Falei
(escrevi), no outro dia, sobre um canário-da-terra que mantive em cativeiro
quando contava 9 ou 10 anos de idade.
Quem,
ao final dos anos 1940, início da década de 1950, tinha preocupações ecológicas?
Estávamos, ainda, cuidando das cicatrizes da guerra.
E
os irmãos Villas-Boas, pelas páginas da revista “O Cruzeiro” ainda nos
apresentavam à várias tribos indígenas que não haviam tido contato com “os
brancos”. Selvagens em estado puro.
Não
narrei que a gaiola onde mantinha o canário tinha um alçapão que permitia
capturar outras aves soltas no mundo.
Não
contei, pois não era o caso, que o Décio, vizinho e adversário
nas brincadeiras infantis, e com quem, à época, por conta destes
desentendimentos eu não me relacionava (estava de mal), tinha – ele Décio – um casal
de canários.
Deu-se
que a fêmea fugiu e adivinhem onde foi parar? Exatamente! Acertaram. Dentro de meu alçapão. Claro que
atraída pelo canário solteirão que habitava a gaiola.
Exultei
porque sempre quis ter um casal, como o Décio tinha, e ganhei fácil a fêmea que
me faltava. Mas ao mesmo tempo juntei os fatos e me dei conta que aquela
canária era a fêmea que fugira da gaiola do Décio, conforme notícia que corria
na vila onde morávamos (Rua São Diogo, 21), nas fraldas do morro da Penha.
Olha
o drama que vivi, aos 9 anos. Eu queria a canária, mas ao mesmo tempo sabia que
ela pertencia a um vizinho, ou pelo menos pertencera até sua fuga no dia anterior.
Só que eu estava brigado com ele, então porque razão deveria bancar o bom
menino e devolver a ave?
Consultada,
minha mãe disse qualquer coisa relacionada a minha consciência. Ora, se eu tivesse
consciência não teria pássaros em gaiola.
O
destino conspirou a meu favor quando já estava quase decidido a ficar com a
canária.
Indo
ao botequim do Sr. Henrique para comprar os pães da tarde, tinha que passar
defronte a casa do “Carioca”, investigador de polícia que morava duas casas
adiante da nossa, em direção a saída da vila.
Ele
sentado no meio-fio, com várias gaiolas penduradas na parede, me chama e enfia
alguma coisa no bolso de meu calção. Enfio a mão para ver do que se tratava e
levei uma bicada. Passado o susto e observando, vi que se tratava de uma ave, e justo uma fêmea.
O
Carioca fizera apenas uma brincadeira, sem outra intenção, mas vi alí a solução
para meu dilema. Isso mesmo que vocês estavam pensando. Não haveria mais razão
para eu ficar com a ave que era (eu sabia) do Décio. Agora eu tinha duas
fêmeas. E este é o fim da história que não tem a famosa “moral” dos finais das
fábulas de La Fontaine.
Duas
palavras sobre o Carioca e seu gesto. Ele me pregou uma peça e se divertiu. Para ele aquela fêmea
de canário não tinha nenhum valor afetivo ou material. Ele mantinha em gaiolas
todos as conhecidos pássaros silvestres,
desde os canários até a araponga, passando pelo melros, graúnas e corrupiões.
Imagem Google |
E
a fêmea não serve para nada, a não ser a reprodução, pois não canta (mal pia) e
nem é tão bonita quanto o macho pois não atinge aquele amarelo característico
da espécie (vejam acima). Mantem-se na cor parda, ao contrário do macho que depois de certo
tempo entra na “muda”, perde a plumagem; e quando esta renasce ele fica
amarelinho como visto no post anterior. E alguns eles ainda cantam, não como os belgas, mas um
canto mais rústico. Ouçam em http://www.youtube.com/watch?v=KRm7RgTpODE
Nota do editor: dos frequentadores deste espaço virtual o único que estou quase certo conheceu o "Carioca", é o Ricardo dos Anjos pois o investigador tinha irmã que morava nas proximidade da Vila pereira Carneiro, com os sobrinhos dele. Um de nome Quincas, mas aí já seria uma outra história, protagonizada por este sobrinho do "Carioca", com o irmão do Décio.
Carrano, texto sensacional, que gera dupla interpretação - eu, não sei porque, li o que não estava escrito .... rsrsrs (deve ser porque hoje é 6ª feira ...)
ResponderExcluirFiquei então com duas dúvidas :
1. Você afinal, devolveu ou não a fêmea do Décio ?
2. Hoje, no alto de sua experiência e sabedoria, você devolveria uma fêmea (desejada) do vizinho que entrasse na sua gaiola ?
Ha! ha! ha! ha! ha!
ResponderExcluirO sorriso, quase gargalhada, foi por causa da segunda dúvida. Bem pertinente.
Quanto a primeira questão colocada, sim, devolvi e acabamos por fazer as pazes.
Não sei se já contei por aqui, mas de pássaros engaiolados tenho algumas recordações ...
ResponderExcluirTive o Shultz, um coleiro, na época que entrei na faculdade. O bichinho morreu porque esqueci de tirar ele do "banho matinal de sol", e fui para a faculdade. Foi f.... encontrar o bichinho morto, escondido atrás da caçambinha de água.
Daí fiquei décadas sem ter outro, até que compramos (eu e minha esposa) um roller numa feira de canários de Friburgo. E logo depois, entrou um belga voando pela nossa sala. Foi capturado e engaiolado.
Como cantavam esses dois canários !!
Um belo dia, a enfermeira da minha mãe foi lá em casa, e ouvindo a linda sinfonia canariana vindo da varanda, foi até lá, e falou para a Isa (minha esposa) :
- Belos canrários a senhora tem aqui. Belos mesmo !
Amanheceram os dois de pernas duras para o ar, no dia seguinte !!!
Finalmente, uma estória da juventude....
Éramos loucos por duas meninas recém mudadas para o nosso bairro - Tânia e Vânia. Mas o pai delas, Seu Bastos, um careca musculoso, montava guarda no muro diariamente, e grunhia a qualquer tentativa de aproximação dos marmanjos.
Os bailes rolavam e rolavam - era década de 60.
O Seu Bastos tinha uma coleção de pássaros engaiolados em casa, e o mais adorado e paparicado (segundo as meninas), era um melro, que adorava um cafuné na cabeça. E Seu Bastos colocava a gaiola com o melro sobre o muro, todas as tardes, para exibi-lo, enquanto impedia a nossa aproximação às deliciosas filhas.
Mas um belo dia, sob pressão das meninas e da mãe delas, consentiu em abrir as portas da casa, e promover um baile, para delírio das filhas e dos sedentos marmanjos do bairro.
Um detalhe : a"tchurma" era da pesada mesmo, diga-se de passagem. Só de loucuras e confusão dá para escrever uns 3 volumes !
Pois bem : o baile rolando, e o plano era fulminar o melro do Seu Bastos ....e assim foi feito .... cuba-libre na caçambinha e pronto, o bichinho de pernas duras para o ar.
Não precisa dizer a m....... que isso deu !!!
Espero que Seu Bastos não seja o Anônimo desse blog !!
Boa história, Riva.
ResponderExcluirNa verdade historias. Confissões de adolescentes (que acho que é nome de filme ou série televisiva).
ResponderExcluirE por falar em filme: "E aí, comeu?"
Pior do que o Seu Bastos é a Tânia e a Vânia estarem na linha.
Não rsrsrs .... hoje estão casadas com 2 caras que moravam no bairro, naquela época.
ResponderExcluirUm detalhe que esqueci ... os apelidos ..... a mãe delas (sem citar nomes), também era, digamos, muito admirada pela tchurma kkkk.
Chamávamos a mãe de Maracanã, e a filha mais velha de Maracanãzinho ... (pano rápido)
Censura ao atentado contra o pobre melro, você encontrará no post de amanhã.
ResponderExcluirVocês tinham fôlego para jogar no Maracanã?
Meu amigo, se for censurar tudo o que a Tchurma do Pé Pequeno aprontou na década de 60, em plena ditadura militar .....Freddy deve ter histórias pra contar também, pela visão dele (vivíamos e mundos diferentes).
ResponderExcluirLembra do racionamento de energia elétrica no verão, das 17 às 18h todo dia ?
A tchurma colocava esparadrapo nas campainhas das casas ! kkkkkkkk
Quando a "luz voltava" era o caos !
Ih .... esqueci .... jogávamos muito no Maracanã de nossos sonhos, no banheiro !kkkkkkk (censurado ?)
ResponderExcluirEssas intenções, essas homenagens, eram muito comuns naquela época de escassez de primas do interior.
ResponderExcluirO Ricardo acaba de confirmar, via email, que o sobrinho do Carioca era conhecido como "Quinca" (Francisco Vaz) e acrescenta, o que eu não lembrava, que ele jogava muita bola.
ResponderExcluirA coincidência, que agora fico sabendo, é que o Quincas casou com uma prima do Ricardo, já falecida.
O mundo é pequeno, e Niterói era realmente uma pequena aldeia, antes da ponte.
Engraçado, se não me falha a memória, Maracanãzinho era a empregada e não a filha mais velha.
ResponderExcluirDessa casa a única coisa que me interessou na época foi que através dessas jovens eu conheci minha primeira paixão verdadeira (e frustrada na mesma medida).
E antes que eu me esqueça, nunca participei dessas arruaças juvenis, eu militava em outra área - não menos controversa (balões).
Abraços diretamente de Friburgo
Freddy
Pelo visto o Freddy era adepto do politicamente correto. Embora balões... tsk tsk tsk!
ResponderExcluirPara encerrar o assunto, e por mera curiosidade, o Freddy frequentou o Maracanãnzinho ?
ResponderExcluirNão, Carrano.
ResponderExcluirEu levei uma vida muito introspectiva e quase nada tenho para contar de escabroso, nem mesmo engraçado, de minha infância e adolescência.
Talvez o mais interessante seja que eu e Riva, tendo vivido na mesma casa mas frequentado parcelas do Universo tão diversas, chegamos a escrever um livro a 4 mãos (misto de fantasia e revelações mútuas) cuja publicação também não é viável. Ah, sim, jé éramos casados e vividos quando fizemos isso.
Abraço
Freddy
A quem interessar possa, escrever a 4 mãos é uma diversão fabulosa! É um jogo.
ResponderExcluirVocê escreve uma bobagem qualquer, um capítulo, e manda por e-mail. O parceiro pega a ideia e desenvolve um aspecto, manda de volta. E aos poucos um enredo se estabelece, em qualquer direção.
Há algumas regras implícitas, porém não rigorosas ao extremo. Exemplo: você pode até matar um personagem, mas isso pode magoar a tal ponto o parceiro que a estória pode até parar, ou gerar rusgas e crises (no mundo real!!).
Vale, em notas de rodapé ou introdutórias, dar explicações para atos cometidos no enredo do capítulo em pauta, justificativas para alguma atitude radical, etc.
Entre nós, enquanto durou, foi um vício! Eu não podia chegar em casa sem me sentar no micro pra saber o que tinha rolado em desdobramento de meu último capítulo, como quem assiste a uma novela na TV!
Abraços
Freddy
Um brevíssimo comentário sobre o texto: no mundo animal, caso geral o macho das espécies é muito mais belo que a fêmea.
ResponderExcluirNa nossa sociedade atual, a tendência é inversa, apesar de que em algumas culturas antigas a beleza masculina era mais cultuada (p.ex. Esparta).
Abraços
Freddy
Estou surpreso Freddy. Eu frequentei muito o Maracanãnzinho, seja para assistir aos Globetrotters, aos shows de patinação, aos concursos de Miss Brasil e espetáculos das "Águas Dançantes", entre outros eventos que ora não lembro.
ResponderExcluirBom final de semana.
Freddy está certo !!!! Maracanãzinho era a escultural empregada do Seu Bastos ....... que memória !
ResponderExcluirFuçando lá no fundo da memória, já fui sim ao Maracanãzinho: 2 vezes. Concertos do Rick Wakeman (1976) e do Jethro Tull (por volta de 1990). Péssima acústica.
ResponderExcluirAbraços
Freddy