Nos últimos dias a palavra anencefalia saiu dos restritos meios onde é empregada, no dialeto médico, e ganhou destaque no noticiário.
Tudo por conta do julgamento, no Supremo Tribunal Federal, de uma ação proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde, no ano de 2004, sob o patrocínio profissional do advogado Luis Roberto Barroso, a fim de que aquela Corte decidisse se o parto terapêutico antecipado no caso de fetos sem cérebro, caracterizaria aborto, o que é vedado e punido pela legislação em vigor.
Foi um belo debate, e tivemos, como sói acontecer nestes julgamentos de grande repercussão nacional, votos longos, bem fundamentados e históricos dos membros daquele colegiado.
Antes de abordar detalhes dos votos, que resultaram na liberação da interrupção da gravidez, por 8 votos a favor e dois contra, vamos tentar simplificar o cerne da questão jurídica envolvida. Como o ministro Dias Tóffoli colocou seu impedimento para participar do julgamento, eis que atuou no processo, ao tempo em exercia advocacia-geral da União, apenas dez ministros participaram do julgamento.
Como sabem todos, o aborto é crime no Brasil, excepcionadas duas hipóteses: risco de vida da gestante (mãe) ou gravidez resultante de estupro ou violência sexual. Fora destes casos é proibido configurando crime capitulado na legislação penal.
Ora, seria necessário então, numa interpretação com suporte científico e jurídico, demonstrar que nos casos de feto sem cérebro, o que resulta em impossibilidade de vida extra-uterina, não ocorre aborto. A interferência médica para interrupção da gravidez seria na verdade de caráter terapêutico.
Em outras palavras, se não há possibilidade de vida fora do útero, então técnicamente não há crime contra a vida pois inexistente a possibilidade.
“Dar à luz é dar à vida, e não dar à morte”, como disse o ministro Ayres Britto em seu voto.
Anencefalia é uma grave malformação fetal que resulta da falha do fechamento do tubo neural, levando a ausência de cérebro, calota craniana e couro cabeludo.
Tal fato impede qualquer possibilidade do bebe sobreviver, isto se chegar a nascer, posto que segundo dados estatísticos 50% dos fetos anencéfalos apresenta parada dos batimentos cardíacos antes mesmo do parto, morrendo no útero da gestante.
Daí o ministra Carmem Lucia, do STF, em trecho de seu voto, haver cunhado frase largamente divulgada na imprensa: “O útero é o primeiro berço de todo ser humano. Quando o berço se transforma em um pequeno esquife, a vida se entorta.”
Segundo a comunidade científica, o diagnóstico pode ser feito de maneira absolutamente segura, através de ultrassom, e detectado já a partir do terceiro mês de gestação.
Os votos divergentes, dois como mencionado, foram proferidos pelos ministros Ricardo Lewandowski e Cesar Peluso.
Trecho do voto di ministro-relator define bem a questão. Assim se manifestou o ministro Marco Aurélio: “Aborto é crime contra a vida. Tutela-se a vida em potencial. No caso do anencéfalo não existe vida possível. O feto anencéfalo é biologicamente vivo, por ser formado por células vivas, e juridicamente morto. O anencéfalo jamais se tornará uma pessoa. Em síntese, não se cuida de vida em potencial, mas de morte segura. Anencefalia é incompatível com a vida.”
Como sabem os que me conhecem, sempre me posiciono frente as grandes questões colocadas. Ou seja, externo minha opinião. E neste caso fico ao lado daqueles que votaram favoravelmente ao parto antecipado, a interrupção da gravidez, nos casos de anencefalia.
Sr Carrano,
ResponderExcluirEmbora instigado, isento-me de opinar sobre a gandula, simplesmente por achá-la vulgar, ansiosa por holofotes visando ser uma celebridade que certamente não terá duração.
Quanto à anencefalia e à polêmica e ao julgamento gerado na Suprema Corte Judiciária, comungo com a sua opinião.
Obrigado pela visita, Luvanor, e por sua opinião, sempre equilibrada e sensata, a julgar pelo conjunto de seus comentários aqui no blog.
ResponderExcluirVolte sempre.
Abraço
Trecho do voto do min. Luiz Fux,hoje no STF, mas que foi juiz em Niterói, onde atuou na 1 ª Vara Cível:
ResponderExcluir"Um bebê anencéfalo é geralmente cego, surdo, inconsciente e incapaz de sentir dor. Apesar de que alguns indivíduos com anencefalia possam viver por minutos, a falta de um cérebro descarta complementamente qualquer possibilidade de haver consciência. [...] Impedir a interrupção da gravidez sob ameaça penal equivale à tortura”.
Dentre as vozes que se maqnifestaram em sentido contrário, destaco a do jurista Ives Gandra Martins, ligado a entidades católicas.
ResponderExcluirEis um trecho de entrevista que concedeu ao Informativo "O Pantokrator":
"Só me resta lamentar, até porque as entidades favoráveis à vida foram proibidas de sustentar oralmente a defesa da vida, pelo ministro Marco Aurélio que não as admitiu como amicus curiae (amigos da Corte). Desta forma, em plenário só houve a defesa dos advogados favoráveis ao aborto (procurador-geral e o da instituição promotora da ADPF).
Matéria desta complexidade, em que a maioria da sociedade, segundo o ministro Lewandowsky, é contra, à evidência, só poderia ser decidida pelo Congresso e, a meu ver, promovendo um plebiscito para conhecer o que quer a nação."
Para mim, todavia, em face da inviolabilidade do direito à vida desde a concepção (art. 5º, “caput”), entendo que, por ser cláusula pétrea, a questão não poderia ser sequer tratada, não tendo sido recepcionado o Código Penal de 1940 nas hipóteses do aborto sentimental ou terapêutico".
Pois é, nem os evangélicos, sempre contrários ao aborto em geral, se manifestaram nesse particular.
ResponderExcluirAgora uma coisa: tenho observado, no caminhar da humanidade, que existe muita gente viva mas anencefálica, ou escapou de ser por muito pouco, tal o seu comportamento à beira da idiotia, da imbecilidade. O artefato cultural denominado TV está repleto de gente assim, e bem consumida, telespectada ou telespectadorada (permitam-me os termos)... Uns videotas, porém sem o destino do Chance, the gardner, ou Chauncey Gardiner, como na obra e no filme "Muito Além do Jardim", com o genial Peter Seller.
NOTA (Wikipedia):O Videota (título original em inglês: Being There) é um romance escrito por Jerzy Kosinski. Publicado em 1970 [1], teve sua primeira edição brasileira em outubro de 1971 pela editora Artenova S.A. Foi adaptado para o cinema em 1979 com o título de Muito Além do Jardim. O roteiro foi escrito pelo próprio Kosinski.
Sou a favor inclusive da legalização do aborto sem restrições. A Terra já tem gente demais. O "crescei e multiplicai-vos" é anacrônico.
ResponderExcluirAbraços
Freddy
O filme é magnífico, Ricardo. E a interpretação do Peter Seller irrepreensível.
ResponderExcluirFreddy,
Pessoalmente prefiro a instituição da pena de morte, porque ao penalisado já teria sido dada oportunidade de vida e não soube aproveita-la vivendo em sociedade. Já o aborto pode inibir o nescimento de um belo ser humano (vai saber). Sem chance.
O seu "a terra já tem gente demais" ficaria atendida, e a população digamos "depurada", com exclusão dos que não aceitaram as regras de convívio harmonioso, com respeito as leis e a ordem. Com civilidade enfim.
Que acha, Freddy?
Abraços
Tenho certeza que se fizessem um plebiscito, como gostaria o doutor Ives Gandra(em relação ao aborto de anencéfalos), a grande maiioria da população votaria pela instituição da pena de morte para crimes hediondos. Inclusive eu.
ResponderExcluirAcho que traficante que vende drogas pesadas para menores, incentivando o vício, é um anencéfalo.
Tolerância zero com a criminalidade especialmente com o tráfico, com o estupro violento e o latrocínio é o que precisamos.
Abraços
Freddy,
ResponderExcluirA guerra, os desastres naturais em todos os países, sejam populosos ou não,já se incumbem do extermínio. E quando chegar o Armagedon então...
O problema Ricardo e Freddy, é que nestes desastres naturais perdem-se vidas indiscriminadamente. Morrem inocentes, gente de boa índole.
ResponderExcluirComo no episódio de Sodoma e Gomorra quando Deus não perdoou sequer as criancinhas, cobrança que lhe fez Caim (apud Saramago).
Abraços
Eu continua achando que devemos cancelar o "crescei e multiplicai-vos" com urgência urgentíssima. Pena de morte ajuda muito pouco na redução da população terrestre. Legalização do aborto teria mais êxito.
ResponderExcluirPoderei ficar preocupado quando alguém propuser matar os velhinhos, por serem improdutivos. O Governo Brasileiro já está agindo nesse sentido, achatando as aposentadorias e permitindo aumentos de planos de saúde, impostos, remédios, acima da inflação. Genocídio velado.
Abraços
Freddy