Na brigada do ministro Barroso (STF), contra o
juridiquês, seguem sugestões publicadas
no site “Migalhas”, no endereço https://www.migalhas.com.br/
Já me posicionei no sentido de que não sou inteiramente
favorável, embora admita que algumas expressões usadas em petições, arrazoados
e principalmente sentenças, seriam perfeitamente substituíveis por outras mais
comuns do nosso vocabulário coloquial.
Algumas, até, não teria coragem de empregar nos textos. Porque
não fazem parte de meu vernáculo.
DPE
- Dicionário de Péssimas Expressões
Na
edição de hoje, na busca de dar cabo do "juridiquês", apresentamos
mais uma sugestão:
Peça
increpatória – Trata-se de uma criação de
quem se dedica à arte do "juridiquês". E considera-se invenção pelo
fato de o adjetivo "increpatória" não ser oficialmente reconhecido; o
que existe é o verbo "increpar", que significa fazer acusações. Rui
Barbosa, por exemplo, utilizou este verbo diversas vezes. Vejamos um exemplo:
"Ainda não há muito, na imprensa popular desta cidade, vi increpar de
pouco democráticas essas disposições, e de contrárias aos princípios de nosso
sistema." Levando em conta essa adaptação adjetiva, o que se denomina
"peça increpatória" é, na verdade, o documento formal que contém a
acusação contra uma pessoa, detalhando os fatos e as infrações legais
imputadas. Em bom português, isso seria a "denúncia" ou a
"queixa-crime", dependendo do caso. Portanto, recomenda-se o uso
desses termos para evitar impropriedades linguísticas.
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Despiciendo - A palavra tem origem no latim
"despiciendus", derivada do verbo "despicere", que
significa "olhar para baixo", "desprezar" ou
"considerar sem valor". Em espanhol, assim como em português, denota
aquilo que deve ser desprezado por não ter importância. Embora seja mais comum
na língua de Cervantes do que na de Machado, indica algo desnecessário ou
irrelevante para a discussão ou decisão de um caso. Juristas frequentemente
usam essa expressão para demonstrar que certos fatos, argumentos ou evidências
não precisam ser considerados para a resolução de uma questão, pois não
influenciam o resultado. Por exemplo, em uma argumentação jurídica, um advogado
pode descrever um argumento da parte contrária como "despiciendo" se
acreditar que este não afeta a interpretação da lei ou o desfecho do caso. Isso
ajuda a focar a atenção do tribunal nos pontos que realmente importam para o
mérito da causa. Dessa forma, a palavra simplifica e clarifica os debates
legais, sinalizando ao juiz ou à Corte quais aspectos do caso devem ser
priorizados ou descartados na análise jurídica. Rui Barbosa, em sua laboriosa
vida, usou apenas três vezes esse adjetivo. Uma delas foi em 1892, depois de
ter deixado o ministério da Fazenda, em discurso no parlamento. Vejamos o
trecho: "Eu supunha haver prestado (...) um serviço não despiciendo ao
crédito da nação, na presunção, em que me achava, de que o crédito de um país é
tanto maior, quanto ele menos deve, ou mais depressa amortiza as suas dívidas.
"Como se vê, não é uma palavra de uso comum, de modo que, para
simplificar, prefira usar "insignificante" ou
"irrelevante".
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"Obtemperar": O verbo "obtemperar" vem do latim
"obtemperare", que significa "regular, moderar, obedecer"
ou "se adaptar a". É composto pelo prefixo "ob-", que pode
indicar confronto ou oposição, e "temperare", que significa
"moderar" ou "regular". A origem desse verbo reflete a
ideia de ajustar ou adequar ações ou comportamentos a certas normas ou
condições, mantendo um equilíbrio ou conformidade. O verbo "obtemperar"
possui duas principais definições. Como verbo transitivo direto e indireto,
denota "ponderar". Neste sentido, vejamos como a ministra Cármen
Lúcia o utilizou no famoso acórdão do "cala boca já morreu" (ADI
4.815): "Escreve-se para ser lido. E livro é produto de comércio. Logo, o
que se está a obtemperar não é importante para o deslinde da questão relativa à
interpretação da matéria." Outro significado do verbo, agora como
transitivo direto e intransitivo, está relacionado à ação de obedecer, pôr-se
de acordo. Nesse contexto, vejamos como Rui Barbosa utiliza o verbo:
"...para obtemperar às exigências nacionais". Trata-se, como se vê,
de uma forma erudita de se expressar. Mas já que nosso escopo é simplificar a
linguagem, substitua-o, no primeiro caso, por "considerar",
"ponderar" ou "refletir"; e, na segunda acepção, use
"cumprir", "seguir" ou "acatar".
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"Ad
argumentandum tantum" - É uma expressão que significa "apenas
para argumentar" ou "para argumentação". Ela é frequentemente
usada em contextos legais, acadêmicos ou filosóficos para indicar que uma
declaração está sendo feita para construir um argumento ou facilitar uma
discussão. Prefira usar apenas "somente para argumentar" ou
"para argumentação".
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"Cônjuge
supérstite" - "Cônjuge", como se sabe, refere-se a um dos
esposos em relação ao outro. "Supérstite", por sua vez, significa
simplesmente sobrevivente. Nesse sentido, "cônjuge supérstite" é o
membro do casal que sobrevive. Essa expressão é comumente usada em contextos
legais ou formais para se referir a situações nas quais um dos integrantes do
casal sobrevive ao outro, especialmente em questões relacionadas a heranças,
benefícios de seguros, pensões e direitos patrimoniais. Ela destaca a condição
da pessoa que permanece viva após a morte do parceiro. Embora seu uso esteja
longe de ser incorreto, caso se busque maior clareza e simplicidade, pode-se
optar por "parceiro remanescente" ou "companheiro
sobrevivente".
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"Quedou-se
inerte" - Aposto que você, advogado leitor, já usou um "quedou-se
inerte" em uma petição. Sabemos que não vai confessar, mas provavelmente
já aconteceu. Fique tranquilo, pois não cometeu crime de lesa-pátria. Para
começar, é um pleonasmo, pois "quedar" já implica permanecer, parar
ou ficar quieto, e "inerte" reforça essa ideia de imobilidade ou
falta de ação. Mas tudo bem, porque pleonasmos são frequentemente utilizados
para enfatizar ou esclarecer um conceito. No contexto jurídico, a expressão é
comumente usada para descrever a falta de ação ou a omissão de uma das partes
envolvidas no processo, como um réu que não apresenta defesa ou uma parte que
não cumpre uma obrigação processual dentro do prazo estabelecido. Por exemplo,
pode-se mencionar que uma parte "quedou-se inerte" diante de uma
decisão que exigia uma resposta ou ação específica, indicando que não houve
movimentação ou reação. Em uma conversa informal, ninguém diz que fulano
"quedou-se inerte", de modo que o ideal seria substituir a expressão
por algo mais coloquial, como "ficou imóvel" ou "não se
mexeu".
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mais uma sugestão:
"Abscôndito" –
Do latim "absconditus", é um adjetivo que significa escondido. Longe
de ser uma palavra coloquial, seu uso em contextos jurídicos pode até ser
aplicado para descrever informações, documentos ou detalhes que não são
facilmente acessíveis ou que estão deliberadamente ocultados. Além disso, em
discussões sobre a interpretação de textos legais, como contratos ou leis,
pode-se até falar em significados "abscônditos" para indicar
interpretações não óbvias ou profundamente embutidas no texto. Como se vê, a
palavra tem uma conotação de profundidade e de algo que requer esforço
significativo para ser descoberto ou entendido. Podendo, evite seu uso em
processos judicais, optando simplesmente por "oculto",
"escondido", "secreto", "velado" ou "encoberto".
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"Tábula
Rasa": Antes de falar desta
expressão, queremos reafirmar que não negamos o valor, o uso e a função da
linguagem metafórica. Aliás, é um meio inteligente e perspicaz de escrever. O
que buscamos neste léxico é oferecer simplicidade, sem exagero. Feita essa
introdução, vamos à expressão "tábula rasa". Trata-se de um termo
latino que se traduz literalmente como "tábua raspada" e refere-se a
uma folha ou superfície limpa e sem escrita. Na filosofia, é usada para
descrever a ideia de que a mente humana começa como uma folha em branco, sem
conhecimento inato, e que todo o conhecimento e as crenças são adquiridos
através da experiência e da percepção. Esta é, aliás, a ideia central no
empirismo, uma corrente filosófica que, como se sabe, enfatiza a importância da
experiência sensorial na formação do conhecimento. John Locke, filósofo inglês
do século XVII, é frequentemente citado como um defensor dessa visão,
argumentando que, ao nascermos, nossas mentes são como uma tábula rasa, sobre a
qual as experiências escrevem. Segundo Locke, todas as ideias e princípios que
adquirimos vêm da experiência, contrapondo-se à noção de ideias inatas proposta
por outros filósofos, como René Descartes. Onde nos interessa, o meio jurídico,
é comum dizer que alguém "fez tábula rasa" de uma norma. Isso sugere
que a pessoa ignorou completamente, desconsiderou ou violou os princípios e
regras estabelecidos na norma. Em outras palavras, é como se a pessoa tivesse
agido como se a norma fosse uma folha em branco, sem reconhecer sua autoridade
ou os limites que ela impõe. Cumprimentando quem corretamente usa o termo em
trabalhos acadêmicos, sugerimos alterar nas petições a expressão para algo mais
acessível, como "ignorou solenemente" ou "virou as costas".
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Bem pertinente. |