15 de março de 2019

As guinadas do judiciário






Durante anos, desde os meus tempos de estudante na Faculdade de Direito de Niterói, pertencente a UFF, e até mesmo antes disso, prevaleceu o entendimento de que “pacta sunt servanda”.

Ou seja, pouco mais ou menos o seguinte: os compromissos livremente assumidos devem ser cumpridos.

O que estava pactuado era lei entre as partes. Era para ser cumprido e ponto.

Quando uma alteração na política cambial, há não sei quantos anos, a extrema valorização do dólar provocou um desequilíbrio nas relações contratuais vinculadas à moeda norte-americana, houve uma corrida ao Judiciário.

Foi desenvolvida no âmbito da Justiça, e encampada por renomados jurisconsultos, a teoria da imprevisibilidade.

Esta teoria que atende pela expressão latina “rebus sic standibus”, e traduzida, mais ou menos ao pé da letra, seria algo como “estando assim as coisas”, inovou nas relações contratuais.

Fatos extraordinários, imprevisíveis, podem tornar extremamente oneroso para uma das partes o cumprimento da obrigação assumida.

Esta teoria (da imprevisão) admite a possibilidade de desfazimento ou revisão do contrato, na ocorrência de um fato imprevisível e extraordinário.

O Direito, enquanto ciência, é dinâmico e, como diria Einstein, relativo.  A compreensão do julgador, seja no juízo monocrático, seja no colegiado (de qualquer grau), é que irá decidir se a hipótese é de aplicação da teoria do “pacta sunt servanda” ou a do  “rebus sic standibus”.

Outra guinada, esta mais recente, coloca o mero transtorno em confronto com a indústria do dano moral.

Explico. A lei civil codificada coíbe e pune a prática de ato ilícito. O conceito  de ato ilícito acabou sendo flexibilizado o que provocou uma verdadeira corrida ao ouro, como no oeste americano,  de sorte a que todo mundo se achava vítima de um ato ilegal que lhe geraria um direito a reparação por dano moral.

Pode haver certo exagero na conceituação, mas num dizer politicamente incorreto, criou-se sim, uma indústria do dano moral.

Para por termo a avalanche de ações para reparação de dano moral, foi criada a teoria do mero aborrecimento. Ou seja, a situação narrada não configurava exatamente um dano moral senão um pequeno aborrecimento, em consequência do que, quando procedente, acarretava um valor indenizatório ínfimo.

Os advogados que atuam na área dos direitos do consumidor, que em geral cobram os honorários pelo sistema de risco, ou seja, um percentual sobre o valor auferido pelo cliente na demanda judicial, botaram a boca no trombone. Seus ganhos caíram muito, posto que 30% sobre R$ 10.000,00 geravam R$ 3.000,00 de honorários. Entretanto, 30% sobre R$ 1.000,00 geram apenas R$ 300,00.

O arbitramento do quantum a ser pago, como reparação pelo dano moral, puramente subjetivo, criou situações  esdrúxulas como num caso que acompanhei de perto.

Um casal, retornando de viagem aos Estados Unidos, teve problemas no embarque em New York. Condições atmosféricas não permitiram a decolagem do avião no horário aprazado.

Ficaram no saguão, sentados e/ou deitados no chão, sem oferta de alimentação, etc.

Ao desembarcarem no Rio, aforaram em Niterói, onde residem, ação de reparação por dano moral, em juizados especiais cíveis,  contra a AA, assistidos pelo mesmo advogado.

As ações foram distribuídas para diferentes serventias: ela obteve sentença favorável com valor indenizatório arbitrado em R$ 10.000,00. O outro, seu companheiro, conseguiu apenas R$ 5.000,00 pelos mesmos transtornos e constrangimentos.

Quero só ver no que vai dar, no STF, o julgamento da prisão quando há condenação em segunda instância.

                                    
                                      ORDENAÇÕES
                           (Afonsinas, Manuelinas e Filipinas)




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