Por
Alessandra Tappes
Professora educadora, Neuropsicopedagoga, Especialista em Comportamento Aplicado, Especialista em Intervenção Precoce, Assistente Terapêutica.
Novamente
fui convidada pelo manager do blog a matar a saudade de escrever nesse
conceituado espaço. Como recusar um convite tão especial?
Mas
primeiro preciso explicar o porquê trago aqui um texto técnico.
Estou
ausente há dois anos em função da minha formação acadêmica, mergulhada em
estudos o que me faz abrir mão dos meus hobbys: a escrita e o artesanato. (Lamentavelmente)
Essa
convocação me motivou a trazer um texto voltado para meus estudos como forma de
compartilhar a dura realidade dos bastidores da inclusão escolar.
Inclusão:
um direito de todos.
Mais
do que um direito, uma conquista está causando pane na rede educacional.
O direito da criança autista
ser inserida em educação regular está tirando o sono da rede de ensino. Como
incluir sem excluir? Uma grande questão.
Estamos sofrendo um choque
de conflitos sobre as normas estendidas da lei, que exige um profissional
gabaritado para dar assistência as crianças atípicas. Mas tropeçamos com
pouquíssimos profissionais com esse crivo, uma vez que para ser mediador
precisa ter no mínimo especialização no assunto.
Existem
duas questões bastante relevantes sobre o trabalho do mediador. A primeira se
refere a formação. Segundo a LDB – Lei
nº 9.394 de 20 de Dezembro de 1996, Art. 59, inciso III: “professores com
especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento
especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a
integração desses educandos nas classes comuns são indicados para atender a
inclusão, porém diante da observação da prática da mediação escolar,
profissionais da área da saúde e educação estão
atuando como mediadores, principalmente da área da fonoaudiologia, psicologia,
pedagogia, psicomotricidade e psicopedagogia por terem em sua formação um
currículo mais próximo a compreensão do desenvolvimento infantil em sua
totalidade para melhor entender os desvios no desenvolvimento global”.
A
segunda questão: o salário. Rara a escola que consegue reconhecer que para se
ter um profissional com tanta habilitação, é necessário um salário a altura.
Afinal, o horário estabelecido por lei é de 20h semanais, o que permite ao
profissional atuar profissionalmente seja clínico seja educacional.
Agora,
um fator muito importante é a ineficácia das escolas tanto da rede privada como
pública. Além de não levarem a risca a contratação de profissionais qualificados,
não existe conscientização quanto a inclusão, conscientização essa junto ao
corpo docente, discente e grupo de apoio escolar. Ter uma sala de recurso é uma
condição necessária as escolas e não a única! Para se garantir uma boa
inclusão, é preciso entender todo o processo, buscar novos recursos, reciclar
ideias, preparar funcionários.
Recentemente passou a
vigorar em nosso ordenamento jurídico a Política Nacional de Proteção dos
Direitos da Pessoa com Transtorno de Espectro Autista, consagrada pela Lei nº 12.764, a
qual dispõe que os autistas passem a ser considerados oficialmente pessoas com
deficiência. Ao enquadrar o autista na condição de deficiente, esse terá
direito a todas as políticas de inclusão. O direito a educação sem dúvidas é
uma batalha travada há muito tempo por pais que lutam pela inclusão desses
menores em escolas regulares.
As escolas regulares
públicas e privadas são obrigadas a fornecer acompanhamento especializado para
alunos com TEA em casos de comprovada necessidade e, já adianto, não poderão
cobrar mais por isso! A instituição de ensino não pode criar obstáculos para a
inclusão do autista, do contrário seria a responsável por gerar desigualdades.
O Ministério da Educação já
emitiu nota técnica (nº 24/2013) dispondo que as escolas privadas deverão
efetuar a matrícula do estudante com transtorno do espectro autista no ensino
regular e garantir o atendimento às necessidades educacionais específicas. O
valor desse atendimento integrará planilha de custos da instituição de ensino,
não cabendo o repasse de despesas decorrentes da educação especial à família do
estudante. Da mesma forma, por óbvio, não será possível a inserção de cláusula
contratual eximindo a instituição das suas obrigações.
Em uma de minhas passagens
pela rede particular, fui contratada pela escola, que exigiu a apresentação de
credenciais que garantisse a competência para o cargo. A minha qualificação era
inquestionável, mas a escola não conseguiu adequar aos custos para o pagamento cabível
ao cargo. Foi no momento em que atendi
uma criança de 8 anos, grau moderado/severo de autismo, com outras cormobidades
(as cito aqui pois as mesmas são requisitos primordiais para um bom tratamento)
e que infelizmente não é assistida da forma correta pela escola. Repito que
nenhuma escola no Rio de Janeiro está preparada para manter crianças atípicas.
Infelizmente estamos longe de sermos excelência em autismo...
Só para frisar, todo o
material que pesquiso e toda minha formação, vem de fora. Não temos no Brasil
know-how e todo conhecimento é baseado em estudos elaborados no exterior.
Curiosos sim, formadores de
ponta somente Europa e os EUA. Por isso a ineficácia e ineficiência dos
profissionais, da rede educacional e
consequentemente do cumprimento da lei de inclusão.
Notas do blogueiro:
1. Alessandra Pereira Tappes, é paulista nascida na cidade de Santos, de onde tem orgulho e saudade.
2. Foi difícil convencer Alessandra a voltar a este espaço, que ocupou, para nossa alegria, algumas vezes no passado, com seus textos carregados de romantismo sem pieguice.
1. Alessandra Pereira Tappes, é paulista nascida na cidade de Santos, de onde tem orgulho e saudade.
É graduada em Português/Literatura, mas o sonho de infância de ser professora, transformou-se no desejo de ajudar crianças com déficit cognitivo.
Para tanto pós graduou-se em Neuropsicopedagogia - voltada para educação inclusiva - e continua em processo de conclusão de cursos sobre Autismo, terapia sistêmica e psicopedagogia clínica e institucional.
2. Foi difícil convencer Alessandra a voltar a este espaço, que ocupou, para nossa alegria, algumas vezes no passado, com seus textos carregados de romantismo sem pieguice.
4 comentários:
Parabéns, Alessandra, por sua opção profissional. Não se trata apenas de trilhar o caminho da educação, por si só meritório, mas eleger uma via que exige mais humanidade, mais sensibilidade, mais entrega.
E a par do aparato intelectual, segundo soube numa revelação ao pé do ouvido (por telefone – rs), você é capaz de fazer um pão de batata capaz de rivalizar com o feito pela Wanda, tida esta e havida como queen da iguaria, com ou sem recheio de passas e frutas cristalizadas.
Parabéns Alessandra pela dedicação à educação especial. Simplesmente notável.
Eu ando muito desanimado, infelizmente. Com tudo em nosso país.
Alguém consegue citar algum projeto do BEM que está indo de vento em popa ?
Falo do BEM porque os do MAL estão indo muito BEM ...
Hoje fui com a Matriarca Vascaína ao Centro de Nikity, para comprar uma passadeira para a cozinha, e algumas plantas artificiais para pendurar no teto da varanda. Lá os preços são muito melhores do que em Icaraí.
Voltei arrasado, deprimido. Impressionante o nível de degradação urbana e social do Centro de Nikity. Me senti em Calcutá ou Bombaim.
Sujeira pra todo lado, mercado informal estabelecido na frente das lojas que pagam seus impostos, comércio feio sem nenhum cuidado com a estética, muitos travestis pelas ruas, calçadas esburacadas (impossível uma pessoa cega circular por ali), enfim, o CAOS.
Sim, é isso no que o Brasil está se transformando, com a ajuda dos políticos (eleitos por nós) e do STF (escolhido a dedo pelos políticos).
A população é a maior culpada, ela quer esse caos, por ter mais oportunidades em seu meio do que num meio saudável e honesto. Ou alguém aqui acha que um adolescente de comunidade carente prefere ir para a escola e estudar e adquirir conhecimento para buscar uma profissão bacana ? Buscar onde ? Que profissão ? Que salário ?
A informalidade é mais vantajosa num Brasil Bandido, com impostos vergonhosos, sem justiça, sem Constituição, sem emprego.
Hoje fiz uma proposta à MV sobre como deveríamos aproveitar nossos anos finais no Planeta Azul, com qualidade. Senti que ela balançou, favoravelmente ....
Lamento meu comentário tão negativo, Alessandra, sobre um post tão forte e bacana como o seu. Mas é a realidade que enxergo ... na verdade, realidez !
travestis em vários locais trabalhando desde cedo
Jorge, querido.
É sempre com muito prazer que atendo um pedido seu. Demoro, mas minha estrada não me dá folgas para esse "lazer" que é escrever.
Você sempre gentil quanto aos elogios... O pão de batata ficou bem gostoso, a receita de Wanda é fantástica!!!
Beijos na Wanda e obrigada novamente pela oportunidade de aqui desfilar minhas linhas.
Oi Riva.
Tudo bem moço?
Pois é, Entendo perfeitamente seu triste olhar em plena luz do dia ao que me parece um dia foi cenário de grandes aventuras...
Hoje ao acordar, me deparo com uma reportagem cujo tema vem a calhar com seu comentário. "É preciso recuperar a disciplina e a autoridade na escola". A autora do texto, uma educadora sueca, Inger Enkvist me deu a ponta de esperança que tanto grito sozinha na escola em que trabalho.
Eu trabalho com educação em séries iniciais e embora meu foco seja as crianças especiais, essas crianças estão sendo criadas pela geração da educação democrática onde damos a opção para crianças quem não tem noção do que é certo ou errado, do bonito e feio, do alto e magro. Eles estão em formação e nós, professores, temos a obrigação de repassar conhecimentos, valores e todo o sentido sobre o que é certo e errado. Todas as crianças estão preparadas para aprender. Mas sabe o que falta? Profissionais com vontade de trabalhar...
Sabe quando você acha que está remando contra uma maré bem forte? Sabe quando você se joga ao mar sem saber nadar? Pois é assim que me sinto toda vez que entro em sala de aula. Mas continuo a entrar, porque eu ainda acredito. Acredito que há tempos de mudança por vir, há sim esperança no fim. O texto dessa educadora veio a reforçar todo o significado do meu querer.
Compreendo sua indignação. Penso exatamente como você...
Obrigada pelo acolhimento.
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