14 de novembro de 2019

Deixei morrer sem nem mesmo tentar


Parece haver uma versão que fala em "quando os sonhos se tornam esperanças perdidas". Gosto mais. Comparem. Pincei via Google, os versos abaixo:

"E quantos sonhos se tornam esperanças perdidas

Que alguém deixou morrer sem nem mesmo tentar."

O que deixei morrer, sem tentar, parafraseando o astronauta, para mim foi uma pequena perda, mas enorme para a humanidade. Desisti de escrever um romance, com princípio, meio e fim.

Fiquei no terreno das intenções. Pensei nos personagens, em algumas interações, imaginei um par de situações sociais que mereceriam abordagem critica (para o bem e para o mal), e localizei o meio ambiente, o núcleo geográfico pra a trama: seria um condomínio. 

Não um condomínio edilício, tipo classe média, mas um condomínio horizontal, com belas e luxuosas casas, e toda uma infraestrutura de lazer como pier, quadras de tênis e até, talvez, um mini-campo de golfe. Coisa de ricos.

E aí estaria o cerne da convivência, porque rico pode ter origem no berço, de família tradicional aristocrática, mas pode ser um novo rico, quem sabe traficante internacional, ou jogador de futebol que construiu fama e fortuna, ou um empreendedor que construiu um império societário com ramificações em vários segmentos de negócios.

Bem, como diria, sobre o refinamento e gostos? Será que o pagode tão ao gosto de jogadores de futebol, por exemplo, iria contrariar o morador de família de quatrocentos anos, eventualmente com título de nobreza, conforme os Scarpa e os Matarazzo?

Aquele batuque, e não faço juízo de valor, inclusive porque sou eu mesmo admirador do Zeca Pagodinho, do Dudu Nobre, só para citar alguns, cairia bem nos ouvidos do homem de negócios (lícitos) que pretendia desfrutar de um final de semana tranquilo, em paz com a família e com amigos de gosto igualmente mais sofisticados?

E o traficante, descoberta a sua origem e em especial a de sua fortuna, seria abem acolhido neste meio? Difícil prognosticar porque traficantes internacionais costumam ter amigos influentes nos poderes da República. Somente quando os personagens ganhassem vida própria é que eu iria saber o rumo destas relações suspeitas, perigosas, espúrias.

Meu filho caçula, a quem confidenciei a intenção, me incentivou. Ele mesmo tem livro publicado.

Não contei a ninguém, mas a ideia do núcleo social que tem como denominador comum apenas o dinheiro, sem outros valores éticos, morais, de status familiar, surgiu há muitos anos quando num evento promovido pelo Grupo Matarazzo no clube Harmonia de Tênis, em São Paulo, tido e havido como fechado, elitista, alguém contou na roda de convidados em que estava, que o Silvio Santos, já então empresário e dono de canal de TV bem-sucedido, não fora admitido no quadro social porque não teria berço, por causa de sua origem modesta, de camelô.

Jamais soube se a versão era verdadeira ou falsa; o que importa para mim é que se havia esta lenda é porque algo bem próximo poderia ocorrer na vida real.

Dois condomínios que embora distantes do padrão daquele que elegi para ambientar meu livro, abrigam a classe média alta, passaram recentemente por situações incômodas.

Num deles reside o presidente da República, mas também um miliciano suspeito de ter assassinado a vereadora Marielle.

Outro, aqui em Pendotiba, na cidade de Niterói, uma das casas serve de locação apara vídeos pornôs.

É notória a prática das bolas pretas para barrar candidatos a sócios em clube elitizado no Rio de Janeiro.

Refinamento, bom gosto, sofisticação não se compra em loja de departamento. O dinheiro poderia ajudar a construir um verniz, uma couraça para encobrir a falta e elegância no trajar e no comportamento social.

Mas e o gosto literário, conhecer os grandes clássicos; a capacidade de se emocionar diante de uma tela de um mestre do renascimento, ou do movimento impressionista; reconhecer a arte numa bailarina virtuosa do balé, ou da prima-dama de um elenco de ópera? 

Bem, claro que você estão livres ... por enquanto. Porque se esta ideia abortei, outra poderá estar em gestação.


7 comentários:

Jorge Carrano disse...


Meus dois filhos têm livros publicados.

Alguns amigos também, como o Carlos Augusto Lopes Filho, o Hermes Santos, o Mario Castelar ...

O tempo que dedicava ao futebol, até o advento do VAR, poderá ser empregado perpetrando (?) um livro com crítica de costumes.

Ana Maria disse...

Acho que muitas pessoas, assim como você, abriram mão de seus sonhos.
Não costumo ser determinista, e não vou dizer que era pra ser assim. São escolhas que fazemos.
Controle-se com o fato que você trabalhou duro para garantir conforto para família e futuro para os filhos.
Ah! Plantou alguma árvore?

Ana Maria disse...

Onde está escrito "controle-se" leiam, por favor console-se.

Riva disse...

Na verdade vc já iniciou o romance com esse post (rsrs).

Continue ! Só dar nomes fictícios às personagens e continuar ...

Jorge Carrano disse...


Sim, Ana Maria. Quando morei em São José de Imbassai, plantei mais de uma árvore. Você conheceu o Ipê amarelo na entrada. Sem contar as frutíferas.

Poie é, Riva, avancei até no desenho de alguns personagens para idealizar as tramas, conflitos e tragédias.
Um condômino seria ex-CEO de uma grande multinacional que preferiu, ao se aposentar, continuar no Brasil até porque seu filho, ora com 19 anos, era nascido aqui. O rapaz em face da vida fácil que levava e suas relações no estrangeiro, acabou por se envolver no tráfico internacional de drogas.
Outro empresário residente no local, era casado com uma baiana, de belas feições e olhos esverdeados.
Ela, entretanto, tinha suas mágoas e tristezas. As outras mulheres bem-nascidas, tinham-na como uma exótica naquela ambiente. Por ser baiana, não faziam outra coisa senão pedir receita de vatapá autêntico. Tal fato lhe causava imensa dor e se sentia vítima de preconceito camuflado. Não era feliz naquele ambiente.
Queria mudar dali e contou, num dia de desabafo, suas decepções com o conceito que faziam dela. Era tida e havida como alguém que estaria limitada a conhecer a cozinha baiana.
Bem, paro aqui senão vira spoiler ...

Brincadeirinha, dificilmente irei levar a cabo o projeto. Faltariam talento, inspiração, vocação. Vontade, como dizem popularmente, é coisa que dá e passa.

Maria Cecilia disse...


Não desista de seu sonho. Comece agora pela sinopse. Depois vá desenvolvendo a história, caracterizando os personagens e descrevendo o cenário.

Bem devagar, sem pressa e sem compromisso. Se tiver vontade, dê pausas.

Na pior das hipóteses terá deixado uma história que seus filhos podem terminar. Em 4 ou 6 mãos.

O que vale é o caminho. E se este for percorrido com prazer, chegar não é importante.

Riva Z4 disse...

Eu e Freddy começamos um lance assim .... escrevi um texto inicial, e mandei pra ele.

Ele respondeu dando continuidade ao assunto.

Resumo : foram quase 500 páginas em A4 de uma aventura, onde nós mesmos somos os protagonistas, retornando a coisas da nossa infância e juventude.

Mas é muito pessoal ou familiar, ou seja, não publicável.