonia e energia na liderança, secundadas por bancos.

Segundo o parecer de um desembargador, cuja entrevista li recentemente, algumas empresas incluíram em suas planilhas de custos as despesas com honorários e indenizações que terão que pagar a consumidores ou usuários de seus serviços.

Ou seja, preferem ter a seus serviços batalhões de advogados pera defendê-los judicialmente, do que investir em tecnologia, materiais e mão-de-obra especializada para melhor seus desempenhos.

Os advogados abriram frente de batalha contra a industria do mero aborrecimento, até porque disto resultam valores muito baixos de honorários.

A maioria que atua nesta área de defesa do consumidor, presta o serviço através de contrato de risco, ou seja, não cobra honorários antecipados, mas estabelece em 30% (no mínimo) do valor da indenização obtida em sentença a titulo de honorários.

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