24 de abril de 2014

Opinião de quem conhece e sabe o que diz

País vive o flagelo do crime institucionalizado”, alerta ex-diretor da Interpol

Por Jorge Pontes*
“A sociedade brasileira vem assistindo nos últimos anos, talvez ainda sem entender bem suas reais dimensões, o surgimento e o fortalecimento de mais uma praga – quase – endêmica do nosso país; digo “quase” pois alguns países africanos também a experimentam. Trata-se do que podemos denominar de “Crime Institucionalizado”.
Tal fenômeno, que adquiriu contornos marcantes, que o diferenciam conceitualmente do crime organizado convencional, merece urgente atenção não apenas das autoridades policiais, do ministério público e do judiciário, mas, sobretudo, da imprensa e da sociedade como um todo, pois seu fortalecimento e sedimentação tem a capacidade de minar de forma devastadora as possibilidades de desenvolvimento nacional.
Vale dizer, grosso modo, que o “Crime Institucionalizado” estaria para o crime organizado assim como a motocicleta está para o velocípede.
Ao contrário do crime organizado, agora neste contexto rebaixado à delinquência juvenil, o “Crime Institucionalizado” não lança mão de atividades escancaradamente ilegais, como o tráfico de drogas, de armas, a prostituição, o jogo ilegal e etc. Este novo e poderoso flagelo utiliza-se apenas da plataforma oficial, dos governos das três esferas, do estamento público, dos ministérios da república, da política partidária e das regras eleitorais para prospectar e desviar fortunas do erário público. Todo o seu faturamento tem origem nos contratos de serviços e obras, nas concorrências públicas, nos repasses para programas de governo, principalmente para ongs e oscips.
Trata-se, desta feita, de atividade infinitamente mais lucrativa e segura do que qualquer negócio ilegal convencional colocado em prática por organizações tipo máfia.
Em suma, enquanto o crime organizado viceja aproveitando-se da letargia e da omissão de alguns homens públicos, o “Crime Institucionalizado” é fruto da própria ação estruturada e pensada de um grupo de homens e mulheres que comandam determinado setor, empresa ou unidade do poder público.
Outra diferença marcante é que, enquanto o crime organizado coopta, ou, quando muito, infiltra um agente aqui e acolá, na polícia ou numa determinada repartição, o “Crime Institucionalizado” indica e nomeia, com a devida publicação em diários oficiais, dezenas de autoridades que servem aos seus propósitos tanto na empreitada criminosa propriamente dita, como na tomada de medidas garantidoras da impunidade do grupo e da salvaguarda do butim, nos três poderes da república.
Mais um nuance importante é que o “Crime Institucionalizado”, com seus exércitos de nomeados em cargos e funções estratégicas, com vista a garantir alguns aspectos vitais da atividade, isto é, para institucionalizar a própria moenda criminosa, estaria, desgraçadamente, lançando mão da elaboração e promulgação de normas administrativas, e até de leis, que facilitem sua consecução. Eles têm a faca, o queijo e, é claro, a boca faminta, ao seu inteiro dispor.
Na última década o “Crime Institucionalizado” vitaminou-se tremendamente, aproveitando-se dos seguidos recordes de arrecadação tributária. Com o ingresso de dezenas de milhões de pessoas na classe média e o consequente aumento do consumo, os cofres públicos abarrotaram-se de dinheiro. São exatamente essas divisas, oriundas do alquebrado contribuinte brasileiro, que vem alimentando o “Crime Institucionalizado”.
Uma de suas consequências práticas mais nefastas é a existência de centenas de concorrências públicas viciadas pelas fraudes do “Crime Institucionalizado” – há quem diga, inclusive, ser difícil encontrar, nos dias de hoje, uma única licitação que não seja “arrumada”.
Contudo, ainda mais desoladora é a possibilidade da existência de grandes e vultosos projetos sendo aprovados com o único e exclusivo intento de desviar verbas públicas. É de fato o pior dos mundos, onde a corrupção estaria no nascedouro das iniciativas. Não seria mais o caso do estádio de futebol superfaturado, mas o caso do estádio de futebol que nem deveria ter sido construído, isto é, a corrupção de raiz. Não é, como dizem por aí, “o malfeito”, mas o que nem deveria ter sido feito.
Esta situação tem saída, por mais difícil e desfavorável que possa parecer. E a solução passa necessariamente pela total e completa blindagem política de todos os órgãos que compõem a persecução criminal, sem prejuízos de outras medidas de proteção às instituições do estado brasileiro, mormente as agências controladoras, nas três esferas políticas.
O quadro aponta para a necessidade da edificação de uma estrutura policial, altamente preparada e fortalecida, que faça frente a tais dragões, e com capacidade de investigar aqueles que nomearam seus próprios chefes.
* Jorge Pontes é delegado federal e foi diretor da Interpol do Brasil

8 comentários:

  1. Uma boa aula essa.
    Não vejo como sustar isso, depois de instalado.
    Talvez dividir o país em vários, com isso evitando que regiões onde o voto é facilmente comprado possam determinar os governantes para as demais regiões onde há um pouco mais de inteligência, cultura.
    A Dilma com certeza não se elegeria no Sul e Sudeste... Nem o orçamento dessas regiões sofreria sangria para sustentar as benesses de Norte e Nordeste.
    =8-(
    Freddy

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  2. Caro Freddy,
    Seu comentário antecipa um trecho post programado para o dia 28 próximo. Veja:
    "Um terceiro erro foi cometido na divisão de terras, no chamado "Tratado de Tordesilhas". Se ao invés de uma linha longitudinal (norte a sul) a linha imaginária fosse transversal (leste a oeste), teríamos certamente um pais melhor, mais desenvolvido, entre as maiores potência do mundo, que seria o fixado ao sul, do Rio de Janeiro para baixo."

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  3. Vamos entrar num terreno perigoso.
    Uma determinada semana estávamos em plena excursão chamada Nordeste Maravilhoso, que em tese é bem montada. Você vai de avião até Salvador, daí pega um ônibus e segue costa acima até Fortaleza, visitando as capitais e arredores. Volta de avião.
    Parêntesis: a referida excursão deveria se chamar Praias do Nordeste, pois que todos os passeios programados em cada parada são estadas de dia inteiro em praias, em vez de polarizar no conhecimento da região. Fecha parêntesis.
    Lá pelo meio, um dos passageiros, observando que a gente raramente estava com o grupo nos passeios, preferindo atividades à parte por conta própria, perguntou-nos se não estávamos gostando. A resposta foi:
    - Não, a gente não gosta do Nordeste.
    Então ele retrucou:
    - Se não gostam, por que vieram?
    Nossa resposta quase gerou uma guerra civil:
    - Viemos para poder depois falar mal com conhecimento de causa.

    =8-/
    Freddy


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  4. Eu acho que o Nordeste é usado politicamente para o mal. Um projeto decente levaria força e desenvolvimento à região. Resumo de minha ideia:

    Permissão de jogo em pelo menos 6 praias, desde Bahia até o Maranhão. Criação nessas praias de infraestrutura hoteleira pesada, com aeroportos, shoppings, foco em gastronomia regional de alto nível, turismo costeiro, passeios por algumas das belezas nativas (e há, decerto). Coisa fina, bem arquitetada.
    Rigor no recolhimento de impostos, na regulamentação dos empregos, cuidado para não permitir exploração sexual.

    Objetivo maior: fixar no Brasil quem tem dinheiro e gosta de jogar (essa turma viaja e deixa sua grana lá fora, além de gostar de ser bem tratada). Atrair para o Brasil quem tem (muito) dinheiro e gosta de jogar, aliado à natural curiosidade pelo exotismo de nosso litoral.

    Com um programa desses, num instante a região começaria a angariar recursos que seriam aplicados em seu desenvolvimento social e cultural, sem precisar sugar orçamento das demais.

    Quem não gosta? Quem usa o Nordeste como fonte de recursos escusos, corrupção desenfreada, coronelismo... Quem angaria voto para se eleger e gerir os recursos das regiões produtivas, desviando-os para as mais carentes em programas mirabolantes e fáceis de corromper.

    Talvez religiosos fanáticos também se levantem contra o jogo, como se fosse o Demo baixando à Terra. Só que o que mais se faz no Brasil é jogar. As lotos e megas do Governo são um ralo de dinheiro desviado para a corrupção. Abrir o jogo à iniciativa privada estragaria o esquema...
    =8-/
    Freddy

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  5. Se não é perigoso é controverso, caro Freddy.
    O litoral do Nordeste, para passeio, tem muitos atrativos. Pode-se desfrutar de belas praias, e de boa comida regional (para quem gosta). Lamentável os preços cobrados e a quantidade de mendigos que ficam no seu rastro todo o tempo.Principalmente as crianças.
    Mas eu me referia ao Agreste, ao Cariri, ao Sertão de solo tórrido onde as condições de vida são precárias, as oportunidades de trabalho não existem, os índices de mortalidade infantil são absurdamente altos, e todas as demais mazelas que os turistas não enxergam. Nem as autoridades que tapeiam os problemas com bolsas miséria e blefes como a transposição do São Francisco.

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  6. Nossos comentários se cruzaram nas nuvens, Freddy. Diferença de dois minutos até que fossem publicados.
    Com seu último comentário o contexto ficou maior.

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  7. As pessoas, quando falam do Nordeste, sempre mencionam as capitais ou outras cidades turísticas. E como bem posicionou o Carrano, o contexto é infinitamente maior.

    O Nordeste é uma tragédia nacional ; sua população é permanentemente dizimada por aqueles que eles mesmos, enganosamente, desesperadamente, continuam a colocar como governantes de suas cidades, estados, e em Brasília, acreditando em suas promessas. Não têm outra escolha a não ser ... acreditar.

    E o pior : essa tragédia é o eterno motivo para reivindicação de verbas que NUNCA são utilizadas a que se destinam.

    Trata-se de um modelo PDCA, eficiente, voltado para o MAL.

    E essa engrenagem PDCA gira, e gira, e gira .... e sangra, e como sangra ......



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  8. No post mais recente "Carta para a Caserna", há um trecho exemplar:

    "No Executivo, uma genial estratégia de compra de votos com cestas básicas - O BOLSA FAMÍLIA - mantém na miséria absoluta MAIS DE QUARENTA MILHÕES DE BRASILEIROS, encurralados em currais e bolsões no norte e nordeste, onde o Governo jogou sal na terra e não permite que nada cresça, previne o crescimento econômico, deixando QUARENTA MILHÕES entre a opção de passar fome ou de trocar seu voto por um carrinho de compras."

    Por isso o Nordeste não cresce, apesar dos programas oficiais existentes há anos.
    É estratégia montada, e difícil de reverter.
    =8-(
    Freddy

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