4 de fevereiro de 2015

As escolhas

Parei para pensar nas escolhas que tenho feito na vida. Isto em função dos cinquenta anos de casamento, recém-completados.

A primeira dúvida que me veio a cabeça é se fiz mesmo as escolhas, ou foi a tal destino que escreveu o roteiro, encaminhando-me por caminhos que jamais imaginei.

Um bom exemplo é a profissão que escolhi, meio que por exclusão.

Queria ser militar e acho que tinha todo o aparato necessário para ser um bom oficial militar. Amante da disciplina e do respeito à hierarquia, tinha também senão a coragem, pelo menos  a falta de medo necessária para enfrentar as agruras e os riscos.

Tanto que fiz o concurso de admissão para a Escola da Aeronáutica. Pilotar um jato, com a farda da Força Aérea Brasileira foi um sonho que alimentei durante algum tempo.

Na verdade inicialmente, escolhida a carreira militar, minha preferência estava na Marinha do Brasil. A volta ao mundo, numa viagem de instrução pelos mares do mundo, ao final do curso, antes da graduação como  aspirante, no navio-escola  Almirante Saldanha da Gama, era uma das coisas que me motivava.

Almirante Saldanha da Gama
A outra, agora posso confessar, era envergar, como cadete,  aquele farda branca que fazia enorme sucesso entre as meninas. Dizia-se na época, primeira metade dos anos 1950, que na marinha estava a elite das forças armadas. Os oficiais mais bem preparados intelectualmente e culturalmente.

As moças casadoiras (casadouras? Socorro Aurélio!) adoravam a farda dos cadetes.

Depois, em contato com outros jovens que se preparavam para os exames de ingresso nas forças armadas, fui mordido pela mosca dos jatos. Participar da  esquadrilha das fumaça era irresistível.

Fiz esta escolha com apoio e incentivo de meus pais, exceto de minha mãe, em relação à Aeronáutica.

Mas minha escolha não prevaleceu. Uma discromatopsia nem desconfiada me alijou da carreira militar.

Foi uma escolha fracassada. Fui empurrado para atividade profissional na vida civil. A opção natural era Direito. Pelo instrumental que eu tinha. Lia bastante e escrevia com uma boa dose de acerto. E agradaria meu pai, que lamentavelmente não me viu formado.

Uma escolha pessoal que fiz ainda aos nove anos de idade, foi a do clube do Rio de Janeiro para torcer. E a escolha se deu um função do sucesso do Vasco da Gama naqueles anos 1940. Ademir  (o Queixada) o grande artilheiro e o clube com nove jogadores convocados para a seleção brasileira em 1950. Perdemos a Copa e choramos muito. Mas esta vergonha, este insucesso, jogando em casa, ficou em segundo plano depois dos 7X1 recente na Copa de 2014.

A esposa, a mulher com a qual eu casaria e constituiria família teria sido uma escolha minha? Penso que não. Acho que a escolha da Wanda me deu coragem e incentivo para faze-la minha namorada, o que nos levou ao casamento.

Contado ninguém acredita. Nosso casamento seria uma das coisas mais improváveis de se materializar. Morávamos a mais de quatrocentos quilômetros de distância, éramos muito pobres, o que dificultaria minhas viagens até Cachoeiro de Itapemirim, onde ela morava. Pior ainda, mais difícil, ela vir até Niterói, eis que implicaria, também, em despesa para uma acompanhante.

E tinha um complicador. Ela tinha um namorado, muito estimado na família e que até a avó dela  admirava. E eu tinha um namorico aqui em Niterói.

Quando assumimos que seríamos namorados prometemos, um ao outro, toda transparência e lealdade, porque senão seria muito difícil prosperar. Leviandade seria inadmissível

Ela terminou o namoro em Cachoeiro, e eu em Niterói. E passamos a nos corresponder por cartas, único meio de comunicação,  já que não havia internet (nem na ficção) e nem telefone onde ela morava. Somente um posto de telefonia pública, onde era preciso pedir a ligação e esperar por vezes horas até que fosse completada.

Acho que esta escolha foi conjunta, porque se Wanda não tivesse dado força eu não teria a coragem de enfrentar as dificuldades.

Não sei, de verdade, o que ela viu em mim; eu, entretanto, sei o que nela me atraiu desde que a conheci, por acaso. Foram as belas pernas (do joelho para baixo, a parte visível). Ela sabe disso e por isso não estou sendo inconfidente ou boca rota ou revelando algo inconfessável.

O respeito, a admiração, o afeto, a parceria, a cumplicidade,  vieram com o tempo. Mais precisamente cinquenta e quatro anos, se somarmos aos cinquenta anos de casamento, os quatro anos de namoro e noivado.

Isto porque fizemos tudo no modelo antigo. Namoramos, e dois anos depois avisei que pediria a mão dela em casamento. Pedi um encontro com o pai dela e fiz o pedido formal. Estávamos  só os dois na sala de visita da casa onde moravam.  

Quando revelei o motivo da conversa ele não respondeu, apenas gritou para dentro da casa, em direção à cozinha: “ Anésia, vem cá, o Jorge está pedindo a Wanda em casamento”. Dona Anésia, minha sogra, já estava alertada pela Wanda e ambas aguardavam o desfecho de meu encontro com o temido João Campagna. Foram dois anos de noivado.

Sobre outras escolhas, acho que vale a pena comentar a opção religiosa. Nasci numa família católica, com um pé no espiritismo. Meu pai era espírita e minha mãe católica, todavia alguns outros membros da família dela eram espiritas. Foi por isso que se conheceram.

Assim, fui batizado e fiz primeira comunhão. Mas depois de crescidinho abandonei as crenças religiosas.

Como visto a escolha da profissão foi obra do destino. O daltonismo impossibilitou minha opção. No futebol foi uma decisão meio óbvia. No casamento foi uma decisão conjunta e na religião minha opção foi decorrente de decepções, e questões não respondidas satisfatoriamente.  


8 comentários:

Jorge Carrano disse...

Já que o assunto são as escolhas, vejamos quem será escolhido(a)para substituir Graça Foster, na Petrobrás.

Jorge Carrano disse...

Acessem. Tem histórias do passado.
http://calfilho.blogspot.com.br/2015/02/manels-e-outros-mais-calfilho-mercearia.html

Unknown disse...

ENQUANTO ISSO, OS FLOCOS DE NEVE COMEÇAM A CAIR AQUI, COMO NAQUELES PESOS DE MESA, QUE A GENTE SACODE E CAI A "NEVE".
AMANHA EU PRETENDIA IR TIRAR MINHA CARTEIRA DE MOTORISTA... PELO VISTO, SE NEVAR A NOITE TODA, NADA FEITO...
FICAREI EM CASA, COMENDO CHIPS WAVE, E LENDO O http://jorgecarrano.blogspot.com.br/ DE AMANHA..
ESCOLHAS?... A GENTE PÕE E DEUS DISPÕE... JÁ DIZIA MINHA AVÓ...
BETH

Jorge Carrano disse...

Pois é, Beth, você lê os posts em primeira mão, se quiser.
O fuso horário de 4 horas favorece isto.
Em geral o novo post é publicado aos 30 minutos, também conhecidos como meia noite e meia.
Assim, quando a maioria de nós está indo dormir, você ainda está assistindo a novela da oito(lol).

Riva disse...

Não dá para analisar escolhas feitas.

É como analisar uma partida de futebol que acabou (lá vem o meu futebol, não é, Freddy ?). Mas é que o futebol serve como analogia para tudo !

Eu poderia colocar aqui que pude ficar nos EUA em 1969, em casa de família e trabalhando em alguma lanchonete, ganhando uns bons trocados, completar meus estudos por lá e tal ..... mas minha escolha foi pelo retorno para o seio da família, fazer o pré-vestibular e cursar Engenharia, como meus pais acordaram.

E se ?

Se ... não teria conhecido a Isa, não teria os filhos maravilhosos que tivemos juntos. Não teria a vida que tive até hoje com ela. Ela me deu o amanhã dela, e vice-versa.

Não dá para analisar escolhas .... é o que é.

Calfilho disse...

Gostei muito, Carrano. Como você, muita coisa na minha vida não foi planejado, pensado, refletido. A principal delas foi a carreira que segui: pretendia ser médico para fazer a vontade de meu pai, também médico, por isso cursei o rigoroso científico do Liceu. Cheguei a fazer o vestibular de medicina, sabendo que não iria passar, pois não me preparara suficientemente e por achar que não seria um bom médico. Acabei fazendo, sem meu pai saber, o vestibular de Direito, que era bem mais fácil de ser aprovado,
mas, também, sem ter nenhuma vocação para a carreira. Quando já estava no quarto ano, fui trabalhar no interior do RJ e, lá, sem conhecer ninguém e não ter nada para fazer, comecei a estudar realmente o Direito. Fiquei dois anos naquela cidade e, quando voltei a Niterói, já era um advogado razoável. Fiz concursos para Promotor de Justiça, no antigo Estado do Rio e São Paulo, sendo aprovado em ambos. Depois, candidatei-me à magistratura do antigo Estado da Guanabara, também tendo a felicidade de ser aprovado. Acho que Deus nos deu o livre arbítrio para fazermos nossas escolhas na vida, mas, acredito que algumas deles já estejam previstas sem que nós saibamos. São as circunstâncias da vida que nos levam a elas.

Jorge Carrano disse...

Como disse o Chico Buarque, "a gente quer ter voz ativa, no nosso destino mandar, mas eis que chega a roda viva e carrega o destino prá lá."

Freddy disse...

Destino... Escolhas... Mazelas...
Eu tinha uma direção desde criança, segui-a. Eu queria ser engenheiro e assim me formei. Aceitei algumas escolhas que a vida me apresentou, algumas delas são a base do que sou hoje. O emprego na Embratel, a escolha inicial pela área de telex, meio conturbada na empresa mas que me permitiu passar 7 meses na Alemanha e ascender a postos de gerência... Lembro o dia em que saí por insistência de um amigo e conheci Mary, com quem me casei e tive filhas lindas...

Sofri, no entanto, a mão pesada do destino, que alterou bastante a trajetória que eu vinha traçando.
As três ocorrências mais significativas foram:
- o acidente que quase me aleijou aos 17 anos (1968);
- a morte prematura de meu pai (1982), que era quem cuidava de nossa mãe, cega desde a década de 60;
- a síndrome de cólon irritável, que a partir de 1986 praticamente acabou com minha vida social até que finalmente aprendi a lidar com ela.

Continuo a ter de fazer escolhas, continuo a me preocupar com a mão do destino. Afinal, já tenho 64 e estou em situação de risco por obesidade. Tenho de me segurar na aposentadoria sem saber se guardo para um futuro que pode não chegar ou se gasto e me torno um Jorginho Guinle, que achava que morreria aos 80 e torrou tudo - e continua vivo!
Escolhas, escolhas...
<:o)