26 de janeiro de 2015

O que aprendi sobre vinhos


Levei muitos anos recusando vinho sob alegação que me dava dor de cabeça. Pudera, que vinhos me ofereciam argh!

No seio da família materna, avó e as primeiras tias nascidas Tràs-os-montes, casadas estas com portugueses, bebiam vinho da "santa terrinha", que compravam em garrafões ou a granel em importadoras que os tiravam de toneis.

Sabem o que diziam? Que eram vinhos "rascantes". Não me sabiam bem, para o dizer como eles.

Passados muitos anos, quanta bobagem reproduzi, por pura ignorância. Pior, louvado em palpites e comentários de outros igualmente ignorantes, aqui no sentido de desconhecedores.

Até que um dia, em São Paulo, jantando com um empresário, ele pediu um Bordeaux. Neste dia fui a presentado à bebida. Poderia ter dito: com que então isto é que o vinho tão falado? Amor a primeira vista.

A vantagem de ter feito um rápido curso sobre vinhos, na Associação Brasileira de Sommeliers, já nos anos 1990, foi aprender algumas coisas das quais nem suspeitava.

Querem um exemplo, desde já? Existe, mais raro, mas igualmente saboroso, o vinho do Porto branco. 

Va lá, antecipo mais um aprendizado. O vinho não é branco porque feito com uvas verdes. Inclusive, e aí me surpreendi, os famosos brancos espumantes, da região de Champagne, são feitos com um blended - na área de vinhos diz-se corte - de castas, inclusive duas tintas.

Sim, eu disse vinho branco espumante, porque o Champagne, denominação privativa dos espumantes produzidos na região de mesmo nome, localizada no nordeste da França, nada mais é do que um vinho branco que fermentou duas vezes.


Esta maneira de abir deve ser usada excepcionalmente

Devem ser produzidos, obrigatoriamente, apenas com as uvas chardonnay, pinot noir e pinot meunier. As duas últimas tintas.

A base dos espumantes, em geral, é um vinho branco, feito a partir de cepas que combinadas, harmoniosamente, e que duplamente fermentado resulta no precioso líquido, a rainha das bebidas, que se presta a vários momentos da vida, com variada gama de pratos, antes ou após as refeições, com doces ou salgados.

Isso eu não sabia. Como não sabia que a coloração do vinho, que permite classifica-los como tintos, rosés e brancos, depende do tempo de contato das cascas das uvas utilizadas durante a fermentação. 















Sim, diferentemente das azeitonas que nascem verdes e ficam pretas, numa mesma árvore, não existindo pés distintos onde se colhe azeitonas verdes e outros nos quais se faz colheita de pretas, existem vitis vinifera que produzem frutos verdes e outras que produzem uvas tintas.

Dentre as coisas mais triviais que aprendi, citaria a questão da temperatura de serviço. Dizer que um vinho tinto deve ser servido em temperatura ambiente, não é uma verdade absoluta.

É como dizer que antes de “p” e “b” só se escreve “m”. Lembram destas lições de português?  Se você tem mais de 50 anos deve ter ouvido isto da professora. Péssimo enunciado.

Como ficariam as palavras deplorável, antipático e estúpido?

Então coloquemos as coisas nos seus devidos lugares. Se você está num local, numa cidade, com a temperatura girando entre os 15 e 18 graus certamente poderá degustar seu tinto sem precisar assusta-lo.

Vinhos não devem ser servidos com temperatura acima de 18 graus e os tintos  abaixo de 8 porque perdem muito de seu bouquet.

Mas hoje, aqui em Niterói, com a temperatura oscilando entre 35 e 40 graus célsius, o vinho precisa ser refrescado para poder ser melhor saboreado.

Bem, se vocês  tiverem uma adega climatizada, como eu, graças aos meus filhos que me presentearam, é fácil manter o vinho numa temperatura  boa para consumo. Basta programar o termostato.

Ainda assim resta um probleminha. Como a minha adega é pequena e de poucos recursos, os vinhos brancos ficam em temperatura um pouco acima do ideal para degustação.

Esta foi outra coisa que aprendi e depois de testar assumi como verdadeira: os vinhos brancos devem ser servidos em temperatura mais baixa do que os tintos.

A temperatura exata, para uns e para outros, é objeto de  algumas controvérsias,  mas nada muito significativo. Há uma faixa dentro da qual tudo correrá bem.

A faixa mais aceita varia entre 11 e 18 graus, para os tintos, a depender de características: se o vinho é jovem (11 a 14), se encorpado (15 a 17) ou se reserva (16 a 18).

Para os brancos: leves e doces 6 a 8 graus; meio seco ou encorpado 7 a 10, e se bem encorpado 10 a 12 graus de temperatura.

Espumantes: entre 6 e 9 graus, e se for brut 6 a 12. O rosé entre 7 e 10 graus vai muito bem.

Mesmo os vinhos fortificados, tipo Porto, sabem melhor quando servidos em temperatura máxima de 18 graus. Se for branco entre 8 e 12 graus.

Se você vai usar um balde de gelo, coloque igual porção de água e, num primeiro momento, coloque a garrafa enfiada pelo gargalo. Os paulistas diriam de ponta cabeça.



Depois vire-a,  de sorte a conseguir uniformidade na temperatura que fica mais distribuída. Ter um termômetro ajuda.

wine saver
Depois de aberto se não vai consumi-lo todo naquela refeição ou momento, coloque um wine saver tipo vacu vin e volte com ele para o refrigerador.

Aprendi algumas outras coisas, interessantes, históricas e culturais. Algumas lendas como a que atribui à cordilheira dos Andes o papel de barreira natural que impediu a chegada  no Chile do pulgão conhecido como phylloxera, praga que dizimou as plantações de viníferas na Europa.
Vitis atacada pela  phyloxera


Bem, tem a questão do formato e tamanho das diferentes taças e suas adequações a este ou aquele tipo de vinho.

E a maior de todas as bobagens, repetidas ad nauseam, o vinho quanto mais velho melhor.

Outro dia explico e falo de outras dicas que podem nos tirar de desconfortáveis situações tal como não saber o que fazer com a rolha, apresentada em um pequeno prato pelo garçom. As vezes ele simplesmente pousa na mesa ao seu lado. E fica aguardando.

Se quiser leva-la para casa, para a coleção que fica num jarro de vidro transparente ou outro recipiente qualquer (que já tive), faça-o depois do ritual esperado.

Não vou falar sobre o vocabulário, o dialeto dos experts. Apendi o que é mosto, vindima, champenoise, charmat, estas coisas. A terminologia utilizada nas degustações passa muito de cem verbetes, segundo dois dos mais festejados conhecedores de vinho aqui no Rio de janeiro: Danio Braga e Celio Alzer.


Notas do editor:
1) imagens tiradas no Google
2) Tenho um opúsculo, adquirido na ABS, que tem por título "Tradição, Conhecimento e Prática dos Vinhos", de autoria dos dois experts mencionados no texto.
3) O blog já publicou vários posts sobre vinho, cultivo, degustação etc. quase todos da lavra do confrade Carlos Frederico (Freddy). Alguns poucos eu mesmo ousei. A dica para acessa-los é simples: na janela de busca (desenho da lupa), dentro do blog, escreva, por exemplo, "vinho".

2 comentários:

Freddy disse...

Bom resumo, poderia ser chamado academicamente de Vinhos 101.

No entanto, permita-me observar que não é por ser Bordeaux que o vinho é melhor ou pior. Provavelmente lhe foi servido um bom Bordeaux.

Eu achei no mercado Borgonhas de 50 reais. Será que são bons? Um Don Melchor é chileno, não é Bordeaux e é bom pacas, para citar um que ambos conhecemos (caríssimo).

Vinho ser gostoso ou não depende de muitos fatores, infelizmente o mais importante deles é o preço...
<:o)

Jorge Carrano disse...

Pois é, Carlos Frederico, o bordeaux ao qual me referi não era um grand cru, mas era um AOC. Não lembro a qual era a appellation, até porque na época não tinha importância para mim. Como mencionei era absolutamente ignorante em matéria de vinho (agora sou parcialmente).
Então era, digamos, um bordeaux respeitável. Não era, definitivamente, um vin de table ou sequer um vin de pays.