23 de setembro de 2019

O SÉCULO XXI...





Calfilho*







Não sei como acordam aqueles que, como eu, nasceram no Brasil na metade do século anterior. Quando abro os olhos todas as manhãs, nos dias atuais, parece que a realidade que encontro é algo totalmente diferente daquilo a que estava acostumado a vivenciar desde a minha infância, adolescência e fase adulta de vida. Pode ser apenas impressão minha, mas acho que o século XXI é um marco divisório entre dois modos de vida completamente diferentes.

Tudo bem, a informática chegou de forma avassaladora e, praticamente, domina hoje todo o nosso dia-a-dia: computadores modernos, “smartphones”, redes sociais, drones, satélites, robôs, são coisas que eram inimagináveis na metade do século passado, quando ainda a televisão era a grande novidade da década de 50. Como antes já haviam chegado o automóvel, a eletricidade, o avião, no fim do século XIX, início do XX...

Ainda ouvíamos futebol pelo rádio (Oduvaldo Cozzi, Waldir Amaral, Jorge Cury, Doalcey Camargo, João Saldanha, José Maria Scassa, Luiz Mendes), as mulheres acompanhavam as novelas (“O Direito de Nascer”), os programas de auditório eram a coqueluche dos domingos (Paulo Gracindo, César de Alencar, “Balança mas não cai”)... O rádio reinava soberano como a maior fonte de lazer da população brasileira, os aparelhos de televisão só existiam em alguns lares privilegiados, a maioria importados...

As emissoras engatinhavam... No Rio, primeiro a TV-Tupi, a pioneira; depois vieram a TV-Rio, a Continental, a Excelsior... Por último a Globo, a única daquelas que permanece viva... Em São Paulo, a Bandeirantes, a Record, a Cultura, a SBT do Sílvio Santos...

Os jornais impressos ainda eram os principais veículos através dos quais ficávamos a par das notícias diárias e líamos as colunas interessantes dos suplementos. Lembro-me bem que ficava esperando com ansiedade meu pai chegar do trabalho para pegar o jornal de suas mãos e ler a seção de esportes ou as duas páginas de quadrinhos...

Rapidamente, os anos passaram, chegamos ao ano 2000, início de um novo século...

Nos dias atuais, parece que as pessoas não se entendem mais, não mais conversam entre si (pelo menos a conversa “olho no olho”), vivem com as cabeças enterradas em seus celulares onde quer que estejam: na rua, num transporte coletivo, num bar, numa reunião familiar... Outro dia, almoçando com alguns membros da família num restaurante de Niterói, reparei que, nas outras mesas, a maioria das pessoas conferia as mensagens dos celulares... e, mesmo na minha mesa, alguns filhos e noras também pareciam mais interessados na telinha do pequeno aparelho à sua frente do que conversar sobre algum assunto interessante... e aquela era uma reunião para comemorarmos o aniversário de um dos membros da família...

Enfim...

Não tenham dúvidas: a informática mudou completamente nossos estilos de vida.

Até na política, os antigos e tradicionais comícios populares, que, em outras épocas atraíam multidões, hoje perderam lugar para as “redes sociais”. Estas conseguiram eleger o presidente dos Estados Unidos e o do Brasil. Nelas se fala de tudo, até mesmo da vida dos outros. Tem notícias verdadeiras e muitas falsas (as famosas “fake News”), onde as agressões verbais e até através de fotos e vídeos parecem dominar. Ali, quem agride, quem ataca, quem não tem educação, se acha no direito de falar o que quiser e ofender a quem bem entender, acreditando estar protegido por um aparente anonimato (hoje, nem tanto...). E, também se acham valentes bastantes para atacar a honra de outras pessoas porque não estão frente a frente com os agredidos... 

Talvez se estivessem nessa situação, a agressão não ocorreria...

Sei lá, a impressão que tenho é que estou vivendo num mundo diferente, estranho, as coisas cotidianas se desenvolvem de uma maneira totalmente diversa daquela à que fui acostumado a viver durante vários anos...

Sempre afirmei aqui e em outros espaços que a educação (ou a falta dela) é um dos maiores problemas do nosso país. Enquanto em outros países ela é realmente levada a sério, onde vemos crianças com 5, 6 anos de idade sentadas em frente a um quadro de um museu, a professora explicando-lhes o que significa a pintura, quem foi o autor do quadro, aqui poucos conseguem completar o ensino médio, a maioria nem mesmo o antigo primário. Por isso, vemos essa multidão de mão de obra mal preparada, que não conseguiu ou até mesmo não quis estudar, trabalhando como biscateiros, bombeiros, eletricistas, balconistas, porque não encontraram emprego melhor e porque não conseguiram chegar a uma universidade ou a um ensino técnico de qualidade. Mas (pelo menos no Brasil de hoje), até mesmo o diploma não significa garantia de um bom emprego: já viajei com alguns motoristas da UBER que são,  alguns, engenheiros formados, outros arquitetos, ou outros mais que concluíram algum curso superior e que foram ganhar o sustento dirigindo um carro de aluguel, por não encontrarem emprego nas profissões em que se formaram. Lamentável tudo isso...

Também não significa dizer que o grau de instrução tornaria melhor a escolha dos nossos presidentes, governadores, prefeitos, deputados, senadores e vereadores... Sempre defendi o voto do analfabeto, porque eles também fazem parte de nossa população e devem ter o direito de escolher aqueles que irão representá-los nos postos de comando do país, de seus Estados e municípios...

Mas, não resta dúvida de que se mais e mais brasileiros conseguissem alcançar um grau cultural melhor, mais seriam aqueles que analisariam o currículo dos candidatos, que teriam um conhecimento mais aprofundado sobre aqueles em que votariam e não seriam apenas influenciados por um churrasco na comunidade ou a distribuição eventual de presentes para a criançada por um Papai Noel qualquer de araque...

Ou, como, para meu espanto, vi alguns “instruídos” escolherem um candidato apenas porque ele ou ela são “bonitinhos”...

Bem, divagações à parte, o que eu queria dizer é que com todas as invenções do mundo moderno, parece que voltamos à era do rádio: as poderosas Organizações Globo lançaram, recentemente, a última novidade: os “podcasts”.

Pode ser que eu esteja enganado (corrijam-me, em caso afirmativo, por favor), mas são eles noticiários reproduzidos por aqueles aparelhinhos que já vi pessoas usando nas orelhas para somente eles ouvirem o que está sendo transmitindo e não atrapalhar os outros na rua, numa condução, num restaurante...

Nada mais são que os antigos radinhos de pilha que alguns levavam para os estádios de futebol para acompanhar os jogos pelo rádio enquanto assistiam às partidas ao vivo. Os rádios “Spica”, lembram deles?

Daqui a pouco veremos transitando por nossas ruas uns seres estranhos com um aparelho cobrindo-lhes os ouvidos sendo atualizados com as últimas notícias... Como se já não bastasse a multidão que desfila com os olhos grudados no celular...

Bem, mas como tudo é novidade...

Ou, como já dizia um filósofo: “Nada se cria, tudo se copia”...

Bem vindos “podcasts”...


* Carlos Augusto Lopes Filho (Juiz de Direito aposentado).

Um comentário:


  1. Este é primeiro dos posts que serão aqui publicados, em comemoração aos 10 anos do blog, que serão atingidos em 20 de novembro próximo.

    Grato ao Carlinhos pela generosidade de me permitir publica-lo.

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