Sou da geração marisco, a que ficou entre as ondas da modernidade, dos avanços tecnológicos, e as pedras, representadas por conceitos sedimentados, máquinas e equipamentos eletromecânicos e analógicos com os quais estávamos acostumados.
O impulso das ondas da modernidade, um verdadeiro tsumani, nos empurra para o convívio e o uso de máquinas e equipamentos antes impensáveis, que conhecíamos de ficção científica; mas nossos cérebros e raciocínios lógicos estão enrijecidos como pedras.
Não que não houvesse avanços tecnológicos. Havia. Por exemplo: depois de muitos anos com máquinas de escrever manuais, apareceram máquinas elétricas, que ofereciam comodidades maiores (velocidade, menos esforço, "cebola" para seleção de tipos e corpo de letras). Mas, ainda assim, usávamos carbono quando precisávamos de mais de uma via, e quando errávamos a correção era um horror: borrachas que sujavam mais o papel do que corrigiam, em especial na via carbonada. E o corretor líquido que surgiu depois também não significou grande melhoria na estética do trabalho.
Hoje um dedo na tecla “delete” e um simples apertar do botão power da impressora, nos oferece quantas cópias necessitamos, limpas.
Mas o grande avanço mesmo, um maremoto que nos deixa atordoados, os da minha geração, ocorreu no terreno das comunicações.
Em 1964, quando casei, foi um parto da montanha conseguir falar com minha mãe em Niterói. E era imperioso, sob pena de não haver casamento, porque o padre de Cachoeiro de Itapemirim exigiu, para a celebração, que o pároco da matriz do bairro onde eu morava em Niterói, que no caso era a igreja existente na Vila Pereira Carneiro (bairro Ponta D’Areia), desse uma declaração de que eu estava apto, pois passara pela preparação necessária segundo os ritos da igreja católica.
Ora, o casamento seria no dia seguinte e não era possível conversar por telefone com minha mãe, porque em Cachoeiro ninguém tinha telefone e no Posto Telefônico Público da cidade, mesmo com a prioridade que consegui para minha ligação (em geral demorava horas) não estava sendo possível completá-la. A solução? Vejam a maratona:
Fui até a sede da Viação Itapemirim e, desde lá, por rádio, eles fizeram contato com a Estação Rodoviária, no Rio de Janeiro, onde a empresa tinha, como tem, guichês de venda de passagens. Passaram para o funcionário da Itapemirim, no Rio, o nome e o telefone de minha mãe, para que ele ligasse e transmitisse o recado para ela obter o tal papel da igreja.
E ficamos sem notícias. Minha mãe teria entendido o recado? Encontraria o padre? E este estaria disposto a dar o tal documento sem minha presença e sem que eu tivesse passado pelo cursinho?
Wanda chorava copiosamente e a expectativa era de que não haveria a cerimônia.
Ficou o suspense até o dia seguinte, quando pela manhã minha mãe chegou a Cachoeiro. Com o papel necessário.
Hoje, teria a minha disposição linha convencional instalada na casa de meu sogro, teriamos celulares para falar com minha mãe direto e poderia, até, conversar com ela, vendo e sendo visto, via Skype. Mandando beijinho.
Smartphones |
Mas não é fácil para nós, geração pós-guerra, aprender a lidar com tudo isto. Pior, é complicado até saber a aplicação e uso de cada um dos tablets, leitores digitais (e-books), todos os “ais” Pads, Phones, Pods, smartphones e mais um arsenal de maquininhas que não sei nem os nomes e para que servem. Na verdade algumas maquininhas têm tanta aplicação que fica difícil conceituar: o celular tem rádio, máquina fotográfica e filmadora.
i Pad 2 |
Kindle (e-book) |
Por mais que me esforce, até por necessidade profissional, e mesmo contando com a colaboração de filhos e netos, sei que pareço jurássico. E olha que mantenho um website há 9 anos.
A coisa é mais séria do que vocês, que não vivem este problema, podem imaginar. Para ilustrar vou contar o caso, recente, de um advogado que se inscreveu para fazer o curso de “inclusão digital” promovido pela OAB, para habilitar os advogados em face do sistema de processamento eletrônico já implantado.
Ele estava tão atrapalhado, com dificuldade de entender até mesmo o uso do programa editor de texto (Word) e seus recursos: alinhamento, grifos, fontes, etc, que num dado momento incapaz de acompanhar o que estava sendo explicado, muito nervoso, perdeu a calma e falou em voz alta: advogo há quarenta anos e nunca precisei lidar com estas coisas. Agora velho, estressado, com dois stents e diabético, não tenho como aprender isso. Não consigo. VOU PARAR DE TRABALHAR!
Fez-se um silêncio obsequioso. Mas da turma de 16, diria que a maioria, em maior ou menor grau, estava com dificuldade para lidar com o assunto e a máquina.
É, a geração do meio está sofrendo.
Eu já não consigo conversar com ninguém de gerações mais novas. Ninguém entende o que eu digo. Não as palavras, mas a ideia que tento transmitir. Não que eu seja burro ou eles imbecis, apenas não mais lhes interessa o que eu tenho a dizer. Mudou o comportamento humano da nova geração e eles estão tomando o mundo. Precisam que saiamos da frente - isso passa pelo genocídio de aposentados (reajuste aviltante do benefício) aliado à depauperação do serviço público de saúde.
ResponderExcluirVejo um futuro cinza chumbo à minha frente (antigamente era negro, mas é politicamente incorreto dizer isso hoje).
Abraço
Carlos
Não sei o que dizer .... mas sei que me incomoda e muito tudo isso.
ResponderExcluirUma maneira de me sentir melhor, que optei é a seguinte : o que eu realmente preciso conhecer, acompanhar, ficar atualizado, em relação às coisas que curto de lazer e do meu trabalho (quando tenho rsrs) ?
E aí eu fecho meu leque e foco apenas naquelas coisas. E dane-se o resto. Saio do tsunami de informações e upgrades.
Não compro revistas especializadas, não converso sobre isso com quem curte demais isso tudo. Faz mal à minha saúde mental.
É uma fase de transição complicada essa que nossa geração pegou. E aos 59 anos, não vou mergulhar nisso. Apenas pegar o que me interessa. Um iPhone, por exemplo ..... rsrsrs
Carrano,
ResponderExcluirDurante muito tempo mantive o seu site, que você menciona, entre meus favoritos.
Eu fui síndico e foram importantes algumas informações que encontrei lá.
Mas está abandonado há muito tempo, não é?
Abraço
Gusmão
Gusmão, vc me lembrou que tenho uma dívida com o Carrano .... escrever alguma coisa sobre síndicos, condomínios.
ResponderExcluirFui síndico onde moro por 12 anos, no condomínio de Friburgo por 2 anos, e trabalho em Facility Management (gerenciamento de grandes infraestruturas prediais) há 16 anos.
O problema de escrever algo sobre isso tudo é o modelo da matéria, a estrutura da matéria. Ainda não cheguei a nenhuma conclusão de como faze-lo (tem acento ?), mas minha tendência é escrever sob a forma de "cases".
Que venha a inspiração, Carrano .... abrs
Pois é, Gusmão. Para atualizar o website preciso de assessoria de minha nora, que foi quem construiu para mim, em 2002. Já o blog é mais fácil de atualizar, editar e publicar.
ResponderExcluirMas devo retomar o site no próximo ano.
Pois é, Paulo, não cobrei porque não se trata de obrigação. Você deverá estar se divertindo ao escrever para o blog. Tem que ser prazeroso, como sempre digo.
Mãos à obra, continuo aguardando, achando que agora você se animou.
Abraços