É certo: tenho sangue gaúcho nas veias sim apesar de n ser
gaúcha. Cresci entre os suculentos churrascos e a doce tentação da Ambrosia.
Passei minha infância dividida entre os cafés coloniais da serra gaúcha nos
fins de semana de inverno, as idas nas vinícolas gaúchas de Ijuí comendo pastel
na gruta. Amava por demais as idas às vinícolas de tal forma que quase matei
meus pais de desgosto afirmando q queria ser enóloga, quando crescesse.
Evidente q poupei a vida deles.
Até meus 10 anos tive tudo pra perder meu medo de nadar. Em
pleno verão, reuníamos os tios e primos por parte de pai e íamos quase todos nadar
no Rio Uruguai. Meus avôs paternos moravam bem na fronteira numa cidadezinha
chamada Quaraí. Atravessávamos a rua e já estávamos no Uruguai. Entre os pães
caseiros recheados com lingüiça, cuca alemã e a famosa pizza uruguaia que minha
avó fazia aos montes pra gente curtir aquele piquenique, não faltava o
refrigerante Crushi, Charrua e Minuano, com avós de plantão nada era proibido...
Aos 10 anos e alguns meses, meu pai fora transferido para São
Paulo. Meu estado natal e que eu era louca pra conhecer de perto. Toda a
maravilha do sul ficava apenas paras as férias escolares e se passássemos de
ano.
Com bastante dificuldade e ajuda das colegas de colégio,
troquei o “tu” por você e o “contigo” caía nas graças de todos. Sem falar nos
excessivos “bah” que o gaúcho solta pra mostrar que está feliz, pra dizer q
está triste... Quando citava meus pais, irmãos, eu falava “o pai, o mano, a mãe...”
havia uma colega que volta e meia me corrigia dizendo pra assim: “Alessandra, é
o Seu pai, a Sua mãe, o Seu irmão.
Eles são seus, nada meus, nada nossos e nem dos outros! ok?” não entendia o porquê
de tanto egoísmo....meu...e também
aquele “ok” e o tal de “putz” credo!
Soava feito palavrão pra mim. Claro que descobri depois que além de ser
realmente um palavrão, era a gíria entrando na veia (o que eu abomino até hoje).
Então, toda aquela variedade da gastronomia simples e familiar do sul que tínhamos
dos fins de semanas e férias em família, passou a ser substituído pelas Pizzas
das cantinas do velho Bexiga, hot-dogs de esquina, os Motis da vizinha Judith
Yoshikawa, os apimentados Aracajés das baianas da Praça da
República e sem deixar de falar das maravilhosas Esfihas árabes dos
milhares de árabes espalhados entre botecos, bares e restaurantes de São Paulo.
E foi assim por mais de 25 anos.
Baseado nesse montante de diversidade que São Paulo oferece,
tornei-me profunda admiradora da culinária árabe. Encantada realmente. Tamanho
meu encantamento que volta e meia ensaio na cozinha Mjadra, Esfihas, Kibes.
Sexta feira passada fiz Kafta de forno. Segundo os moradores
de plantão ficou uma delícia...
Mas vamos a minha especialidade por assim dizer.
As Esfihas árabes. As de carne são as
preferidas aqui em casa. Apesar de não ter nenhuma descendência árabe, meus
familiares adoram quando eu faço. O forno ligado é sinônimo de casa cheia! Um
ótimo motivo pra reunir a família.
Tenho uma receita que sigo rigorosamente cedida por uma
colega da colônia árabe. Fácil de fazer e fica realmente deliciosa.
Mas em primeiro lugar,
a que se preparar o recheio, assim dá tempo do limão cozinhar a carne.
Massa:
1 kilo de farinha de
trigo especial
100 gr de fermento biológico
2 colh de sopa de
açúcar
2 colh de margarina
½ copo de óleo
Sal a gosto.
Um toque especial pra massa: Quando for trabalhar com
farinha, pense somente em coisas boas, nos momentos alegres, ligue uma música
que lhe agrade e toque-a com carinho. Farinha nas mãos significa ouro, riqueza.
Para o recheio:
1 kilo de patinho moído
2 vezes
2 tomates ao ponto,
picados com pele e sementes
2 cebolas grandes
picadas
Suco de 4 limões ou
mais
1 colh de pimenta síria
Sal a gosto
2 colheres bem cheias
de Tahine.
Pegue a carne crua, misture a ela a cebola, o tomate, a
pimenta síria, o sal e o suco dos limões. Deixe de molho por 2 horas. Depois você
esprema com as mãos para tirar todo o suco. A carne passa de vermelha a um tom
cinza. Não se desespere! Está certa a sua receita. Agora acrescente as 2
colheres de Tahine.
Hora de preparar a massa. Como uma massa de pão normal, mas não
se esquecendo do lado de “cultuar” a farinha toda em suas mãos, não deixe a
massa descansar. Quando ela estiver pronta, faça bolinhas do mesmo tamanho.
Essa receita rende em média 40 Esfihas grandes, o que significa
bolinhas de uns 6 cm de diâmetro.
Depois de dispostas todas, comece a abrir para rechear. Abra
com o punho ou com um cilindro, coloque
o recheio bem generoso na massa e a feche feito um triangulo. Para dar um ar
tradicional a sua receita, deixe a parte da “costura”, a parte que se fecha, virada
para cima e não passe ovo na massa. A Esfiha não deve assar por muito
tempo, em média 15 min cada fornada.
Bom proveito a todos vocês!
20 comentários:
Alessandra,
Costumo pingar umas gotinhas de limão quando como esfiha. Este hábito é uma heresia. Os árabes o condenam ou toleram?
Moti é aquele bolinho de arroz, ou estou enganada?
Nasci na Serra Gaúcha e depois que casei mudei para São Paulo (interior).
Acabei me acostumando com a variedade da culinária paulista.
Frequentei muito o Almanara, da rua Basilio da Gama.
Helga
Jorge, isso não se faz com um descendente de sírios (dos dois lados). Depois que cada um foi à sua vida, saindo de Terê, uma das "chantagens" de que mamãe se valia, era fazer um almoço totalmente árabe (e ela era mestra nisso!!!) pra poder reunir a família.
Hoje sem ela, volta e meia passo aqui em frente, no Trade Center, no Kamilus, pra matar a saudade.
Será que a Alessandra entrega a domicilio?
Abs.
Paulo
E.T. Ficou uma dúvida geográfica em seu depoimento que li com um babador. O Rio Uruguai, onde ela nadava, separa o Brasil da Argentina. (?)
Olá Jorge!
O limão tendo origem asiática, foi levado a Europa através dos árabes, chegando primeiro na Espanha, no fim da Idade Média. Então, acho que faz parte da cultura as gotinhas de limão nas esfihas, kibes, kaftas, até na lentilha bem quentinha cai mto bem umas gotinhas. Fica muito bom mesmo, bem lembrado sua colocação.
Helga,
Moti é sim o bolinho de arroz especial chamado de "arroz moti" o tem que se mastigar bem ele, pq a primeira "dentada" é bem duro. Quem não tem o hábito, até se engasga no começo.
Um dos sócios herdeiros do Almanara era cliente da revenda de moto que eu trabalhava na década de 90. Subíamos a serra da Mantiqueira em direção a Serra Negra em caravana de moto. No fim da tarde, íamos em peso comer suas famosas esfihas e kibes. Bons tempos.
Interioiir de São Paulo? Uau! Café coado “meia”? Chopperia Pinguim? Bauru de Bauru? Ah...deu até uma saudade imensa do interioiiir de São Paulo agora. Das músicas regionais, dos sotaques fortes que eles carregam , dos excessivos “ir” dobrados ao meio quando pronunciam “poirta, veirde”. A saudade é tamanha que não paro aqui de cantarolar:
De que me adianta viver na cidade
Se a felicidade não me acompanhar
Adeus paulistinha do meu coração
Lá pro meu sertão eu quero voltar
Ver a madrugada quando a passarada
Fazendo alvorada começa a cantar
Com satisfação, arreio o burrão
Cortando o estradão, saio a galopar
E vou escutando o gado berrando
Sabiá cantando no jequitibá
Por Nossa Senhora, meu sertão querido vivo arrependido por ter te deixado
Esta nova vida aqui na cidade
De tanta saudade eu tenho chorado
Aqui tem alguém, diz que me quer bem mas não me convém, eu tenho pensado
Eu vivo com pena, mas esta morena
Não sabe o sistema que eu fui criado
Tô aqui cantando, de longe escutando alguém está chorando com o rádio ligado
Que saudade imensa do campo e do mato do manso regato que corta a campina
Aos domingos eu ia passear de canoa nas lindas lagoas de águas cristalinas
Que doce lembrança daquelas festanças
Onde tinha danças e lindas meninas
Eu vivo hoje em dia sem ter alegria
O mundo judia mas também ensina
Estou contrariado, mas não derrotado
Eu sou bem guiado pelas mãos divinas
Prá minha mãezinha já telegrafei
Que já me cansei de tanto sofrer
Nesta madrugada estarei de partida
Prá terra querida que me viu nascer
Já ouço sonhando o galo cantando
O inhambu piando no escurecer
A lua prateada clareando as estradas
A relva molhada desde o anoitecer
Eu preciso ir pra ver tudo ali
Foi lá que nasci, lá quero morrer
Se bem que já afirmei aqui que quero muito acabar meus dias em Visconde de Mauá...
Alessandra,
Morei cerca de dois anos em Ribeirão Preto. Na época só havia um Pinguim (depois abriram filial) e ara extremamente concorrido porque o chope era divino mesmo.
Paulo
Na verdade eles nadavam porque eu só molhava os pés...rsrs. Citei no texto a cidade fronteiriça Quaraí que ocupa a área de confluência entre o Rio Uruguai e o Rio Quaraí, moldando o município a um formato de triângulo ou de península fluvial. Seu ponto mais ocidental encontra-se numa ilha a sudoeste desta confluência, disputada entre o Brasil e o Uruguai há mais de cem anos, sendo denominada como a Ilha Brasileira, já dentro das águas do Rio Uruguai.
Segundo o Google, e minha infância “é um rio que marca o limite da parte norte do Uruguai junto da fronteira Brasil-Uruguai. Ao início de seu curso corre com direção noroeste, para logo dirigir-se para oeste, desembocando finalmente no rio Uruguai”.
Sobre as esfihas.
Posso sim entregar, mas quando tiver um portador a Niterói!
Farei as esfihas da forma como faço aqui em casa: com bastante capricho e gosto.
Não sou aventureira gastronômica e tenho paladar tradicional e ainda por cima, de pobre. Não gosto de comidas nem do oriente, nem do meio oriente. Mas, na culinária árabe aprecio a esfirra, a cafta, e o kibe (já comi até o kibe nai e gostei). Sendo assim, não sou a pessoa indicada para avaliar, mas já tendo experimentado as esfirras do Kamilus, ainda prefiro as que faz a Alessandra.
Também morei uns 4 ou 5 anos no interior de São Paulo, onde conheci pratos como brochola, joelho,cuscuz paulista e outros, que aprendi a apreciar e dos quais sinto saudade gustativa.
Em que cidade ou região você morou em São Paul, Helga
Jorge
Aquele chopp era tudo de bom né?
Eu amo chopp e bebo raramente, mas conheci aqui no RJ a Casa do Alemão que possui um chopp encorpado e saboroso, chego a beber em goles largos, algo pra matar a sede mesmo!
Não deixando de falar evidente do seu famoso croquete e sua fiel companheira: a mostarda escura...lá vamos nós para outro assunto culinário...
... "em domicilio"...
Fui morar numa pequena cidade chamada Itajobi. A cidade maior e mais conhecida próxima é Catanduva.
Foi colonizada por alemães (está aí a explicação porque fui parar lá), italianos e sírios(olha a esfiha aparecendo de novo)- risos.
Helga
Alessandra, esse comentário sobre o rio Uruguai, eu o fiz de brincadeira. Numa dessas gincanas "culturais", realizadas em restaurantes, e da qual participava com um pequeno grupo (minha segunda ex-, seu filho, meu filho, namoradas, etc...), caiu a pergunta: "Qual o nome do rio que separa o Brasil da Argentina?". E ninguém tinha a menor idéia. Foi quando fiquei sabendo: Rio Uruguai!!!
Por essas e outras, descobri também que Ouagadougou é a capital de Burkina Faso, e que "sericicultor" é aquele que cultiva bichos-da-seda!!! Daí em diante, minha vida mudou radicalmente...
Quanto ao portador da sfiha, kibes e similares, não vai faltar. Embora meus pais não mais sejam vivos, sou de Terê, onde cresci e onde ainda mora meu irmão +velho!!
Valeu o oferecimento!!
Abs.
Paulo (Bouhid)
Ah, Helga. Você havia comentado que chegou ao blog porque era amiga de uma amiga da irmã do blogger. Agora estou deduzindo que a amiga da amiga também deve ser de Itajobi (cidade muito agradável) ou de Catanduva, onde residi alguns anos. Agora só falta descobrir que amiga e que amiga da amiga. rs
Babei ... !
Ontem mesmo um dos meus filhos trouxe esfirras de boi ralado do BAR do ELIAS, divinas, maravilhosas, das melhores que conheço.
O BAR do ELIAS é bem próximo do Teatro Municipal, Rio de Janeiro. Super recomendo.
ITALIA, boa viagem !!! Ufa !!!
Adoro esfihas, em especial as de carne.
Essas da receita parecem saborosas, mas ainda não tenho experiência suficiente para eleger uma "melhor de todas".
Quando frequentava a rua Senhor dos Passos andei experimentando algumas de queijo, além dos doces e kibes, óbvio!
De momento, por morar em Niterói dou preferência às de carne do Kamilu's.
<:o) Freddy
As esfirras do Kamilu´s não são tão gostosas quanto as do ELIAS, para o meu gosto. E as kafkas grelhadas ... schlept !!!!
No Rio também tinha as esfirras do BEIRUTE, na Rua da Assembléia, mas infelizmente, depois de tantas décadas, fechou há 3 meses.
PS : pena a Costa do Marfim sair.
Triste notícia essa do fechamento do Beirute Café, que eu frequentava esporadicamente.
O Pinguim de Ribeirão Preto eu conheci numa curiosa situação. A finada Soletur já estava na fase de hospedar as pessoas longe do centro das cidades, deixando-nos isolados. Chegamos por volta das 21:30. O guia e os participantes da excursão decidiram que seria melhor descansar pois era o último pernoite de uma longa excursão. Eu e Mary então pedimos na recepção um táxi e fomos, só nós 2, ao Pinguim (corrida de uns 20min), pois ir a RB e não visitar o Pinguim (original) é como ir a Roma e não ver o Papa! Valeu!
Copa: torci muito por Uruguai (nada contra italianos, muito pelo contrário) e pela eliminação da Costa do Marfim, portanto roí as unhas na hora do penalty a favor da Grécia.
Nigéria deve dançar amanhã, Argélia também deve ficar pelo caminho e Gana... Bem, se algum africano merece permanecer é Gana, mas acho que EUA x Alemanha vão fazer jogo de compadres.
Teremos então uma Copa América com alguns convidados, que provavelmente estragarão a festa (rs rs).
<:o) Freddy
Alessandra,
Obrigado por sua contribuição ao blog, com uma receita útil, de guloseima que agrada a muita gente, e que despertou lembranças e sugestões de locais onde se come bem este e outros pratos da culinária sírio-libanesa.
Volte sempre, comentando ou com posts. O espaço estará sempre disponível.
Jorge
Agradeço mto o seu carinho e de seus leitores ao ler, comentar e algumas vezes me ajudar com o desconhecido.
É sempre um prazer vir aqui.
Segundo o Trip Advisor (http://www.tripadvisor.com/), o Rio de janeiro, e muito menos Niterói, não tem nenhum restaurante entre os mais bem avaliados no mundo.
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