20 de fevereiro de 2023

Carnaval : chuva, suor e cerveja

 






Por 
Ana Maria Carrano







A origem do Carnaval tem inúmeras e possíveis versões. Todas se referem a uma festa popular, de caráter orgíaco.

Alguns dizem que começou como homenagem a deuses gregos ou romanos; outros dizem que surgiu nos rituais de fecundidade do início da primavera. Citam-se também as alegres festas egípcias em louvor a Isis.

As divergências de opinião quanto à sua origem deixam apenas duas certezas: estas comemorações remontam a época anterior ao Cristianismo, e nele as pessoas entregam-se a dança, embriaguez e ao sexo.

No início da Era Cristã o Catolicismo, vendo que não conseguiria afastar o povo dos rituais pagãos, assumiu a festa, incluindo-a em seu calendário, como evento que antecede a Quaresma. Foi-se incutindo a ideia de uma comemoração sem excessos e sob a benção papal.

Até que funcionou por muito tempo, pelo menos para a maioria das pessoas. Estimularam-se os bailes de máscara e a participação das famílias no Carnaval. Idosa que sou, posso afirmar que conheci e participei de bailes em clubes de bairros com caráter puramente familiar.

Surgiram bailes à fantasia, cortejos, corso, carros alegóricos até que apareceram as famosas Escolas de Samba.

Lembrem que falei que funcionou por um tempo e para muitos, mas...

O Carnaval na verdade sempre manteve sua identidade secreta de bacanal, liberação dos sentidos e bebedeiras.

Os barracões de Candomblé e os terreiros de Umbanda fazem, antes do Carnaval, sessões de liberação de Exus e fechamento de corpos. Proteção para seus seguidores (link 1).

Pois é. Existe a festa aprovada pela Igreja e a outra. Eu quase posso dizer que conheci as duas.

Sou filha de um folião. Nas histórias correntes na família, o meu pai (do manager também), era participante da Sociedade Carnavalesca “Tenentes do Diabo” (link 2).

Desfile da sociedade carnavalesca "Tenentes do Diabo", em 1913
Meu pai com outros foliões
Creio que por este motivo éramos levados, desde pequenos para ver a festa ou para brincar nos clubes de bairros.

Não me lembro se gostava ou não. Ia obedientemente como convinha às crianças da época. Minha primeira e frustrante lembrança se refere a um passeio pelas ruas da cidade, provavelmente com colares ou fantasia, quando de repente uma briga se inicia. Cacos de vidro, sangue numa rusga de bar e papai nos levando em retirada para casa. Talvez daí venha minha fobia a multidões (ou talvez não).

A autora com a irmã mais velha,
fantasiadas de havaianas
Com um pai festeiro e carnavalesco não me restava alternativa. Providenciavam fantasias baratas (havaiana era a que custava menos) e lá íamos para o Sepetiba Futebol Clube, na rua do mesmo nome (fechado há alguns anos) onde, nas matinês, pulávamos no salão, eu sempre perto da irmã. Não lembro onde ficava o Jorge nessas ocasiões. Lembro apenas que durante algum tempo o meu irmão mais velho (único menino), passava os carnavais dormindo ou fazendo sei lá o que, dia após dia em seu quarto. De repente, passou a frequentar os bailes com a família, mas pasmem, circulando no salão pela contramão.

Lá pelos 15 anos descobrimos o Carnaval de rua. Com a aprovação dos genitores, saíamos vestidas de “sujo”: roupas masculinas largas e máscaras de fronha. Eu minha irmã Sara e umas meninas da vizinhança. A cada ano que passava o grupo aumentava e se aprimorava. Compramos roupas de palhaço (de bolas), máscaras e íamos ao encontro dos blocos tradicionais ou desorganizados. Por baixo da fantasia um maiô, visto que no fervor do verão, dávamos uma paradinha no arremedo de praia ao lado da Estação das Barcas (antes da reforma) para mergulhos refrescantes. Não comíamos nada durante a jornada que durava 6 ou 7 horas. Embrenhávamos-nos na Rua da Conceição onde era o que havia de mais quente na folia das ruas.

Como fui instada pelo blog manager a revelar meus segredos, confesso que aproveitávamos para ganhar uns beijos de rapazes bonitos que não nos davam bola.

A fase passou e a família deixou de ir aos bailes no bairro e a perseguição aos blocos de rua. Os feriados eram aproveitados para viagens. Por isso aproveitei a adolescência no Sport Clube Maricá pulando na matinê e a noite. Já era crescidinha ocupávamos a praça de manhã com cantorias e paqueras regadas a cerveja e vodka.

Seguiu-se a época dos bailes do Canto do Rio quando os seguranças (chamados dragões) distribuíam comprimidos indiscriminadamente pra garotada. Como sou careta, os que me cabiam derretiam no suor na mão fechada.

Um dia descobri que não gosto de pular, malhar, nem me exercitar.  Percebi que ia na onda, como quando, por imitação, me deixava torrar nas areias das praias.

Nada contra quem gosta. Nada contra quem detesta.

Pessoalmente não tenho disposição para Carnaval, nem pela TV.

Aprecio os melhores momentos quando tenho tempo e os destaques que são exibidos exaustivamente até a Páscoa.

Gosto de samba, mas os enredos de hj em dia não me empolgam; não tenho condições físicas para dança, me restando livros gentilmente fornecidos pela sobrinha caçula e a internet se a Oi permitir.

Aproveitei quando pude e era mito bom. Hoje são agradáveis lembranças que me tiram sorrisos e suspiros

Notas explicativas da autora: 
Foto minha com Sara (irmã), de havaiana , por volta de 1952.  - Arquivo da família
Foto de papai com amigos, provavelmente no Clube Humaitá, em Niterói  - Arquivo da família
Carro alegórico dos Tenentes do Diabo  - tirada da Net 

Links:


4 comentários:

Jorge Carrano disse...


"Hoje são agradáveis lembranças que me tiram sorrisos e suspiros."

(Excerto do texto da autora).

Jorge Carrano disse...


Publicada originariamente em 2015.

Assim como a de ontem e a de amanhã.

RIVA friburgando disse...

Ana, quanto tempo !!! rsrsrs

Tudo bem com vc ?

Reli seu post, bem legal, completo. Na época também escrevi sobre os "meus carnavais". Carrano colocou o link do post em algum lugar.

Bjs e "bom Carnaval", ou seja, bom descanso pra gente.

Jorge Carrano disse...


Ler ela lê, mas participar jurou que nunca mais. Por razões políticas.

Ela era (será que ainda é?) bolsonarista. Ficou zangada comigo.

Mas nos amamos e nos respeitamos no trato familiar.