15 de dezembro de 2017

O mais perfeito dos anéis


Por
Alessandra Tappes




Você conhece o efeito de um anel descascado? Sabe seus malefícios?

Pois vou lhes explicar os benefícios, porque de coisas más, estamos saturados.

Porque não é ouro nem prata. É bijuteria mesmo que se agregam aos meus dedos. É o passo leve do dia a dia que compõe meu caminho, é o vento leve que balança as folhas das árvores, é o sorriso de um desconhecido para aquecer a alma...é a lembrança da conversa anterior que embalam as noites de sono.

Endereço físico: Praça Baltazar Silveira, s/n. Várzea, Teresópolis, Rj. Endereço do cidadão da cidade: Coração de Teresópolis. Praça da Igreja Santa Teresa (Santa Teresa de Ávila, a padroeira da cidade). Bem ali rodeadas de árvores que dançam com o vento, ao seu lado as velas que choram com seus aflitos, bandeirolas que assoviam alto, com seus bancos para seus ilustres curiosos, solitários e amistosos visitantes. Bancos lotados disputam lugares entre uma pipoca sendo devorada pela senhora e uma moça com seu gatinho para adoção. A árvore decorada para o Natal tem a fisionomia das pessoas que por ali circulam: simplicidade, sem muito enfeites, sem muita firula.

Seguindo o caminho que me leva para qualquer lugar aprazível ao sair da praça, sigo em troca do anel recém comprado, porém descascado.

Encontro uma vendedora pronta a escutar minha paixão por livros. Do nada surgiu o assunto. Ela, comovida com minha busca por um livro que li na adolescência, mareja seus olhos de lágrimas ao escutar com detalhes a riqueza sobre o livro. Disse que carregará consigo os conselhos sábios de Helene Hanff. Também os carrego...Assim como o livro. Ficamos quase meia hora falando de livros e nem em livraria eu estava.

Ao lado do Doces Húngaros, famosa na cidade por seus doces e salgados mas perderam lugar para a péssima qualidade no atendimento temos o Café SanTelmo que  sofreu uma reforma para melhor agradar minhas vistas. Mesas rusticas e aconchegantes para dois, sofás confortáveis para seis. Várias tribos pairam ali. Eu ainda não.

Sigo em frente sentindo o prazer em desfilar naquele pequeno percurso, quando sou abordada por outra vendedora muito simpática que me convida para entrar em sua loja. Sou calorosamente despedida com um abraço, esses de amigo, de alisar costas, de afagar choro contido. Uma relação de cliente e vendedor que só se tem em cidade pequena.

Temperatura agradável se fez na cidade. Sem chuva. Na frente do Mundo Verde (casa de produtos naturais), faz-se de morada dois cães de rua já recolhidos em suas caixas com cobertas. Ao lado direito, ainda na entrada do Mundo Verde, mas sem prejudicar a clientela, encontra-se dois potes limpos de água e ração. Ali eles dormem sem se importarem com o barulho da rua, a lista de compra de Natal da filha com mãe, a pressa desajeitada do menino para a corrida pelo ônibus.

6 badaladas. Fico sem saber como perpetuar aquele som em mim. Passa um filme na minha cabeça quando eu escuto e tento memorizar cada detalhe: o gatinho a ser doado pela menina tímida, as bandeirolas que enfeitam a frente da igreja e que assoviam, o sorriso simpático das pessoas que passam por mim, os pombos voando...

Ainda no caminho de casa, me detenho em mais uma vitrine. Entro por curiosidade e ganho novamente o prazer da conversa jogada fora, a ponto de distrair e esquecer um mimo que ganhei de minhas crianças especiais. Cerca de 30 metros adiante, dou conta da falta de meu presente, um vasinho de suculentas, e, ao me virar para retornar à loja, esbarro com “Daiana” a vendedora que nada me vendeu, mas que num gesto de generosidade e um sorriso encantador, devolve meu presente. Pura satisfação em seu olhar.

Ah praça abençoada! Feita de sabores e aromas. De faces e cores. De pessoas simples e descuidadas também. Com guardas multando quem para nas duas únicas vagas de deficientes. Feita com a melhor torta de Limão as sextas e sábados, do jogo de cartas dos aposentados. Dos meninos que matam aula e por ali ficam papeando. Praça de encontros, praça de pombos, praça de praça. Praça de Teresópolis. A melhor.


Volto para casa feliz, muito encantada pela vida, o sonho a alegria me dá, por aqui me encontrar.

 O anel? Foi trocado... e se descascar novamente, volto com o maior prazer a trocar...
  

4 comentários:

Jorge Carrano disse...

Bem-vinda de volta Alessandra.

Obrigado por compartilhar suas emoções, seus sentimentos e sua interpretação em face de Teresópolis.

Alessandra Tappes disse...

Olá Jorge!

Essa cidade que tanto me recebeu de braços abertos, não poderia ter outra descrição menos sentimental. Não seria o centro de Teresópolis, não seria de mim me os sentimento.

Agradeço seu carinho de sempre aí né proporcionar esse espaço para aqui dar asas a mha imaginação.

Bjs em vc e Wanda! Aguardando sua visita!

Alessandra

Riva disse...

Olá Alessandra, seja muito bem vinda de volta !

Lendo sua excelente exposição de sentimentos, de percepções, fico pensando se você conseguiria sentir tudo isso (benefícios)em um outro ambiente, um outro local, para muitos perturbador, como apenas por exemplo, o ponto do ônibus 49 nas Barcas de Niterói, às 19h, depois de um dia de trabalho.

E vou responder : tenho certeza que sim, que conseguiria perceber e descrever benefícios de ali estar. Está em você, não está no ambiente em que você se infiltrou.

Eu estou numa espécie de fase contemplativa, mais sensível a "coisas despercebidas". Aquele lance que se descreve como " ando devagar porque já tive pressa".

E andando devagar, percebo muito mais intensamente os cheiros, os gestos, as intenções, a felicidade ou a tristeza no rosto das pessoas. Não sei se estou me fazendo entender ....

Enfim, hoje para mim, os benefícios da Praça Baltazar Silveira são exatamente os mesmos da Praça Araribóia, em Niterói. É olhar o copo meio cheio, ao invés de meio vazio. E a gente descobre a riqueza à nossa volta.

Bjs !

Jorge Carrano disse...

É uma lástima que a Alessandra não possa ser tão assídua quanto gostaríamos.

Seus texto sempre nos agradam. Você tem razão Riva, ela é sempre muito bem-vinda.