31 de julho de 2011

Minha geração

Depois da digressão do último post, e dos comentários complementares do Carlos March, vou dissertar  um pouco sobre hábitos, costumes, prazeres, alegrias e frustrações da minha geração. Somos os nascidos durante o conflito mundial, entre 1939 e 1945, que vivemos sob os efeitos do pós-guerra, quando o mundo experimentou uma significativa mudança geo-politica-econômica.

Seleção de 1950
(veja legenda ao final)
 A primeira frustração que me ocorre, foi a perda do campeonato mundial, disputado no Brasil, em 1950.

Tínhamos a melhor equipe, na época dizia-se que tínhamos o melhor scratch, e tínhamos mesmo, embora a equipe uruguaia, que acabou vencedora não fosse nada fraca. Mas além de um bom team, tínhamos mais de 150 mil vozes e corações torcendo por nós no Maracanã. E nos bastava o empate, pelos critérios de disputa então vigentes, e fizemos o primeiro goal... e os uruguaios viraram o placard para 2X1. Não estava lá, mas estive no jogo anterior, quando ao som de "Touradas em Madrid", liquidamos a Espanha por 6X1. Meu pai e amigo dele, de nome Américo, revezaram-se em me colocar sobre os ombros, tal o número de torcedores que assistiam a partida em pé. Era uma multidão como eu jamais havia visto.

Muito choro e muitas lamentações. Para o menino de 10 anos uma tristeza só. Quem viu Zizinho, Ademir e Jair, viu, quem não viu jamais poderá avaliar o poderio, a classe e a eficiência deste trio ofensivo.

Levamos 8 anos cicatrizando as feridas, até que a mesma geração viu Pelé, Garrincha e Vavá, que lavaram nossa alma e alegraram nossos corações. E vimos nascer o maior jogador de futebol de todos os tempos.

Martha Rocha

Martha Rocha

Minha geração torcia por misses. Os concursos estaduais e o nacional para escolha da Miss Brasil eram concorridíssimos. Um programa interessante. E formávamos torcidas, por esta ou aquela candidata. A eleição final era no Maracanãzinho lotado.

Nesta época era “in”, era “up to date” ler O Pequeno Prinipe, obra de Saint-Exupéry Exupéry, em função do enorme sucesso da obra entre os jovens e também entre os adultos, que enxergavam ótimos conceitos filosóficos na história do diminuto monarca.

Em conseqüência, as misses, quase todas, nas entrevistas, diziam ter lido O Pequeno Príncipe. E desde então é um estigma que persegue as misses: o de serem leitoras d’ O Pequeno Príncipe. Mas aplicado pejorativamente.
Liceu Nilo Peçanha
Niterói

Emblema do Liceu

Com efeito o livro tem conceitos muito interessantes e até hoje vem granjeando prestígio e se revelando campeão de vendas (recentemente esteve, de novo, na lista do 10 mais vendidos durante semanas).

Eu estudava no Liceu Nilo Peçanha, e alguns colegas achavam chic dizer que estavam lendo o livro pela segunda vez, agora nas entrelinhas. Como a quererem sublinhar que algumas mensagens contidas na obra não eram muito explícitas e precisavam de reflexão e atenção maiores.


Albert Einstein

No mundo acadêmico/científico, a novidade, o tema mais polêmico e repleto de dúvidas, incertezas e discussõses, ainda era a Teoria da Relatividade e quem sabia a fórmula e sua reprentação, se destacava no Liceu. Impressionava tanto quanto saber dissertar ou discutir  física quantica na virada deste século.



Tom Mix

Minha geração torcia muito por Roy Rogers e Tom Mix, “mocinhos” (cowboys) famosos da época, nas telas cinematográficas e nos gibis (revistinhas de histórias em quadrinhos).

Sala de cinema


Minha geração de meninos e adolescentes pagava os ingressos nos cinemas para as namoradinhas. Ou tínhamos o dinheiro pra a “entrada” ou não íamos. Imagina convidar para o cinema e não poder pagar?

Roy Rogers



Também não admitíamos deixar a companhia feminina, fosse a namorada, fosse uma irmã, fosse a mãe, no lado da calçada próxima a rua (via de rolamento). A mulher do lado esquerdo do homem poderia significar disponibilidade. Estranho? Você ainda não viu (ou leu, no caso) nada!


Minha geração era sacana, sem caráter, loleque. Se flagavamos a menina aos beijos e amassos com um colega, vinha a chantagem: “se não me der também, vou contar para todo mundo”.


Ava Gardner

Lana Turner


Minha geração homenageava Ava Gardner e Lana Turner, da formae elegante como Martinho  da Vila descreve na música Ex-amor: "eu me possuo e é na sua intenção".


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Minha geração jogava pelada, nas ruas. Brincava de pique, escambida e carniça. E sempre escolhia a uva, na famosa brincadeira de “pera, uva ou maçã” quando o colega que nos vendava os olhos sussurrava que era uma menina bonita. A uva correspondia a ganhar um beijo. A pêra um cumprimento e a maçã um abraço. Olha a molecagem e a trapaça de novo.

Abrir a porta do automóvel para as damas, levantar do assento no ônibus para ceder o lugar a uma mulher (jovem ou velha), carregar as sacolas e embrulhos mais pesados e outras gentilezas fora de moda, pratiquei ao longo da minha e também das gerações que se seguiram. Hoje isto é reputado como cafonice ou, pior, babaquice.

Havia um policiamenro ostensivo de rua, através de uma dupla de policiais fardados, apelidados de Cosme e Damião, numa alusão aos gêmeos, santos da igreaj católica, também cultuados na umbanda. As ruas eram muito mais seguras e tranquilas do que hoje, menos pela presença da polícia (que até era eficiente), mas porque a violência não estava tão disseminada e os marginais de rua limitavam-se a furtar as carteiras dos incautos. Estes ladrões (não assaltantes) eram chamados punguistas.

Os homens adutos precisavam portar a carteira profissional (de tabalho) sob pena de detenção "para averiguações". A vadiagem era crime.

"Se me der na telha", expressão daquela época, um dia falarei do que comiamos, o que assistiamos no cinema, dos parques de viversão e dos ursinhos de pelúcia que ganhei no tiro ao alvo, nos circos, inclusive o que incendiou, e do início da TV no Brasil.

Quem tiver curiosidade de saber mais sobre esta seleção nacional, clique no link a seguir e terá um belo documento da época:
http://books.google.com.br/books?id=QlmQwkYLq74C&pg=PA18&lpg=PA18&dq=scratch+nacional+de+1950&source=bl&ots=_DKqSujB3L&sig=5JZLnA1CiL7WthMn9ibwp_FMSPA&hl=pt-BR&ei=c2U0Tv-fL8q10AGDn62ADA&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=2&ved=0CB4Q6AEwAQ#v=onepage&q=scratch%20nacional%20de%201950&f=false


* Escalação da equipe brasileira na foto: Barbosa, Augusto e Juvenal; Bauer, Danilo e  Bigode; Friaça, Zizinho, Ademir , Jair e Chico. (a moda do esquema da época, chamado WM)

Fotos: Google imagens













5 comentários:

  1. Alcancei e lembro de quase tudo que você escreveu. Mas não estive no Maracanã durante a Copa.Era muito pequeno.
    Em 1958, comemorei muito também porque meu Botafogo tinha na seleção o Nilton Santos, o Didi, e o Garrincha. Acho que o Zagalo ainda era do Fla , não lembro.
    E minhas divas já foram Gina Lolobrigida e Kim Novak.
    Gusmão

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  2. Carlos Frederico31/07/2011, 11:15

    Nascido em 1951, a maior parte de minhas memórias se dá a partir de 1957 (pouco me lembro de antes, a não ser cenas domésticas esparsas). Os primeiros grandes momentos foram futebol: a Copa de 58 e o super-super-campeonato do Vasco, o que sedimentou minha escolha de time para torcer (ainda bem, porque depois só em 1970...).
    Estudei tb no Liceu, e muito me orgulhei disso. Que pena, como o ensino público degringolou com o passar do tempo...
    A grande diferença no cotidiano, digamos, social é que entrei na adolescência junto com o aparecimento de Beatles e Rolling Stones, vivenciando a explosão do rock (década de 60), revolução sexual, de costumes (p.ex.hippies) e da política (Ditadura).

    Mesmo assim, se fosse descrever minhas experiências passadas, provavelmente aproveitaria uns 70% do seu texto, Carrano.
    Abraço
    Carlos

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  3. Vejam, Carlos e Gusmão, sendo mais velho 11 anos do que um e 5 anos do que o outro, ainda assim pelos respectivos comentários a minha vivência foi muito parecida com a de voces. Segundo o Carlos, 70% do que descrevi se aplicaria a ele.
    As coisas aconteciam muito mais lentamente naqueles tempos.
    Dá para acreditar que as crianças nasciam com os olhos fechados?
    Abraços

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  4. Ricardosanjos01/08/2011, 01:15

    Quanto ao cinema com as namoradínhas, existia aquela coisa de "a gente se encontra lá dentro, tá?" quando só tínhamos grana pra uma entrada.

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  5. O comentário do Ricardo (acima), me remete a uma historinha engraçada da época.
    O Canto do Rio disputava o campeonato carioca e em muitos finais de semana tinha que ir para o Rio de Janeiro disputar partidas. Nâo havia, ainda, a ponte ligando Niterói ao Rio. E o Canto do Rio era um time pequeno e consequentemente pobre. Enquanto o Vasco, o Botafogo, o Fluminense e aquele outro (vermelho e preto), concentrava seus atletas em bons hoteis, os jogadores do cantusca não tinham esta regalia. A piada (não sei era fato real)é que o técnico da equipe niteroiense, na sexta-feira, depois do último treino, avisava aos seus jogadores: "pessoal, então domingo, ao meio-dia nas barcas (estação), todo mundo almoçado".
    Só para lembrar as partidas tinham início às 15 horas.
    Abraços Carlos Frederico e Ricardo.

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