Por
RIVA
Uma leitura sobre o diálogo (aberto e sincero) entre um
historiador ateu, intelectual público capaz de ver a poesia e a beleza das
religiões, e um padre que crê, mas que como Jesus, dizem (sic), contempla a
humanidade do pecador, e que não se encastela na torre inexpugnável e hermética
da virtude como ponto de julgamento do mundo. Uma leitura sobre o diálogo entre
Leandro Karnal e o Pde. Fábio de Melo intitulado CRER ou NÃO CRER, à disposição
nas livrarias – abreviarei-os por LK e FM.
No meu post vou apenas
destacar tudo que marquei na leitura desse livro, com alguns comentários ao final (na verdade o
objetivo mesmo é que cada um expressasse o que pensa sobre cada anotação).
Sim, como já escrevi anteriormente, ainda não abro mão dos
livros tradicionais em papel (a Mãe Natureza que me perdoe), gosto de folhear,
rabiscar, marcar passagens, fazer anotações nas inexplicáveis últimas páginas
em branco para pesquisas posteriores, gosto de cheirar os livros. E se não
existe possibilidade de releitura ou empréstimos, esqueço-os nas poltronas dos
ônibus e catamarãs, com um bilhete desejando uma boa leitura.
Vamos aos destaques :
LK : Parece que Deus fala exatamente o que as pessoas querem
ouvir... e o mesmo fazem seus emissários.
FM : Tenho dificuldade em acreditar em um Deus que negocie
favores. Alguém promete que atravessará uma passarela de joelhos para que Deus
lhe conceda um favor. Há um equívoco por trás dessa compreensão.
LK : Jesus é legal, o que ferra tudo é o fã-clube.
FM : Por que a a fé não aceita o silêncio ? É uma
característica do Ocidente ? Não há necessidade de falar, fazer pregações.
Seria mais honesto ensinar a reverência, a contemplação.
LK : Quando passei por uma situação de risco de morte, fiquei
curioso se eu apelaria para uma oração.. Não aconteceu. Quando vi meu pai num
caixão, também imaginei que seria um momento no qual a fé poderia tentar
voltar, como memória daquele homem tão católico que eu amava. Não rezei e tive
a certeza de que ali acabava tudo. Meu pai existiria apenas em fotos e na
lembrança do bem que fez.
LK : Padres quase sempre viram pessoas ressentidas, amargas e
sem alegria interna.
FM :Concordo com você sobre isso ... frequentei o meio
acadêmico e a desilusão que vi por lá é muito semelhante à que vi nos
bastidores da Igreja. O amargor quando revestido de arrogância amarga ainda
mais.
Pio IX |
FM : Sim, crer na reencarnação é um obstáculo à crença na
ressurreição. Não é possível ser católico e kardecista. É um ou outro !
FM : Eu n nunca me senti atraído pela idéia de um Deus atrás
de um balcão negociando milagres. Acreditar que Deus necessite de nosso
sacrifício voluntário para nos conceder graças é no mínimo atribuir a Ele um
desequilíbrio emocional.
LK : O Nélson Rodrigues falava que, quando um imbecil se acha
solitário, ele sai à rua e encontra outro idiota. Como não estava mais sozinho,
ele passava a se perceber como maioria.
FM : Eu creio na proteção divina, mas olho para os dois lados
antes de atravessar a rua. Eu não preciso abrir mão da minha inteligência para
crer como creio. E, quando me deparo com algum aspecto que considero nebuloso,
eu optp por contemplar, em vez de responder. Se um dia o esclarecimento chegar,
tudo bem ; se não, sem problemas, sigo assim mesmo, pois eu já tenho o
essencial.
Céu |
FM : sobre o CD de poemas da Adélia Prado, que é um registro
do livro Oráculos de maio .....
aquilo me arrebata sempre que ouço. Eu não sei explicar, mas sou assim desde
menino, a arte me toca profundamente. As paredes me falavam mais sobre Deus do
que as pregações dos padres. O órgão, a música, tudo sensibilizava minha alma.
A música me ajudou muito. Já quebrei muitas vezes a dureza da realidade com a
música. E preciso sensibilizar minha alma diariamente. Sou assim, faz parte da
minha constituição humana a necessidade de buscar o que me toca, me emociona.
Adélia Prado |
FM : Às vezes, por necessidade pastoral, tornamos a missa um
acontecimento duro, didático, cansativo. Sobra pouco espaço para o silêncio.
Abandonamos muito da simbologia tradicional. Quisemos ser modernos, mas não
medimos as consequências ou o prejuízo que essa decisão poderia trazer.
LK : Sartre disse que o judeu é uma invenção do antissemita.
O herege é uma invenção do ortodoxo. O que significa isso ? A cultura dominante
determina numericamente, o mainstream
estabelece o espaço e o gueto em que o outro vai ter que se enquadrar.
LK : “Se você é ateia, o que vai fazer se tiver câncer?”.
“Vou fazer quimioterapia.” “ Mas, e se não der certo?”. “Eu vou morrer como a
senhora.” Enfim, quando a morte for, eu não serei ; enquanto eu for, a morte
não será.
LK : Como diz Fernando Pessoa num lindo poema, se quiser se
matar, se mate. Tens medo do desconhecido ? Ninguém conhece nada (risos). Achas
que vais fazer falta ? Duas vezes por ano, aniversário de vida e aniversário de
morte, e cada vez menos. Então se quiser se matar, se mate !
FM : Luto para ser cristão, diariamente. A vida cristã me
oferece um amparo existencial diante da impermanência das coisas. Esse amparo
me chega pela mística do desprendimento. A morte me faz inevitavelmente pensar
nas pretensões que carrego. E assim ela pode me simplificar. Vivo morrendo, mas
sob a dinâmica da ressurreição. Do wu que sou nascem outros. Eu lido com aquilo
que é permanente em mim, mas o tempo todo eu preciso experimentar a
impermanência do permanente. Eu antecipo o meu morrer quando morre alguém
próximo de mim.
FM : Acho o velório um acontecimento absolutamente mórbido.
Expor um corpo em sua indigência final pode nos dificultar uma visão positiva
da morte.
LK : Mas curiosamente foi essa “piedade barroca” que produziu
em Évora, na Capela dos Ossos , a célebre inscrição “Nós, ossos que aqui
estamos, pelos vossos esperamos.”
FM : Mia Couto diz que “morto amado nunca para de
morre.” É verdade. O amor nos coloca na
dinâmica de um morrer que nunca termina. Nem tudo pode ser sepultado. Fica
eternamente em nós. Fica vida na expressão da memória, mas também fica morte.
Na morte do outro, morremmos também. Quanto do outro que morreu está morrendo
também em mim ? Interessante pensar sobre essa abrangência da morte.
LK : Nós não vemos nenhumdocumento absoluto de que Jesus
tenha existido historicamente, fora os Evangelhos e uma passagem muito obscura
– e de provável inserção posterior – no Flávio Josefo.
Sobre a imagem de Michelangelo no teto da Capela Sistina, de
Deus criando o homem :
LK : Os dedos não se tocam. Adão estica a mão e ... para o
religioso que vê da direita para a esquerda, é Deus criando o homem. FM : E o
historiador vê da esquerda para a direita, o homem criando Deus.
FM : Somos afeitos às questões humanas. Não fugimos dos
desconfortos que elas nos provocam.
Comentário final : um diálogo muito interessante.
Recomendo para quem quiser a leitura completa, para muita reflexão, debate, mas
com certeza sem conclusões sobre certo e errado. Isso não existe. O que existe
é o que conforta cada um de nós. Cada um é cada um, como disse recentemente o
falecido Chorão, vocalista da banda Charlie Brown.
Para quem quiser, o Pub está aberto, sem horário para fechar.
“James, mais um por favor.”
Nota do editor: este blog tem um nome, digamos, mal comparando, uma razão social (Generalidades especializadas), mas tem um nome fantasia, criado no decurso do tempo através de um debate entre os frequentadores/debatedores mais assíduos. O nome fantasia é "Pub da Berê", daí porque o autor da postagem o menciona no último parágrafo. James é o nosso garçom. Alguns o tratam por Jimmy.
5 comentários:
Caro Riva,
Já me manifestei em dois posts mais ou menos recentes, com todo respeito:
https://jorgecarrano.blogspot.com.br/2017/10/filosofos.html
https://jorgecarrano.blogspot.com.br/2017/10/filosofos-para-que-servem.html
Riva,
Acho que você terá que fazer com seus textos publicados aqui, o mesmo que faz com livros já lidos. Deixar no catamarã, ou no ônibus, ou no banco da praça.
Como o meio aqui é digital, será necessário imprimi-los.
Perdemos por completo nossos leitores/debatedores. Escafederam-se.
Gostei de ver essa comparação do professor da Usp (materialista) com o padre (espiritualista). Você conseguiu me deixar interessada, Riva.
Quanto a leitura de modo geral, por conselho médico, havia desapegado da maioria dos meus livros, porém esta semana me rendi à tentação e adquiri 10 exemplares numa Feira de Livros.
O comentário que fiz (similar ao publicado pelo Riva) que ando me afastando da mídia é provavelmente o motivo deste meu retorno aos livros tradicionais.
Ah! O Padre Fábio é tão tão TDB que só me faz pecar. Ashuashuashua
Kayla não sossega !! kkkkkkkkkkkkkk...ayla !
Ana Maria, bem vinda de volta aos livros (bons, rsrs).
Carrano, faça uma pesquisa sobre que assuntos os usuários do Pub querem ler...vamos ver quantos participam da pesquisa.
Postar um comentário