15 de outubro de 2019

Bananeira que já deu cacho




Este era para mim, como tantos outros, um provérbio popular ininteligível, anfigúrico ou, indo além, de sentido impenetrável, incompreensível.

Até que morei, por dois anos ininterruptos, numa zona, que se não considerada rural, tem característica campestres: São José do Imbassaí.

A casa tinha um bom quintal, no qual encontrei e conservei algumas árvores frutíferas. Comprei o imóvel e o vendi em curto espaço de tempo em razão da enorme decepção do que seria morar na "roça".

Em meio a outras frutíferas, uma touceira de bananeiras. O pé cresce, se desenvolve, frutifica e ao seu redor vão florescendo outros pés de banana, três ou quatro pequenas mudas.


Colhido o único cacho, aquela bananeira passa a ser um estorvo, porque as mudas ao redor vão crescendo e aos poucos vão tomando um espaço grande no quintal. Aquela matriz, bananeira matriarca, por assim dizer, perde sua finalidade. Não dará mais fruta.

Minha mulher colhendo bananas

E a menos que você tenha planos para aproveitar as enormes folhas, é melhor corta logo o pé.

Assim fiquei sabendo que nada há de filosófico, profundo, impenetrável, no ditado de origem portuguesa: bananeira que já deu cacho.

Trata-se de mera constatação de fato natural. É como ver o óbvio. Cabe a ressalva que segundo nosso maior dramaturgo - Nelson Rodrigues - só o gênio enxerga o óbvio. Mas é só isso.

Bem, o titulo da postagem foi escolhido porque me permite falar de mim mesmo. Já dei cacho, lato sensu (em sentido amplo). Já caminho para o estágio de nada dar e muito necessitar.

E por que escolhi este assunto que tangencia a morbidez? Estou me sentindo inútil, parasita? Não, já explico.

Tenho um concunhado em vida vegetativa há muito tempo. Passa temporadas hospitalizado e outras em casa porque os médicos sabem que nada têm a acrescentar aos cuidados que mulher e filhas poderão dar a ele.

Precisa ser alimentado, na boca, e ter as fraldas trocadas em intervalos regulares. Não raro, é claro que ele não sabe onde está e nem porque ali está.

Esta constatação, perversa, cruel, mas real e verdadeira, serve como alerta para meus filhos: preparem-se porque  se e quando eu alcançar este estágio não estarei sofrendo, mas vocês sim.

É ilegal, é imoral, cortar a bananeira? E desligar aparelhos?

Às favas sentimentos; ou eles já foram manifestados quando eram perceptíveis, quando tocavam o coração, fustigavam as emoções, ou já não servem à finalidade. 

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