8 de abril de 2024

Direito sucessório, direito autoral, última vontade, testamento

 

Há algum tempo, o amigo, correligionário, seguidor e colaborador deste blog, engenheiro, tricolor carioca, divergente político, ex-cliente em nome próprio e como representante de terceiro, pessoa jurídica, compositor diletante na adolescência, fez-me uma pergunta interessante (como de hábito), quando trocávamos mensagens sobre inteligência artificial.

A pergunta era, pouco mais ou menos, a seguinte: se com uso da inteligência artificial, alguém fizer plágio de uma de minhas composições, como faço em relação aos direitos autorais?

Eu fingi que respondi e ele, gentilmente, deu-se por satisfeito.

Hoje lendo o “Migalhas”, site de conteúdo jurídico, edição 5824 (08.04.2024), instigado com uma matéria que aborda direitos autorais e sucessórios, a um só tempo. 

Tão interessante, que transborda o interesse de operador do Direito indo além, até o cidadão comum, seja ou não autor, deixe ou não obras inacabadas, inéditas, que resolvi publicar aqui, claro como de direito, indicando a fonte:

https://mail.google.com/mail/u/0/#inbox/FMfcgzGxSbrvbCPsjSrrHLHSfmFDqSNz

Último pedido

Imagine que um autor, antes da morte, proíba seus herdeiros de publicarem uma obra inédita. Se essa vontade for ignorada, e a obra se tornar pública, haverá ilegalidade? Virgílio, Franz Kafka, Graciliano Ramos e Gabriel Garcia Márquez foram algumas vítimas dessa ousada decisão. Migalhas ouviu especialistas no assunto. Confira. 

https://mail.google.com/mail/u/0/#inbox/FMfcgzGxSbrvbCPsjSrrHLHSfmFDqSNz

Eis a matéria na íntegra:

Direitos autorais

Entenda se é legal publicar livro proibido por autor antes da morte.

Especialistas comentam caso envolvendo Gabriel Garcia Márquez, e afirmam que publicação post mortem, sem autorização, é mais comum do que parece.

"Este livro não presta, tem que ser destruído". Foram essas as palavras usadas por Gabriel Garcia Márquez, Nobel de Literatura de 1982, acerca de seu último manuscrito inacabado, "Em agosto nos vemos". 

Entretanto, a última manifestação de vontade do autor, falecido aos 96 anos em abril de 2014, não foi respeitada pelos filhos de Gabo, que decidiram publicar a obra em 6/3/24, justamente na data de aniversário do autor.

A implicação jurídica do caso chama a atenção: o desrespeito à expressão de última vontade em vida, sem registro formal, pode ser considerada legal?

Ato de traição

Na introdução do livro, Rodrigo e Gonzalo García Barcha explicaram a decisão contrária à vontade do pai. Eles admitiram que se tratou de um "ato de traição", mas ressaltaram que a perda das faculdades mentais de Gabo, que o impediu de terminar o manuscrito, também o teria impedido de perceber como a obra estava bem escrita.

Os filhos do autor ainda afirmam que a decisão da publicação decorreu da presença de uma protagonista feminina no livro, já que em todas as outras obras de Gabo, mulheres são coadjuvantes. 

A personagem, no caso, é Ana Magdalena Bach, uma mulher de 50 anos, casada, que, anualmente viaja, em agosto, a uma ilha caribenha para visitar o túmulo da mãe. Nesse momento anual, Ana encontra a possibilidade de "libertação", desenvolvendo relacionamentos extraconjugais com desconhecidos.

Autores como Virgílio, Franz Kafka e Gabriel Garcia Marquez tiveram manifestação de última vontade contra a publicação de obras inéditas desrespeitada por herdeiros.

Testamento

A 32ª tabeliã de notas do Rio de Janeiro/RJ e professora de Direito Notarial e Registral , Virgínia Arrais, explica que toda manifestação de vontade feita em vida, para surtir efeitos após a morte, deve ser feita por testamento. 

A lei de direitos autorais (lei 9.610/98), especifica, em seu art. 28, os direitos patrimoniais do autor - de exploração econômica da obra - e, em seu art. 24, os direitos morais, os quais são inalienáveis e irrenunciáveis.

O §1º deste último dispositivo estipula que, após a morte do autor, o direito de "conservar a obra inédita" é um dos que são transmitidos aos sucessores.

Na avaliação de Luiz Fernando Plastino, especialista em Propriedade Intelectual do escritório Barcellos Tucunduva Advogados, deixar uma obra póstuma inédita não é um direito patrimonial. 

"É outro tipo de direito autoral, o qual a lei determina que será exercido pelos sucessores do autor após a sua morte. Assim, existe divergência sobre a necessidade de os herdeiros realmente respeitarem esse tipo de determinação de última vontade que não implica aproveitamento econômico."

E se inexistir concordância?

Virgínia Arrais reforça que "todo testamento ou escritura pública declaratória podem ser contestados, em função do livre acesso ao Poder Judiciário".

Dessa forma, caso algum dos herdeiros discorde da decisão de publicação, por exemplo, é viável acionar a Justiça para buscar uma solução adequada.

Desde antes de Cristo.

A curiosa situação não é única. Outros autores que expressaram o desejo de proibir a publicação de suas obras antes de morrer tiveram suas vontades desconsideradas.

Um exemplo é Virgílio, que em 19 a.C. deixou instruções claras para que "Eneida" fosse destruída. O poeta considerava que a obra não estava completa e em estado insatisfatório para publicação. No entanto, o imperador romano Augusto, que era um grande admirador de Virgílio, ordenou que o poema fosse publicado, ignorando os desejos do autor.

Outro caso notável é o de Franz Kafka. Antes de morrer de tuberculose, o escritor pediu ao seu amigo Max Brod que destruísse alguns escritos, incluindo os clássicos "O Processo" e "O Castelo", obras consideradas, hoje, de suma importância para o arcabouço literário de juristas.

No Brasil

Recentemente, a obra de Graciliano Ramos entrou em domínio público, porém a publicação de alguns escritos do autor gerou desconforto em seu neto, Ricardo Ramos Filho.

Em entrevista à Veja, ele afirmou que seu avô deixou determinação por escrito, sempre respeitada pela família, de que não desejava ver obras assinadas com pseudônimo publicadas.

"Se assinei com meu nome, pode publicar. Já com pseudônimo, não. Não sobra uma linha, não deixe sair. E, pelo amor de Deus, poesia, nunca. Foi tudo uma desgraça.", escreveu Graciliano.

Ricardo explicou que seu avô se considerava um "mau poeta". No entanto, o poema "Os Filhos da Coruja", escrito sob o pseudônimo J. Calisto, foi publicado por uma editora.

Abre-se, então, uma nova dúvida: o direito de manutenção do ineditismo se sobrepõe ao ingresso em domínio público de toda a criação do autor?

Luiz Fernando Plastino observa que, nesses casos, "se alguém quer garantir que uma obra não seja publicada de jeito nenhum, precisa destruí-la. É possível dispor dos direitos de edição, reprodução e adaptação de uma obra em testamento, por exemplo, transferindo-os para alguém de confiança, mas temos exemplos em que nem mesmo isso foi suficiente para evitar sua publicação".

Advertência do veículo: 

“Epa! Vimos que você copiou o texto. Sem problemas, desde que cite o link: 

https://www.migalhas.com.br/quentes/404968/entenda-se-e-legal-publicar-livro-proibido-por-autor-antes-da-morte”


12 comentários:

Jorge Carrano disse...


Vejam a preocupação do veículo com direito autoral, manifestada na advertência.

Aproveitando o espaço reitero minha admiração pela obra do Gabo.

Jorge Carrano disse...


Para amantes da leitura a matéria guarda curiosidades.

Jorge Carrano disse...


Fui conferir na Wikipédia:

"Virgílio terminou de escrever Eneida em 19 a.C. A obra estava "completa" mas ainda não estava "pronta" segundo o seu criador. Virgílio gostaria ainda de visitar os lugares que apareciam no poema e revisar os versos dos cantos finais. Mas adoeceu e, às portas da morte, pediu a dois amigos que queimassem a obra por não estar ainda "perfeita". O grande poema, já conhecido de alguns amigos coevos, não foi destruído - para nossa felicidade e fortuna literária. Sem a epopeia virgiliana, não haveria Orlando Furioso, O Paraíso Perdido, Os Lusíadas, dentre outros grandes clássicos da literatura mundial."

Jorge Carrano disse...


"O Processo", de Kafka, é obra fundamental.

A ficção se repete, em forma de realidade, nos tribunais mundo a fora ... ou não?

Jorge Carrano disse...


Riva correligionário?

Já me corrijo, exceto político rsrsrs

Riva Campeão da America disse...

Li ! Pela total inconsistência jurídica como uma decisão sacramentada da justiça, globalmente falando, o último parágrafo é para mim o resumo, no qual eu acrescentaria como conselho ao "quase viajante para o outro mundo" :
DESTRUA TUDO ENQUANTO PODE !

Mas minha pergunta de origem não foi esclarecida .... Exemplo :

Uma pessoa que nitidamente plagiou uma composição sua utilizando uma IA....

A culpabilidade dele é a mesma, como se não a tivesse utilizado ?

Ou a culpa é de quem desenvolveu a IA ?

A Justiça está preparada para julgar um caso assim ?

Riva Campeão da America disse...

Li ! Pela total inconsistência jurídica como uma decisão sacramentada da justiça, globalmente falando, o último parágrafo é para mim o resumo, no qual eu acrescentaria como conselho ao "quase viajante para o outro mundo" :
DESTRUA TUDO ENQUANTO PODE !

Mas minha pergunta de origem não foi esclarecida .... Exemplo :

Uma pessoa que nitidamente plagiou uma composição sua utilizando uma IA....

A culpabilidade dele é a mesma, como se não a tivesse utilizado ?

Ou a culpa é de quem desenvolveu a IA ?

A Justiça está preparada para julgar um caso assim ?

Jorge Carrano disse...


Como você conseguiu mandar a mesma mensagem duas vezes?

Alguém plagiar uma obra minha, ad argumentandum tantum, seria uma alegria. Seria como usar um órgão meu transplantado.

Mesmo que não fosse toda uma frase, uma oração, mas poucas palavras, como "Words, words, words."
Hamlet para Polonius. (Shakespeare, 1603)

O caro amigo noutro dia recorreu a Voltaire, citando uma frase de suas (his) mais recorrentes.

Uma que uso com frequência em petições e arrazoados, para não me estender:: "Quem exagera o argumento, prejudica a causa".
Friedrich Hegel.

Cabe até aqui neste comentário.

Voltando a Shakespeare, em Hamlet: "Words, words, words."

Você diria que no caso havendo citação da fonte, do original, estaria preservado Direito? Quem, hoje, exerceria tal direito?

Conselho. Leve a registro na Biblioteca Nacional, faça testamento, ou pelo menos um codicilo. Registre em tabelionato de "Títulos e Documentos".

Se não garantem, ajudarão numa contenda.





Jorge Carrano disse...


Imaginei que o que chamaria mais a atenção, já que entre os seguidores, muitos amam a literatura, a leitura, seriam as curiosidades sobre obras clássicas e seus autores.

Destinos que poderiam ter sido alterados, se não houvesse rebeldia, traição ou até mesmo meros interesses econômicos disfarçados?

RIVA disse...

Não tenho nada com que me preocupar em relação a plágios, foi mera curiosidade tendo em vista o "alvoroço" que a IA tem causado. E creio que nenhum tribunal está preparado para enfrentar, com assertividade, causas desse tipo envolvendo as IAs.

As curiosidades chamaram sim a minha atenção, não sabia de nenhum dos casos. Mas não era meu foco. E as obras do Gabriel ..... demais !!

Ando meio desligado, procurando trabalho, não tenho me envolvido muito com o que sempre gostei, tipo música, livros, GE, OVNIs, etc .....

Escrevi um artigo no LINKED IN sobre a dificuldade em recolocação no mercado de trabalho aos 70 anos de idade .... já teve 2.900 adesões !!

Sabe quantos currículos enviei, sem nenhuma entrevista agendada ? 77, isso, setenta e sete.

FLUi

Em tempo : mandei 2x meu comentário porque na 1ª vez me pareceu ter havido falha no envio, pois não veio mensagem de que tinha ido. Aí, como tinha salvo o texto, reenviei.

Jorge Carrano disse...


Os Tribunais certamente estão despreparados para julgar tais casos. Faltam normas legais disciplinadoras. A palavra está com o Congresso.

O PL 2.338/2023, que regulamenta o uso da inteligência artificial, está em análise em uma comissão temporária no Senado Federal. O tema não tem consenso entre os senadores, mas o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, afirmou que o projeto é prioridade na pauta de votações da Casa.

Além disto, há em gestação um Novo Código Civil.
O anteprojeto de código civil, que será entregue nos próximos dias ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, traz inovações como a inclusão de uma parte específica sobre direito digital e a ampliação do conceito de família. A proposta ainda passará por discussão dos senadores.

O grupo formado por 38 juristas promoveu um esforço concentrado sobre a proposta de alteração de mais de mil artigos no atual código, que é de 2002.
Fonte: Agência Senado

Inteligência artificial
Outro ponto, urgente, é a regulamentação da inteligência artificial. No ano passado, gerou polêmica o uso de imagens da cantora Elis Regina, morta em 1982 e que foi “revivida” por meio de recursos de inteligência artificial (IA) em uma propaganda de automóveis. A proposta do anteprojeto traz linhas gerais sobre a necessidade de autorização do uso da imagem gerada por IA e outros temas para não ficar defasado em relação a inovações tecnológicas.
— A ideia é fazer uma regulamentação geral, sem amarrar. Ninguém vai segurar a evolução das tecnologias — apontou.
Fonte: Agência Senado

RIVA disse...

Isso me remete àqueles (gostou da crase, Profª Rachel ?) países que nem Constituição escrita têm, vc mesmo que mencionou o fato.

Ou seja, sabem o que é certo e o que é errado. E assim devem ser julgados, pura e simplesmente. Mas isso em uma nação ....