"Jovem
Dama": obra autenticada por quatro das maiores autoridades em Da Vinci
pode ser chave para "código" da vida real.
A NOVA MONA LISA
Prof. Átila Soares da Costa Filho
Uma conferência em Roma
no início deste janeiro - no mesmo ano que marca o 500º aniversário da morte de
Leonardo da Vinci - deve marcar a história da arte com mais polêmica sobre o
maior gênio de todos os tempos. Sob a condução de Silvano Vinceti, presidente
do "Comitato per la Valorizzazione dei Beni Storici, Culturali e Ambientali"
da Itália, o evento propõe acrescentar, aos clássicos retratos executados pelo
mestre, uma graciosa pintura medindo 61,5 × 54,5 cm. Estamos falando da
"Jovem dama com casaco de pele", um curioso óleo sobre madeira de
álamo executado entre 1495 e 1499.
Sua origem nos leva a
Milão, enquanto Da Vinci estava a serviço de Ludovico, o Mouro, (1495-1499). Da
coleção do cardeal Luigi d'Aragona (1500), segue à do Papa Inocêncio XII e a do
Bispo de Otranto (Domenico Morelli) em 1700. Já em 1850, vai para Milão, a
integrar a coleção do Marqués Moramarco. No início do século XX, chega à
Alemanha através de uma família industrial e em 1975 é vendida para outra
família do mesmo ramo da qual pertence seu atual proprietário. A obra já teve
sua chancela declarada por quatro das maiores autoridades reconhecidas em Da
Vinci: o historiador Adolfo Venturi (já em 1921), os professores Ernst Ullman e
Carlo Pedretti - provavelmente o maior especialista em Da Vinci de todos os
tempos -, e o próprio historiador Silvano Vinceti, mais recentemente em 2018.
Embora em muito boas condições de preservação, a "Jovem dama com casaco de
pele" chegou a se submeter a uma leve restauração em 1977 pelas mãos dos
especialistas Henning Strube e Beate Strube-Bischof. Atualmente, o óleo está
alojado em um cofre suíço. Notar que a pintura se faz explicitamente
relacionada a duas das obras mais conhecidas de Leonardo, "Dama com um
arminho” e a "Mona Lisa" - ou "Gioconda".
O significado. Mais do que uma bela imagem
feminina, a pintura nos chama a refletir sobre um dos maiores interesses
temáticos de Leonardo: a busca de um ideal de beleza maior que residisse no
princípio dual - ou "dos opostos" - nas coisas. Esta questão do
dualismo nos remete a Heráclito de Éfeso (535-475 aC) e seus pensamentos sobre
o cosmo e o Uno, o devir e a harmonia. Também os estudos sobre Fibonacci e a
proporção áurea, a força do equilíbrio simétrico, viriam a ser de singular
importância nas composições do gênio. Em particular, na iconografia Da Vinci
que aborda o tema da maturidade versus a juventude, vemos alguns exemplos de
como tais implicações filosóficas o seduziam.
Assim,
de acordo com análises comparativas entre a desgastada "Mona Lisa" e
várias de suas jovens e idealizadas mulheres - tão presentes também nas obras
de discípulos -, “Jovem Dama” seria apenas um contraponto para seu maior ícone.
Aqui, este efeito é claro, onde é evidente a representação de um
rejuvenescimento da "La Gioconda". Notar também que o tipo de cabelo
é o mesmo em ambas, assim como há um forte elemento circunstancial: a presença
de cosmético labial na jovem Lisa (Gherardini), o que só vem corroborar a
relação direta entre as duas versões e o confronto de suas idades. Em plenos
séculos 15 e 16, o uso desses materiais de tons avermelhados em mulheres
maduras - portanto, reservadas - era extremamente inadequado. Inclusive, vários
estudos para restaurar as cores originais da "Gioconda" mostraram que
seus lábios não seriam muito mais rubros do que parecem atualmente. A
"Mona Lisa", enfim, para Leonardo, só deverá existir se houver uma
contraposição que a equilibre: uma “Jovem Dama”. Com ela o mestre poderá melhor
exercer suas reflexões sobre uma realidade invisível, maior, onde os opostos
orquestram o movimento da História e de toda a Criação.
Uma conferência em Roma
no início deste janeiro - no mesmo ano que marca o 500º aniversário da morte de
Leonardo da Vinci - deve marcar a história da arte com mais polêmica sobre o
maior gênio de todos os tempos. Sob a condução de Silvano Vinceti, presidente
do "Comitato per la Valorizzazione dei Beni Storici, Culturali e Ambientali"
da Itália, o evento propõe acrescentar, aos clássicos retratos executados pelo
mestre, uma graciosa pintura medindo 61,5 × 54,5 cm. Estamos falando da
"Jovem dama com casaco de pele", um curioso óleo sobre madeira de
álamo executado entre 1495 e 1499.
Sua origem nos leva a
Milão, enquanto Da Vinci estava a serviço de Ludovico, o Mouro, (1495-1499). Da
coleção do cardeal Luigi d'Aragona (1500), segue à do Papa Inocêncio XII e a do
Bispo de Otranto (Domenico Morelli) em 1700. Já em 1850, vai para Milão, a
integrar a coleção do Marqués Moramarco. No início do século XX, chega à
Alemanha através de uma família industrial e em 1975 é vendida para outra
família do mesmo ramo da qual pertence seu atual proprietário. A obra já teve
sua chancela declarada por quatro das maiores autoridades reconhecidas em Da
Vinci: o historiador Adolfo Venturi (já em 1921), os professores Ernst Ullman e
Carlo Pedretti - provavelmente o maior especialista em Da Vinci de todos os
tempos -, e o próprio historiador Silvano Vinceti, mais recentemente em 2018.
Embora em muito boas condições de preservação, a "Jovem dama com casaco de
pele" chegou a se submeter a uma leve restauração em 1977 pelas mãos dos
especialistas Henning Strube e Beate Strube-Bischof. Atualmente, o óleo está
alojado em um cofre suíço. Notar que a pintura se faz explicitamente
relacionada a duas das obras mais conhecidas de Leonardo, "Dama com um
arminho” e a "Mona Lisa" - ou "Gioconda".
O significado. Mais do que uma bela imagem
feminina, a pintura nos chama a refletir sobre um dos maiores interesses
temáticos de Leonardo: a busca de um ideal de beleza maior que residisse no
princípio dual - ou "dos opostos" - nas coisas. Esta questão do
dualismo nos remete a Heráclito de Éfeso (535-475 aC) e seus pensamentos sobre
o cosmo e o Uno, o devir e a harmonia. Também os estudos sobre Fibonacci e a
proporção áurea, a força do equilíbrio simétrico, viriam a ser de singular
importância nas composições do gênio. Em particular, na iconografia Da Vinci
que aborda o tema da maturidade versus a juventude, vemos alguns exemplos de
como tais implicações filosóficas o seduziam.
Assim,
de acordo com análises comparativas entre a desgastada "Mona Lisa" e
várias de suas jovens e idealizadas mulheres - tão presentes também nas obras
de discípulos -, “Jovem Dama” seria apenas um contraponto para seu maior ícone.
Aqui, este efeito é claro, onde é evidente a representação de um
rejuvenescimento da "La Gioconda". Notar também que o tipo de cabelo
é o mesmo em ambas, assim como há um forte elemento circunstancial: a presença
de cosmético labial na jovem Lisa (Gherardini), o que só vem corroborar a
relação direta entre as duas versões e o confronto de suas idades. Em plenos
séculos 15 e 16, o uso desses materiais de tons avermelhados em mulheres
maduras - portanto, reservadas - era extremamente inadequado. Inclusive, vários
estudos para restaurar as cores originais da "Gioconda" mostraram que
seus lábios não seriam muito mais rubros do que parecem atualmente. A
"Mona Lisa", enfim, para Leonardo, só deverá existir se houver uma
contraposição que a equilibre: uma “Jovem Dama”. Com ela o mestre poderá melhor
exercer suas reflexões sobre uma realidade invisível, maior, onde os opostos
orquestram o movimento da História e de toda a Criação.
O Prof.Atila Soares da Costa Filho é designer, especialista em História,
Antropologia e Filosofia e autor de “A jovem Mona Lisa”, “Leonardo e o Sudário”
e co-autor de “Leonardo da Vinci's Mona Lisa: New Perspectives”.
8 comentários:
O autor da postagem, Prof. Átila Soares da Costa Filho tem, entre outras, as seguintes qualificações:
Possui graduação em Desenho Industrial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1996), e pós-graduação em História da Arte pela UGB, Volta Redonda (2008), em Filosofia e Sociologia pela FACEL, Curitiba (2011), e, ainda, em História e Antropologia pela Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro (2016). Tem experiência na área de Artes, Filosofia e Sociologia.
Agradeço penhorado o privilégio que me concedeu de publicar esta didática análise sobre um dos maiores gênios e uma das mais icônicas obras da pintura artística.
Confesso minha ignorância no assunto .... desconhecia ser "um dos maiores interesses temáticos de Leonardo: a busca de um ideal de beleza maior que residisse no princípio dual - ou "dos opostos" - nas coisas".
Pois é, Riva.
Também eu. Daí a importância de termos o privilégio de contar com um estudioso na matéria postando neste modesto espaço virtual.
Minha ignorância já é conhecida pelo Prof. Átila. Vezes sem conta cometo heresias artísticas em comentários irreverentes em postagens do grupo "Gold master um latin america collections".
E ainda confesso com a cara mais deslavada. 🙄🙄🙄
Admitir a ignorância em determinadas matérias, reconhecer as limitações culturais, se e quando acompanhadas de ações e esforços que visem corrigir a insuficiência é o caminho indicado. Ou não?
Quanto mais aprendemos maior é nossa percepção, do quanto desconhecemos.
A cidade de Paris etá no Top 10 das mais visitadas no mundo. O Museu do Louvre está no Top 10, dos pontos turísticos/culturais da cidade. E a tela Mona Lisa (Gioconda) está seguramente entre as 10 mais procuradas e visitadas no museu.
Você pode até se decepcionar com as dimensões do quadro ou com a (falta de) emoção que proporciona, como se ouve aqui e ali, mas é inesquecível. Aquele sorriso ...
A Monalisa foi uma grande decepção para mim, defronte a ela ... realmente não me passou nenhuma emoção de estar ali.
Outra, que acho já relatei, foi o Coliseu de Roma. Mal cheguei na rua contemplando a estrutura, esmaecida, falei ...tem certeza que é o Coliseu ?
E internamente muitas obras, operários, andaimes, difícil conseguir uma visão bacana do local. Tb foi meio "broxante".
Pelo que depreendi do texto, não se trata de um mero estudo da Pintura de Da Vinci.
E uma análise do que há por trás das telas. A alma do artista, com sua dualidade e simetria, além dos simbolismos nos detalhes dos quadros.
Excelente texto do Prof. Átila.
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