3 de março de 2014

Carnaval no Quitandinha - II









Por
Carlos Frederico March
(Freddy)













Palácio Quitandinha, Petrópolis/RJ

Por conta de comentários ao meu post anterior, resolvi fazer um adendo. Decerto que o Carnaval foi a motivação maior do texto, mas como já disse, os bailes (matinês) ocupavam apenas parte de nosso tempo de lazer. Eu participava de uma turminha boa, formada por garotos e meninas que vinham praticamente todo ano naquela época. Que me lembre, também nos hospedamos em algumas épocas diferentes de Carnaval, mas não foram significativas. 
Minto... Foi em outubro de 1963 que houve um "turning point" em minha vida, e foi lá em Petrópolis. Estávamos no Restaurante Falconi, almoçando, durante uma hospedagem dessas fora de época no Quitandinha. Bem ao lado tinha um quiosque, onde eu ficava que nem cachorro em frente de máquina de assar frango, "namorando" as novidades importadas. Naturalmente acabava ganhando algo, como uma lanterna tricolor (argh), que usei por muito tempo em minhas brincadeiras solitárias no hotel. Sim, nem sempre eu brincava com a turma, preferia "explorar" os recantos daquele imenso hotel, cheio de corredores misteriosos.

Pois naquele 12 de outubro de 1963 eu perguntei a minha mãe o que eu ia ganhar de Dia das Crianças, e a resposta foi um seco "- Nada!". Espantado, quis saber o motivo.
"- Você não é mais criança!"
Assim, sem maiores explicações. Jamais me esqueci...

O Quitandinha me marcou também porque foi o palco do início da maior crise de nossa família. Mamãe havia acabado de ter o descolamento de retina (1958) que a acabaria cegando paulatinamente, e todo o drama foi se desenrolando a cada ida (até 1963). Tristeza, lágrimas, infelicidade e torturante angústia eram o pano de fundo desses carnavais. A cada ano a certeza da tragédia se infiltrava dentro de nós (ou de mim) e mesmo quando nossos avós maternos eram acompanhantes em um apartamento vizinho, só iam para tentar aplacar o lento definhar de minha mãe. Sem resultado...  
Até hoje não sei se paramos de ir ao Quitandinha por causa de ter de alugar os apartamentos dos novos proprietários em esquema de temporada (consultem post anterior), ou se foi porque minha mãe desistiu de frequentar um local amado que jamais poderia ver novamente. Ou um mix dessas duas realidades, uma financeira e outra emocional.

Falando de coisas boas, marcou-nos intensamente a era pré-Beatles, com matinês dançantes ao som dos novos ritmos, como cha-cha-chá, hully-gully, rock'n’roll (aquele tradicional da era Chubby Checker e Elvis). Cercados dos filhos de pessoas da alta sociedade carioca e da TV, apesar de sermos joão-ninguém, conseguimos curtir bastante. Creio que nesse aspecto Riva se deu melhor que eu.  
Como disse mais acima, quando falei da lanterna tricolor que ganhei de presente, era muito comum ver-me solitário andando pelos recantos obscuros dos salões ou na margem do grande lago, brincando com as canoas e pedalinhos ancorados. A tragédia familiar me assolava e eu, sem maiores armas para lidar com a desgraça que se abatia sobre nós, preferia me esconder num mundo de fantasia. Há quem diga que nunca mais saí dele... Papo para os psicólogos de plantão.

O Grande Lago, com formato do mapa do Brasil;  farol à esquerda.

Portanto, ao escolher como tema "Carnaval no Quitandinha", na verdade quis remontar às experiências passadas àquela época, da qual as matinês carnavalescas foram apenas desculpa para abordar experiências marcantes daquele momento de minha infância e pré-adolescência. 
Na falta de imagens da época (para desgosto do blogueiro, que anseia por fotos de minha primeira namoradinha), posto apenas fotos de minhas recentes visitas ao palácio, do qual guardo esse intenso mix de lembranças boas e ruins, que afinal são parte de minha vida.

Mary e Flávia no acesso ao “Salão do Eco”


Mary no imenso Salão Mauá, o “Salão do Eco”


Traseira do Quitandinha, com Torre e cúpula do Salão Mauá

Cabe um comentário sobre a Torre. Segundo constava na época, era onde rolava o jogo apesar da proibição oficial. Se era verdade ou mentira, não fiquei sabendo pois éramos, como menores de idade, proibidos de subir até lá! Mistééério!!

Setor do Grande Teatro (1500 lugares), paramentado para um casamento


Teatro 2, para bingo ou discoteca



A temida piscina térmica, mais de 3m de profundidade

Salão de convenções, já foi de jogos no passado...

Renata no lobby do Hotel; ao fundo Sala Dom Pedro


Uma lembrança curiosa do passado é o cheiro dos elevadores, que tinham um que de mofo talvez pelo couro de sua decoração nos primórdios. O fato é que, quando por mero acaso eu sinto cheiro similar em algum local hoje em dia, minha memória retorna imediatamente ao Quitandinha! Viagem mental no tempo! 
Para fechar, confesso que é um exercício de confiança e coragem permanecer debaixo desses lustres mostrados nas fotos acima!


Nota do editor: as fotos são do acervo do autor do post.

8 comentários:

Jorge Carrano disse...

Continua explícita a preferência pela Renata, que aparece sozinha no lobby do Hotel, enquanto a Flávia só aparece com a mãe.
E a Renata já figurara no post anterior.(rs)

Riva disse...

O post do Freddy é uma pérola para nossas lembranças. Uma pena que para outras pessoas talvez não tenha muitos significados, mas para nós dois, o local realmente foi muito marcante.
Não sei porque achava que o Freddy já tinha escrito sobre o Quitandinha por aqui, e por isso usei a ferramenta de pesquisa do blog, e acabei me deparando com outros posts muito legais, que apenas mencionavam uma coisa ou outra do Quitandinha.

As lembranças são inúmeras. Me impressiona o Freddy precisar as datas ... não tenho a menor idéia dessas datas em que estivemos por lá, e mal me lembrava da presença de nossos avós conosco, no quarto ao lado.Ou talvez o Red Label esteja consumindo minhas lembranças ...

Mas sim, caramba, a lanterna tricolor .... essa foi forte. Aquele brinquedinho era uma festa para nós, nas incursões pelos cantos "proibidos" e escuros daquele gigante que era o Quitandinha. Aquele hotel aos olhos de uma criança era um mundo !
Engraçado, continuo com a impressão que Freddy já escreveu sobre isso tudo, com fotos inclusive ..... estranho ...

Voltando às lembranças principais :
- o argentino (Freddy diz que era espanhol) que me ensinou a jogar xadrez. Fui fascinado pelo jogo durante anos, comprei livros para estudar mais, e aos poucos, o violão tomou o lugar do xadrez.
- também o macarrão com salsichas que papai fazia no fogareiro a álcool, dentro do quarto.
- a cama Dragoflex em que eu dormia, com um medo terrível de decepar meus dedos - a cama era armada e desarmada, e correu o boato de uma criança que perdeu o dedo na dobradura da cama.
- a gaiola gigante, onde entrávamos para brincar, para desespero dos funcionários do hotel
- o concurso de Twist ... meu par foi a Beth Nunes, filha do Max Nunes
- o clubinho que montamos, acreditem, em cima de um gigantesco pinheiro
- a caça aos girinos no lago
- aquele farol era tipo filme de terror para nós, porque faltavam alguns degraus, e por isso era proibido o acesso ao seu topo
- um dos programas da criançada era simplesmente ficar vendo a chegada dos ônibus do Rio, com seus passageiros elegantes. O ônibus entrava na frente coberta do hotel ... um glamour !
- a piscina aquecida era realmente o point da sociedade local, e raramente íamos ali - não sei porque. Mas sei que eu não sabia nadar ... só aprendi aos 14 anos !

Saindo um pouco do hotel, não tem como não falar da LASANHA VERDE que era servida no Restaurante FALCONI. O garçon vinha com uma gigantesca travessa de barro pelo restaurante, perguntando quem queria .... e todos a queriam !

Não tenho lembranças da evolução do problema de mamãe ... nenhuma mesmo. Não sei porque. Meu foco sempre foi brincar, brincar e brincar.
E por isso não tirava boas notas na escola, como a maioria das crianças. Era muito bom em matérias em que apenas necessitava leitura ou "decoreba" , tipo História e Geografia. Nota 6 em Português era 10 pra mim !rsrs.

Sds !

Obs : no momento em que escrevo, o fundo musical é a irritante batida da Padre Miguel .... argh !

Freddy disse...

Riva poderia ter escrito (ainda pode fazê-lo) um post igualmente marcante sobre o Quitandinha, que também fez parte de seu passado e numa faceta um pouco diferente da minha.

Sim, twist! Como esquecer o mais famoso ritmo da época pré-Beatles? O que não faltou foi gente com a espinha dorsal prejudicada pela frenética torção que a dança exigia!

Informações adicionais ao Riva:
- O garçom do Falconi se chamava Mário
- Era bastante curiosa a maneira de servir a famosa lasanha verde, dado que primeiro era assada numa grande bandeja e só então era posta a circular pelo salão; nada de pedidos antecipados!
- Nossos avós não ficaram no quarto ao lado e sim em outro andar; era o resultado de uma logística, dado que eles ocuparam um apto pequeno e nós ficamos num tipo conjugado, quarto e saleta (onde ficavam as camas extras). Eram alas diferentes do hotel.

Informações ao Carrano:
- Fomos, só eu e Mary, ao Quitandinha em 2006. Além de rever a parte comum do hotel (os andares são privados), fiz extenso relato a Mary de minha vida àquela época. Não podem imaginar minha emoção ao fazê-lo “in loco” pela primeira vez!
- Em 2007 fomos com Flávia, e como já tinha um acervo enorme de fotos, acabamos tirando apenas 5 (foi quando o teatro estava paramentado para o tal casamento). Ela só saiu em duas: a que mostrei e outra na frente da Gaiola (que já fora publicada comigo e Renata).
- Em 2008, levamos Renata com o mesmo objetivo das visitas anteriores: mostrar a minha família uma parte importante de meu passado. Só que Renata adora foto e tiramos um monte delas!

Isso explica a falta de fotos de Flávia no local, e parece que está difícil levantar essa pendência... Tive informações recentes de que o SESC-Rio, ao assumir a gerência do palácio, tem feito restrições a visitas e eventos.
Posso testemunhar que em 2006 andei à vontade por toda a parte comum, mas em 2008 o SESC já estava agindo e havia tapumes e limitação de acesso a algumas alas. Como conheço os recantos, andei fuçando pra mostrar tudo a Renata mas fui chamado à atenção por funcionários!
Antes podia-se alugar espaços para eventos, hoje fui informado de que a política atual prioriza atividades do SESC no estado, com isso menosprezando até a comunidade petropolitana.

Essas são informações a confirmar, mas tão cedo não pretendo lá voltar.
Abraço
Freddy

Riva disse...

Acho que o assunto está esgotado, bem rico em detalhes que interessam a quem acessa o blog.

Se eu fosse escrever, não conseguiria acrescentar nada que não fosse pessoal.

Jorge Carrano disse...

Meus caros Freddy (autor do post) e Riva(irmão), ledo engano, o assunto não está esgotado.
Mencionei, aqui e ali, o velho hotel-cassino, mas não lembro de haver utilizado imagens.
Então aguardem. A diferença é que não serão imagens coloridas, fixadas em fotos relativamente recentes, já deste século XXI.
Vou buscar no baú alguma coisa mais antiga, da MINHA infância (anos 1940 e 1950).

Freddy disse...

Abre-te Sésamo!
Aí vem o Baú do Carrano!
Tremei, infiéis!
<:o)
Freddy

Jorge Carrano disse...

Você não imagina o que encontrei no baú. Coisas de Petrópolis. Na verdade não há uma diferença tão grande de tempo entre seus carnavais no Quitandinha e as estadas de minha família por lá.
As imagens que tenho é que são bem mais antigas.
Vai ao ar no horário clássico da chamada meia-noite e meia.Ou aos 30 minutos ada quarta-feira, se preferir.

Riva disse...

errata : no concurso de Twist, meu par foi a BIA Nunes, e não Beth Nunes. Ela realmente é uma das filhas do Max Nunes, e trabalha na Globo tb.